16/06/2020

Jurisprudência 2020 (10)


Procedimento cautelar;
dependência; intervenção de terceiros


1. O sumário de RP 13/1/2020 (6665/17.7T8VNG-B.P1) é o seguinte:

I – Sendo incontornável a necessidade de existência de nexo de instrumentalidade e dependência entre o objecto da providência cautelar pretendida e o objecto da acção principal a intentar ou já proposta, nada obsta a que o procedimento cautelar seja intentado contra quem não figure como parte na acção principal já proposta, desde que o requerente aí provoque a intervenção principal do terceiro contra quem dirige o pedido de providência cautelar;

II - Nos procedimentos cautelares, quando dispensa a audiência prévia do requerido, o juiz age no exercício de um poder vinculado, pelo que a sua decisão tem de ser fundamentada, sob pena de nulidade;

III – Tendo o juiz explicitado as razões da preterição do contraditório prévio em despacho proferido ao abrigo do disposto no artigo 617.º, n.ºs 1 e 5, do CPC, deve considerar-se sanado o vício da nulidade da decisão por omissão dessa formalidade;

IV - O arrolamento só se justifica quando o requerente se arrogue e demonstre, ainda que indiciariamente, que tem ou pode vir a ter (existência actual ou futura) um direito sobre os bens em relação aos quais se verifica o perigo de extravio, ocultação ou dissipação;

V – O arrolamento de bens não cumpre a função instrumental de tutela antecipada relativamente à pretensão definitiva formulada na acção principal quando esta consiste na anulação de deliberações sociais de uma sociedade comercial;

VI – A titularidade ou contitularidade de uma quota é uma participação no capital social, mas não no património da sociedade e por isso não confere ao sócio qualquer direito sobre os bens, móveis ou imóveis, da sociedade;

VII - Não pode considerar-se demonstrada a seriedade do risco de extravio ou dissipação dos bens arrolados (vários prédios urbanos e fracções prediais) pelo simples facto de estar, indiciariamente, provado que foram vendidos, «por preço bastante inferior ao valor de mercado», três lugares de aparcamento de um prédio pertencentes às sociedades requeridas, sem que se saiba, em concreto, qual foi o preço e qual é (era) o seu valor de mercado.

2. Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:

"As recorrentes sustentam que há caducidade da providência decretada relativamente à “D…, L.da”, invocando o disposto no artigo 373.º, n.º 1, al. a), do CPC.

Não sendo caso de inversão do contencioso, caduca a providência decretada se o requerente não propuser a acção dentro de 30 dias a contar da data em que lhe tiver sido notificado o trânsito em julgado da decisão que a decretou.

Tendo sido interposto, pelas requerentes, recurso de apelação da decisão que ordenou o arrolamento, fica patente que não houve trânsito em julgado (ou seja, insusceptibilidade de recurso ordinário da decisão que decretou a providência) e, por conseguinte, não está verificada a hipótese legal contida naquele preceito.

Argumentam, porém, as recorrentes que a providência em causa foi requerida como incidente de acção declarativa intentada, apenas, contra a “C…, L.da”.

Ora, a dependência que, necessariamente, há-de existir entre o procedimento cautelar e a acção principal implica que a providência não possa ser requerida contra quem não é parte na acção, nem pode já vir a sê-lo.

Em abono da sua posição, as recorrentes citam, além do mais, uma passagem de uma decisão proferida num outro procedimento cautelar (que correu termos sob o n.º 989/13.0TYVNG-A) que envolvia as mesmas partes, proferida pela mesma Sra. Juiz, em que foi declarada a caducidade da providência decretada em relação à “D…, L.da”, precisamente por não ser parte na acção principal de que aquela era dependência.

É incontornável a necessidade de existência de nexo de instrumentalidade [...] e dependência entre o objecto da providência cautelar pretendida e o objecto da acção principal a intentar ou já proposta.

No entanto, tal como pode ser instaurado como preliminar de uma acção (declarativa ou executiva), o procedimento cautelar pode ser intentado contra quem não figure como parte na acção principal já proposta, desde que o requerente aí provoque a intervenção principal do terceiro contra quem dirige o pedido de providência cautelar.

No caso, as próprias recorrentes alegam que o aqui recorrido, autor na acção de que este procedimento cautelar é dependência, requereu, em 22.10.2018 (ainda antes de as requeridas terem sido notificadas da decisão que decretou a providência), a intervenção principal provocada da “D…, L.da”.

Se a intervenção não for admitida, então sim, justificar-se-á o levantamento da providência de arrolamento em relação a essa sociedade."

[MTS]