06/11/2025

Jurisprudência uniformizada (77)


Responsabilidade extracontratual;
ocupação de imóvel; prazo de prescrição


1. Ac. STJ 14/2025, de 6/11, uniformizou jurisprudência no seguinte sentido:

O termo inicial do prazo prescricional, estabelecido no artigo 498.º n.º 1 do Código Civil, do direito de indemnização, com fundamento em responsabilidade civil extracontratual decorrente de ocupação ilícita de imóvel, deverá coincidir com o momento em que o lesado adquira conhecimento dos factos que integram os pressupostos legais do direito invocado, independentemente de, à data do início da contagem daquele prazo, ainda não ter cessado a produção dos danos que venham a ser reclamados.

2. [Comentário] Não é habitual fazer qualquer comentário à jurisprudência uniformizada. Abre-se uma excepção neste caso, porque não se consegue acompanhar o entendimento de que o direito de indemnização do lesado possa prescrever enquanto se mantém a ocupação ilícita do imóvel. Em última análise, o que se pode perguntar é se é razoável proteger o autor do facto ilícito e desproteger o lesado.

Se o lesado não conseguir a desocupação do imóvel antes de se completar o prazo de prescrição (em regra de três anos), como é que esse lesado pode ser ressarcido dos danos que ocorram depois de esgotado aquele prazo? Por exemplo: antes de se esgotar o prazo de prescrição a partir do conhecimento da ocupação do imóvel, o lesado instaura a acção de indemnização; suponha-se, no entanto, que o imóvel ainda permaneceu ocupado depois da instauração da acção; até ao encerramento da discussão é possível contabilizar os danos causados pela ocupação (excepto, segundo parece, se, entretanto, se completar o prazo de prescrição) (art. 611.º, n.º 1, CPC); e como é que o lesado pode ser indemnizado de todos os danos posteriores? Segundo a doutrina do Acórdão, a indemnização de todos esses danos encontra-se prescrita, porque já passaram mais de três anos a partir do conhecimento da ocupação, o que, naturalmente, pode ser invocado pelo ocupante em qualquer nova acção proposta pelo lesado.

Poder-se-ia imaginar que, na acção proposta, o lesado pudesse pedir a indemnização de danos futuros. O problema é que, como não se sabe se o ocupante vai sair dentro de semanas, meses ou anos, se está no âmbito dos danos futuros indetermináveis da 2.ª parte do n.º 2 do art. 564.º CC, pelo que a sua indemnização fica para "decisão ulterior".

Aliás, a demonstração mais eloquente da infelicidade do Acórdão é a circunstância de imediatamente se ser levado a procurar uma solução alternativa para a reparação dos "danos pós-prescritos".
 
MTS

(Comentário actualizado às 19 h)