03/07/2020

Jurisprudência 2020 (23)


Agente de execução;
remuneração adicional*


1. O sumário de RL 4/2/2020 (8177/17.0T8LSB.L1-7) é o seguinte:

I- Só é devida remuneração adicional ao agente de execução, nos termos do disposto no art. 50º, nº 5 da Portaria nº 282/2013, de 29-08 se se verificar um qualquer nexo entre o trabalho desenvolvido pelo agente de execução e a liquidação do crédito exequendo.

II- Sendo o crédito exequendo satisfeito extrajudicialmente, na sequência de transação celebrada entre exequente e executada sem qualquer intervenção do agente de execução, não há lugar aquela remuneração.

2. Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:

"[...] a única questão a apreciar e decidir reside em determinar se a apelante tem direito à remuneração adicional que liquidou nos termos do disposto no art. 50º, nºs 5 e 6 da Portaria nº 282/2013, de 29-08.

A decisão recorrida apreciou a questão nos seguintes termos:

“Resulta do exposto que a execução findou pelo acordo entre exequente e executada, sem que tenha sido efetuada nenhuma venda na execução a qual ficou suspensa por via da caução prestada pela executada, logo em julho de 2017. Mais resulta que a atividade da senhora agente de execução se cingiu às penhoras, mas, porque todas as que fez foram levantadas pelo tribunal na sequência da procedência das oposições à penhora, para os efeitos que nos ocupam apenas se pode considerar ter sido feita a penhora do imóvel, não colhendo nesta parte a argumentação da AE de que fez diversas penhoras pois as mesmas não resistiram à oposição da executada. Diga-se, também desde já, que apenas está em causa a retribuição adicional, pelo que, todos os atos que a senhora AE tenha praticado estão sujeitos à remuneração fixa prevista para os mesmos e seriam remunerados como tal, pelo que, não tem nenhuma pertinência a sua argumentação de que sem a remuneração adicional vai receber apenas a quantia de €255,00.

A questão a decidir é a de saber se no circunstancialismo que resulta dos factos a senhora AE tem direito a receber a quantia a título de remuneração adicional.

O acordo a que as partes chegaram e que vieram trazer aos autos, ainda antes do trânsito da decisão proferida nos embargos e, por isso, estando a execução suspensa, não decorre, a nosso ver, de nenhuma intervenção da senhora AE, que é alheia ao mesmo. Por outro lado, tal acordo é de cumprimento imediato, ou seja, as partes fixam a quantia e na mesma altura é efetuado o pagamento. Nem a penhora nem sequer a caução, serviram para o efeito de dar pagamento à exequente e nenhuma dessas garantias subsistiu já que a obrigação se extinguiu pelo pagamento nos termos já mencionados. E estando prestada caução por valor superior aquele que as partes fixaram no acordo, não vê que tal acordo pudesse ser determinado pela existência da penhora do imóvel. Por conseguinte, o pagamento feito pela executada à exequente não radica em nenhuma atuação da agente de execução nem, quanto a nós, decorre de qualquer atividade da senhora agente de execução, tanto mais que quando s partes chegam a acordo a execução ainda está suspensa por não ter transitado a sentença dos embargos, suspensão que naturalmente não obstava a esse acordo. É certo que o acordo é feito na pendência da execução, mas não se pode afirmar que seja a atividade desenvolvida pela senhora AE que determinou ou sequer influenciou esse pagamento, no concreto contexto, afigurando-se que o pagamento surge na decorrência da improcedência da ação de anulação e do termo dos embargos. Note-se que, tendo a execução seguido a forma sumária por ser baseada em sentença arbitral, a executada antes da penhora não teve oportunidade de proceder a nenhum pagamento voluntário, caso em que não havia lugar à remuneração adicional. Mas a executada no prazo que tinha para deduzir oposição, embora já com a penhora feita, veio prestar caução. O que daqui se espelha é que o pagamento estava dependente do resultado da ação de anulação, sem qualquer influência nessa decisão das partes dos procedimentos levados a cabo na execução ou pela senhora agente de execução. Inexiste, a nosso ver, nexo causal entre o pagamento ao exequente e a atividade da senhora agente de execução. Por outro lado, tendo sido prestada caução nos termos sobreditos, e decorrendo da lei que havendo lugar ao pagamento por dever prosseguir a execução após os embargos, o pagamento é feito através da caução e não da penhora (art.733.° n.°6 do CPC), pelo que, de facto a penhora do imóvel nesse contexto perde relevância.

Aqui chegados o que se impõe saber é se a lei exige um nexo causal entre os atos praticados pela senhora agente de execução, ou seja, a atividade por esta desenvolvida e o pagamento efetuado que pôs termo à execução com o acordo celebrado entre as partes, ou se abdica de tal nexo causal impondo sempre o pagamento da retribuição adicional desde que haja pagamento do executado à exequente.

Essa questão não tem obtido resposta unânime da jurisprudência, que se divide em duas correntes, uma exigindo a presença daquele nexo causal outra abdicando dele.

Socorrendo-nos da resenha feita no recente Ac. TRL de 26.9.2019 (Arlindo Crua)[...] na primeira das enunciadas correntes jurisprudenciais “(...) para que seja exigível o pagamento da remuneração adicional ao agente de execução, é mister a verificação de um nexo causal entre a sua atividade e a obtenção, para o processo executivo, de valores recuperados ou garantidos ao exequente. Trata-se da posição defendida nas alegações recursórias, com respaldo jurisprudencial, entre outros, nos seguintes arestos [...]: - RC de 03/11/2015 - Relatora: Maria Domingas Simões, Processo n°. 1007/13.3TBCBR-C.C1; - RP de 10/01/2017- Relatora: Maria Cecília Agante, Processo n°. 15955/15.2T8PRT.P1; - RC de 11/04/2019 - Relator: Manuel Capelo, Processo n°. 115/18.9T8CTB-G.C1; - RP de 06/05/2019 - Relator: Jorge Seabra, Processo n°. 130/16.7T8PRT.P1.

