18/07/2016

Jurisprudencia (401)



PER; controlo jurisdicional; 
âmbito


1. O sumário de RE 21/4/2016 (39/16.4T8EVR-A.E1) é o seguinte:

I- O processo especial de revitalização tem mais que ver com as partes do que propriamente com o Tribunal, a este competindo mais uma função de defesa da legalidade.
 
II- Na fase liminar do processo, o juiz não vai fazer uma avaliação completa da situação económico-financeira da entidade objecto da revitalização.
 
III- Nesta fase, apenas lhe compete ver da verificação dos requisitos formais da apresentação à revitalização.


2. Tem interesse conhecer esta parte da fundamentação do acórdão:

"[...] a questão que demanda apreciação e decisão da parte deste tribunal ad quem é, basicamente, a de saber se foi avaliado de forma correcta no tribunal a quo o circunstancialismo invocado pelo credor/Apelante, no sentido de obstar ao prosseguimento dos autos de Revitalização, isto é, se a decisão de ordenar tal prosseguimento foi proferida de acordo ou ao arrepio das normas legais que a deveriam ter informado. Ainda a problemática da nulidade da douta decisão por omissão de pronúncia. É isso que hic et nunc está em causa, como se extrai das conclusões alinhadas no recurso apresentado.

Sempre se começará por dizer, porém, que campeiam no recurso algumas confusões que importará, desde já, clarificar, para se perceber, exactamente, o que está em causa nesta fase do processo especial de revitalização em presença.


Pois que é para notar que a Apelante afirma, a certa altura das suas doutas alegações de recurso, que “deveria o Tribunal a quo pronunciar-se quanto ao requerimento apresentado pela recorrente e, ao não fazê-lo, deferindo sem mais o PER da recorrida, não obstante as alegações da recorrente, incorreu no vício de omissão de pronúncia”.

Ora, desde logo, não se tratou, ainda, do deferimento ou indeferimento de qualquer Plano de Revitalização (se é a isso que a Apelante se está a referir), o qual estará em fase de negociações e nem terá sido objecto de acordo, ou sequer apresentado ao juiz para homologação judicial. Não há, pois, nos autos qualquer plano que tenha sido deferido ou indeferido à Requerente “BB, SA”, ao contrário do que aduz a Recorrente “AA, Lda.”. O despacho em recurso é, tão-só, a decisão inicial/liminar do processo a ordenar o seu prosseguimento.

E, muito menos, se poderá referir alguma omissão de pronúncia no douto despacho recorrido, pois que, como facilmente se constata, foi precisamente tal atravessamento nos autos do douto requerimento em causa – a elucidar sobre a situação económico-financeira da requerente – que motivou a prolação do douto despacho recorrido e o seu âmbito. Nessa decisão se responde precisamente ao credor que apresenta o requerimento a dar conta que a visada pela revitalização afinal não estava para falir, mas já totalmente insolvente.

Dessarte, omissão de pronúncia sobre o requerimento da ora Apelante é que não houve, antes pelo contrário, se referiu no douto despacho que a matéria sobre que versava tal requerimento não poderia ser apreciada naquela sede de despacho liminar do processo especial de Revitalização.

Ora, isso é uma pronúncia sobre o tema. A Apelante é que poderá não ter concordado com ela – e daí a interposição do presente recurso –, mas isso não transforma uma pronúncia numa omissão de pronúncia, invalidando a decisão. Pois que a discordância da Apelante versa já sobre o mérito do douto despacho: a possibilidade, ou não, de apreciar a situação económico-financeira da visada em sede de despacho inicial no processo especial de revitalização. 

Pronúncia há, manifestamente. 

E discordância da sua arguente, também. 

Importará, agora, ver se com razão ou sem ela.

Mas, adiantando sobre isso razões e salva sempre melhor opinião, cremos bem que, com os elementos disponíveis, se verifica que o douto despacho que é ora objecto do recurso decidiu correctamente a questão que lhe estava colocada, nele afinal não descortinando motivos que tivesse que erigir em causas (legais e iniciais) justificativas do não prosseguimento do processo de revitalização tendo em vista a futura homologação de Plano de Recuperação/Revitalização.

Pois, como se diz no douto despacho, o processo de Revitalização tem mais que ver com as partes (rectius, com a entidade objecto do processo e com os seus credores) do que propriamente com o Tribunal, a este competindo mais uma função de defesa da legalidade e contra abusos ou esquemas que nele se pretendam cometer, do que com uma real situação económica ou financeira da parte visada, que deverá ser atendida pelos interessados/credores nos termos do acordo/plano de recuperação que eventualmente venha a ser alcançado.

Menos ainda nesta fase ainda liminar do processo, em que o juiz não vai, ao contrário do pretendido pela credora/Apelante, fazer uma avaliação completa da situação económico-financeira da entidade objecto da Revitalização e, assim, entrar por caminhos que não são adequados a tal espécie de processo.

Nesta fase, apenas lhe compete ver da verificação dos requisitos formais da apresentação à revitalização, e naturalmente encaminhar os interessados para as negociações que bem entendam vir a encetar em busca de alguma solução regeneradora ou salvadora para a mesma.

Recorde-se que tal é o regime estabelecido no artigo 17.º-C do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (doravante C.I.R.E.), aprovado pelo Decreto-lei n.º 53/2004, de 18 de Março – alterado e republicado no Decreto-lei n.º 200/2004, de 18 de Agosto e, ultimamente, também, pela Lei n.º 16/2012, de 20 de Abril, diploma que lhe introduziu precisamente o processo especial de revitalização –, donde não resulta que o juiz tenha que fazer qualquer análise da situação económica ou financeira do apresentante, antes, apenas, dos requisitos de natureza formal que ali constam (veja-se que é o próprio devedor que se limita a dar conhecimento ao Tribunal “que pretende dar início às negociações conducentes à sua recuperação”, nos termos da alínea a) do nº 3 desse artigo, o que inculca a ideia de um papel meramente conformador do juiz do processo)."

[MTS]