03/04/2020

Jurisprudência 2019 (210)


Conclusões do recurso;
despacho de aperfeiçoamento*

1. O sumário de STJ 7/11/2019 (3113/17.6T8VCT.G1.S1) é o seguinte: 

I. Compulsado o recurso de apelação da autora constata-se: (i) que o teor das respectivas conclusões se encontra dividido em 96 pontos enquanto o corpo das alegações se encontra organizado em 121 artigos; (ii) que o teor das conclusões ainda que muito próximo do teor do corpo das alegações, não coincide inteiramente com ele.

II. Bastariam tais dados para se reconhecer que a apelação da autora não é omissa em conclusões e que, quando muito, ajuizando tais conclusões como sendo complexas ou prolixas, devia o tribunal ter formulado convite ao seu aperfeiçoamento.

III. A resposta teria de ser a mesma ainda que se entendesse que o texto das conclusões recursórias constitui a repetição (quase) integral do texto da alegação propriamente dita; com efeito, a orientação da jurisprudência consolidada do STJ é no sentido de que a circunstância de, em sede de conclusões, o recorrente reproduzir a motivação constante da alegação propriamente dita não configura um caso de falta de conclusões, não podendo, por isso, o recurso ser rejeitado de imediato, antes devendo ser proferido despacho convidando ao aperfeiçoamento, com fundamento na apresentação de conclusões complexas ou prolixas.
 

2. Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:

"Antes de mais, consideremos a alegação da Recorrente de que as conclusões do recurso de apelação por si interposto não constituem a reprodução integral das alegações do recurso de apelação propriamente ditas.

Compulsada a apelação da A. constata-se: (i) que o teor das respectivas conclusões se encontra dividido em 96 pontos enquanto o corpo das alegações se encontra organizado em 121 artigos; (ii) que o teor das conclusões, ainda que muito próximo do teor do corpo das alegações, não coincide inteiramente com ele.

Bastariam estes dados para se reconhecer que a apelação da A. não é omissa em conclusões e que, quando muito, ajuizando-se tais conclusões como sendo complexas ou prolixas, devia o tribunal ter formulado convite ao seu aperfeiçoamento.

De qualquer forma, sempre se dirá que a resposta teria de ser a mesma ainda que se entenda que o texto das conclusões recursórias constitui a repetição (quase) integral do texto da alegação propriamente dita.

Com efeito, da fundamentação do acórdão, na parte supra transcrita, resulta evidente que a orientação da jurisprudência deste Supremo Tribunal é no sentido de que a circunstância de, em sede de conclusões, o recorrente reproduzir a motivação constante da alegação propriamente dita não configura um caso de falta absoluta de conclusões, não podendo, por isso, o recurso ser rejeitado de imediato, antes devendo ser proferido despacho de convite ao aperfeiçoamento, com fundamento na apresentação de conclusões complexas ou prolixas.

Assim se decidiu, entre outros, nos seguintes acórdãos do STJ:

- Acórdão de 09/07/2015 (proc. nº 818/07.3TBAMD.L1.S1), consultável em www.dgsi.pt, em cujo sumário se lê:

“A reprodução nas “conclusões” do recurso da respectiva motivação não equivale a uma situação de alegações com “falta de conclusões”, de modo que em lugar da imediata rejeição do recurso, nos termos do art. 641º, nº 2, al. b), do NCPC, é ajustada a prolação de despacho de convite ao aperfeiçoamento, com fundamento na apresentação de conclusões complexas ou prolixas, nos termos do art. 639º, nº 3, do NCPC.”

- Acórdão de 13/10/2016 (proc. nº 5048/14.5TENT-A.E1.S1), consultável em www.dgsi.pt, em cujo sumário se pode ler:

“I - Do facto de as conclusões serem uma repetição das alegações do recurso não se pode retirar que aquelas conclusões não existam, mas apenas que não assumem a forma sintética legalmente imposta pelo art. 639.º, n.º 1, do CPC.

II - Perante tal irregularidade, deve o tribunal convidar o recorrente a aperfeiçoar as conclusões no sentido de proceder à sua sintetização, com respeito pelo objeto do recurso que ficou definido nas alegações originais, nos termos do n.º 3 do citado normativo.”
 

- Acórdão de 25/05/2017 (proc. nº 2647/15.1T8CSC.L1.S1), consultável em www.dgsi.pt, de cujo sumário consta o seguinte:

“I - A reprodução nas conclusões do recurso da respectiva motivação não equivale a uma situação de alegações com falta de conclusões.

II - Nestas circunstâncias, não há lugar à prolação de um despacho a rejeitar liminarmente o recurso, impondo-se antes um convite ao seu aperfeiçoamento, nos termos do nº3 do artigo 639º do CPCivil, atenta a sua complexidade e/ou prolixidade.”
 

