A arguição de nulidade da decisão não pode ser usada para obter a reapreciação da questão decidida.
“1 - Proferida a sentença, fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa.
2 - É lícito, porém, ao juiz retificar erros materiais, suprir nulidades e reformar a sentença, nos termos dos artigos seguintes (…)”.
E dispõe-se no artigo 615.º do CPC:
“1 - É nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido (…)”.
Ambas as normas são aplicáveis ao acórdãos proferidos pelo Supremo Tribunal de Justiça, ex vi dos artigos 662.º e 679.º do CPC, legitimando a apresentação de reclamações como a presente.
Sucede, porém, que, não obstante arguirem a nulidade do Acórdão, os recorrentes não só não identificam a respectiva causa como não invocam nenhuma das disposições do artigo 615.º, n.º 1, do CPC, em que tal vício teria necessariamente de enquadrar-se para poder ser apreciado na presente reclamação [Não vale, por isso, alegar a violação do artigo 663.º, n.º 6, do CPC (que, aliás, não é senão aquilo que os recorrentes, na verdade, imputam ao Acórdão da Relação).]
Em contrapartida, os sinais (rectius: as alegações) são abundantes no sentido de que aquilo que os recorrentes pretendem com a presente reclamação é expor mais uma vez as razões pelas quais entendem que o Acórdão da Relação deve ser revogado.
Ora, sobre esta questão já se disse (rectius: escreveu) o suficiente no Acórdão ora reclamado, não sendo necessária nem desejável repeti-lo ou reproduzi-lo.
Salienta-se apenas que, além do mais, foram “aproveitadas” as alegações de recurso, tendo a questão, formalmente enunciada, da nulidade do Acórdão recorrido por falta de fundamentação da decisão sobre a matéria de facto (que não podia ser conhecida na revista) sido convertida na questão do exercício dos poderes do artigo 662.º do CC e como tal apreciada.
A insatisfação que os recorrentes demonstram relativamente à decisão adoptada por este Supremo Tribunal é natural, uma vez que lhes é desfavorável, mas o certo é que não constitui fundamento para a presente reclamação.
Alegam ainda os recorrentes que o Acórdão reclamado enferma de inconstitucionalidade por aplicação / interpretação do artigo 663.º, n.º 6, do CPC em ofensa ao artigo 205.º, n.º 1, da CRP, dispondo que “[a]s decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei” e ainda ao artigo 20.º, n.º 4, da CRP (tutela jurisdicional efectiva). Cabe esclarecer que no Acórdão não se aplica / interpreta a norma referida [Aplica-se / interpreta-se, sim, o artigo 662.º do CPC.], pelo que nunca poderia haver inconstitucionalidade.
A terminar, cumpre deixar uma palavra acerca do pedido da recorrida, de que seja aplicada aos recorrentes uma taxa sancionatória excepcional.
Dispõe-se no artigo 531.º do CPC:
“Por decisão fundamentada do juiz, pode ser excecionalmente aplicada uma taxa sancionatória quando a ação, oposição, requerimento, recurso, reclamação ou incidente seja manifestamente improcedente e a parte não tenha agido com a prudência ou diligência devida”.
Estamos em crer, todavia, que ainda não é de recorrer a este meio excepcional. Como se viu acima, a arguição de nulidades da decisão é uma possibilidade que a lei confere aos recorrentes. O ideal é que tal arguição tenha sempre um mínimo de fundamento / uma aparência de fundamento mas a verdade é que, na prática, em muitos casos, isto não se se verifica. Atendendo a isto, considera-se que a presente reclamação ainda cai dentro dos limites do habitual e, como tal, ainda não se justifica a aplicação daquela sanção excepcional."
[MTS]