14/11/2024

Jurisprudência 2024 (48)


Princípio do contraditório;
exercício; notificação da parte


1. O sumário de TConf 11/1/2024 (0205/22.3Y2MTS.P1.S1) é o seguinte:


I - A discordância quanto ao decidido não é motivo de nulidade do acórdão; a sua arguição, com este significado, é manifestamente infundada.

II - Tendo sido anulado um acórdão para que fosse cumprido o contraditório, por ter a recorrente alegado que apenas com a sua notificação teve conhecimento de que tinha sido junto um parecer do Ministério Público (que é o recorrido) junto do Tribunal dos Conflitos, e constando o parecer do Citius, plataforma por onde é tramitado o processo, a recorrente teve a oportunidade de se pronunciar sobre o parecer antes de proferido o novo acórdão.

III - O princípio do contraditório tem um significado material, que se reconduz ao princípio da igualdade das partes perante a lei e o tribunal e se traduz no reconhecimento do direito das partes a que a sua posição sobre as questões em litígio possa ser considerada pelo tribunal quando as vai decidir.

IV - É este sentido material do contraditório que o n.º 3 do artigo 3.º do Código de Processo Civil traduz, ao revelar, na sua parte final, que o que o respeito do contraditório impõe é que, antes de o juiz decidir “questões”, as partes devem ter disposto “da possibilidade de sobre elas se pronunciarem”.

V - Tendo sido notificado às partes o acórdão que anulou o acórdão anterior, para que fosse cumprido o contraditório, e constando do Código de Processo Civil a regra geral sobre a duração e o início da contagem do prazo para as partes exercerem qualquer outro poder processual para além dos que vêm referidos na lei – cfr. artigo 149.º do Código de Processo Civil e artigo 19.º da Lei n.º 91/2019, de 4 de Setembro –, a recorrente dispôs de todos os elementos de que necessitava e do prazo para se poder pronunciar oportunamente.

VI - Anular o último acórdão por falta de notificação do parecer do Ministério Público seria apenas um formalismo sem qualquer fundamento material; razão pela qual a arguição de nulidade por falta de notificação é manifestamente infundada.


2. Na fundamentação do acórdão escreveu-se o seguinte:

"6. São manifestamente infundadas as nulidades arguidas.

Relativamente à nulidade do acórdão, por falta de assinatura do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, o que o requerimento agora em apreciação revela é a discordância da recorrente relativamente ao que, quanto a este ponto, se decidiu expressamente no acórdão de 22 de Novembro de 2023, e que acima se transcreveu. Note-se que a circunstância de constar da acta da sessão que o acórdão foi “subscrito pelo Senhor Presidente”, quando é manifesto que não foi, não tem a virtualidade de invalidar o acórdão.

No que toca à nulidade processual resultante da falta de notificação do Parecer do Ministério Público, apresentado no Tribunal dos Conflitos, cumpre ter presente, em primeiro lugar, que este recurso é tramitado através da plataforma Citius, como a recorrente, aliás, nos recorda, ao identificar o acórdão (embora a referência indicada se refira ao acórdão de 5 de Julho de 2023) e a acta da sessão de 22 de Novembro de 2023 pelas respectivas referências Citius e que o referido Parecer do Ministério Público conste da mesma plataforma (ref. 11549441).

Em segundo lugar, cabe frisar que o princípio do contraditório tem um significado material, que se reconduz ao princípio da igualdade das partes perante a lei e o tribunal e se traduz no reconhecimento do direito das partes a que a sua posição sobre as questões em litígio possa ser considerada pelo tribunal quando as vai decidir. Por isso se anulou o acórdão de 5 de Julho de 2023 – recorde-se que a recorrente alegou que só com a leitura deste acórdão tomou conhecimento da existência de tal Parecer, ponto 24 do requerimento de 20 de Julho de 2023.

Tendo o acórdão de 27 de Setembro de 2023, em julgamento da nulidade por falta de notificação do Parecer do Ministério Público, arguida pela recorrente, anulado o acórdão de 5 de Julho anterior “para que seja cumprido o princípio do contraditório, uma vez que o Ministério Público é recorrido no recurso que está em causa” (ponto 2 do acórdão de 27 de Setembro), acórdão que foi notificado à recorrente, e constando do Código de Processo Civil a regra geral sobre a duração e o início da contagem do prazo para as partes exercerem qualquer outro poder processual para além dos que vêm referidos na lei – cfr. artigo 149.º do Código de Processo Civil e artigo 19.º da Lei n.º 91/2019, de 4 de Setembro – a recorrente dispôs de todos os elementos de que necessitava e do prazo para se poder pronunciar antes de ser proferido o acórdão de 22 de Novembro – cfr. ponto 4 deste acórdão de 22 de Novembro.

Recorda-se que é este sentido material do contraditório que o n.º 3 do artigo 3.º do Código de Processo Civil traduz, ao revelar, na sua parte final, que o que o respeito do contraditório impõe é que, antes de o juiz decidir “questões”, as partes devem ter disposto “da possibilidade de sobre elas se pronunciarem”.

Tendo disposto dessa possibilidade, anular o acórdão de 22 de Novembro por falta de notificação do Parecer do Ministério Público seria apenas um formalismo sem qualquer fundamento material; razão pela qual a arguição de nulidade por falta de notificação é manifestamente infundada.

Não se conhecem as inconstitucionalidades suscitadas porque não se aplicam as normas visadas com o sentido que a recorrente considera inconstitucional."

[MTS]