- Acórdão de 06/07/2017 (proc. nº 297/13.6TTTMR.E1.S1), consultável em www.dgsi.pt, de cujo sumário consta o seguinte:

“I - A reprodução nas conclusões do recurso da respectiva alegação não equivale a uma situação de falta de conclusões, estando-se antes perante um caso de conclusões complexas por o recorrente não ter cumprido as exigências de sintetização impostas pelo nº 1 do artigo 639º do CPC.

II - Assim, não deve dar lugar à imediata rejeição do recurso, nos termos do artigo 641º, nº 2, alínea b) do CPC, mas à prolação de despacho de convite ao seu aperfeiçoamento com fundamento na apresentação de conclusões complexas ou prolixas, conforme resulta do nº 3 do artigo 639º do mesmo compêndio legal.”
 

- Acórdão de 27/11/2018 (proc. nº 28107/15.2T8LSB.L1.S1), consultável em www.dgsi.pt, em cujo sumário se pode ler:

“I. Quando as conclusões de um recurso são a mera reprodução, ainda que parcial, do corpo das alegações, não se pode, em rigor, afirmar que o Recorrente não deu cumprimento ao ónus previsto no artigo 641.º, n.º 2, alínea b) do CPC.

II. Em tal circunstância não há que rejeitar imediatamente o recurso, podendo convidar-se ao seu aperfeiçoamento, por força do disposto no n.º 1 do artigo 659.º do CPC.”


- Acórdão de 19/12/2018 (proc. nº 10776/15.5T8PRT.P1.S1), consultável em www.dgsi.pt, assim sumariado:

“I - A reprodução da motivação nas conclusões do recurso não equivale à falta de conclusões, fundamento de indeferimento do recurso – art. 641.º, n.º 2, al. b), do CPC.

II - Neste caso, impõe-se prévio convite ao recorrente para aperfeiçoar as conclusões, no sentido de lhes conferir maior concisão – art. 639.º, n.º 3, do CPC.”

- Acórdão de 07/03/2019 (proc. nº 1821/18.3T8PRD-B.P1.S1), consultável em www.dgsi.pt, de cujo sumário consta o seguinte:

“II. A reprodução nas “conclusões” do recurso da respetiva motivação não equivale a uma situação de alegações com “falta de conclusões”, inexistindo, por isso, fundamento para a imediata rejeição do recurso, nos termos do art. 641º, nº 2, al. b) do Código de Processo Civil.

III. Uma tal irregularidade processual mais se assemelha a uma situação de apresentação de alegações com o segmento conclusivo complexo ou prolixo, pelo que, de harmonia com o disposto no artigo 639º, nº 3 do Código Processo Civil, impõe-se a prolação de despacho a convidar a recorrente a sintetizar as conclusões apresentadas.”

- Acórdão de 02/05/2019 (proc. nº 7907/16.1T8VNG.P1.S1), consultável em www.dgsi.pt, assim sumariado:

“A reprodução nas “conclusões” do recurso da respectiva motivação não equivale a uma situação de alegações com “falta de conclusões”, de modo que em lugar da imediata rejeição do recurso, nos termos do art. 641º, nº 2, al. b), do NCPC, é ajustada a prolação de despacho de convite ao aperfeiçoamento, com fundamento na apresentação de conclusões complexas ou prolixas, nos termos do art. 639º, nº 3, do NCPC.”

Não havendo razões para nos afastarmos desta orientação jurisprudencial já consolidada, a qual - assinale-se - este Supremo Tribunal vem adoptando tanto a respeito da admissibilidade do recurso de apelação como a respeito da admissibilidade do recurso de revista, também por esta via se chegaria à mesma conclusão: o recurso de apelação da A. não padece do vício de falta de conclusões; antes, na medida em que as 96 conclusões dele constantes sejam consideradas complexas e/ou prolixas, devia o tribunal ter proferido despacho a convidar ao respectivo aperfeiçoamento, nos termos do art. 639º, nº 3, do CPC." 

*3. [Comentário] A propósito das peripécias relacionadas com as conclusões das alegações de recurso e dos custos que elas implicam para o sistema judiciário (como é ilustrado pela vasta jurisprudência das Relações e do STJ sobre a matéria) bem se pode dizer que ninguém pode "atirar a primeira pedra":

-- A jurisprudência, porque, com decisões, de carácter puramente formal, que se recusaram a apreciar algumas questões suscitadas nos recursos com argumento de que não constavam das conclusões, os tribunais deram azo a que os advogados, segundo a conhecida "jurisprudência das cautelas", alargassem as conclusões muito para além do razoável;

-- A advocacia, porque os advogados continuam a não cumprir o que a lei impõe, que é -- lembre-se -- a indicação, de forma sintética, dos fundamentos por que se pede a alteração ou a anulação da decisão impugnada (art. 639.º, n.º 1, CPC).

MTS