Enuncia a primeira decisão colegial - Acórdão da RC de 03/11/2015 - que a remuneração adicional devida ao agente de execução, como uma das parcelas dos honorários, sem natureza necessária, não prescinde da verificação do nexo causal entre a recuperação de valores pelo exequente e as diligências que nesse sentido foram por aquele praticadas ou desenvolvidas. De forma expressa, referencia ter o legislador acentuado “a necessidade de verificação do já aludido nexo causal entre a atividade desenvolvida pelo Sr. Agente de execução e o resultado que se intenta premiar. Por outras palavras, a remuneração adicional só se justifica quando a recuperação ou a garantia dos créditos da execução seja devida à eficiência e eficácia da sua atuação. Na interpretação da lei há que observar os comandos contidos no art.° 9.° do CC, impondo-se ao Tribunal que não se cinja à sua letra, antes reconstitua o pensamento legislativo a partir do texto legal - daí a proibição de ser considerado um sentido que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso - sempre presumindo que foi consagrada a solução mais acertada. Ora, logo no Preâmbulo do diploma o legislador deu claramente conta daquela que era a sua intenção: promover uma maior eficiência e celeridade na recuperação das quantias devidas ao exequente, prevendo para tanto o pagamento de uma remuneração adicional ao agente de execução quando a recuperação da quantia tenha tido lugar na sequência de diligências por si promovidas. E tanto assim é que não há lugar a nenhuma remuneração adicional quando, no início do processo, a dívida seja satisfeita de modo voluntário, sem a intermediação do agente de execução”. ”; já a outra corrente, como também se menciona no mesmo acórdão, tem “(,..)cobertura jurisprudencial, entre outros, nos seguintes doutos arestos [14]: - RP de 02/06/2016 - Relator: Aristides Rodrigues de Almeida, Processo n°. 5442/13.9TBMAI-B.P1 ; - RL de 09/02/2017 - Relator: Ezagüy Martins, Processo n°. 24428/05.0YYLSB-F.L1-2; - RP de 11/01/2018 - Relator: Paulo Dias da Silva, Processo n°. 3559/16.7T8PRT-B.P1. ”

Nesse mesmo Ac. TRL de 26.9.2019 (Arlindo Crua) conclui-se no respetivo sumário que “Para ocorrer pertinência no pagamento da remuneração adicional prevista nos n°s. 5 e 6, do art°. 50°, da Portaria n°. 282/2013, de 29/08, deve o valor recuperado ou garantido no processo executivo derivar da atividade ou das diligências promovidas pelo agente de execução ; - Donde, seria logicamente um desvirtuar das finalidades ínsitas a tal acréscimo de remuneração, reconhecer a sua existência e exigibilidade quando o resultado obtido não emerge ou decorre daquela atividade ou diligências, por às mesmas ser alheio, por as mesmas terem-se desenvolvido independentemente da sua vontade ou contributo, por não ter tido qualquer intervenção ou participação naquela recuperação ou garantia do crédito;

- Deste modo, constitui-se o direito a tal acréscimo remuneratório quando, existindo, por um lado, sucesso nas diligências executivas (recuperação ou entrega de dinheiro ao credor exequente ; liquidação dos bens ; adjudicação ou consignação de rendimentos ; ou, pelo menos, concreta penhora de bens ; o estabelecimento de um acordo de pagamento), este decorra ou _provenha em consequência, decorrência ou como fruto da atividade ou diligências realizadas pelo agente de execução ; - O que implica, necessariamente, não dever inferir-se ou concluir-se no sentido de que um qualquer mecanismo de resolução extrajudicial, obtido entre o exequente e o executado (com eventual participação de terceiros), tenha por fonte ou causa a atuação ou as diligências praticadas pelo agente de execução. O que surge com maior acuidade, nomeadamente, quando estas se limitam à realização dos atos ou diligências normais ou previstos na regular tramitação do processo executivo, englobados na remuneração fixa prevista no Anexo VII da citada Portaria;”

Tendemos atualmente, após mais aturada ponderação, a aderir ao entendimento de que a remuneração adicional exige um nexo causal entre a recuperação de valores para a execução e a atividade desenvolvida pelo agente de execução, ou seja, à tese do acima citado acórdão. Por conseguinte, no caso o pagamento obtido pela exequente em resultado do acordo firmado com a executada é alheio à atividade desenvolvida pela senhora Agente de execução como acima já analisamos, não sendo a penhora também contributiva de tal acordo, nem por isso do pagamento. Ora existindo valor recuperado é a este que se deve atender para efeito de cálculo da remuneração adicional, perdendo por isso relevância a garantia anterior, penhora, que só é atendida se na execução se não chegar à fase seguinte da recuperação. E na recuperação propriamente dita, como se viu, a atividade da senhora AE não teve qualquer contributo.

De todo o modo, mesmo que assim se não entendesse e se defendesse que existindo a penhora do imóvel cujo valor atribuído no auto é superior ao valor da execução que a senhora AE tomou como referência para calcular o valor da remuneração adicional, e por isso seria devida essa remuneração dada a existência da garantia resultante da penhora realizada pela agente de execução, sempre se impunha, então, ajuizar da medida dessa retribuição, tendo em conta o excesso e desproporção que vêm invocados pela executada.

E a nosso ver na situação aqui em apreço em que apenas existe de relevante a realização pela agente de execução da penhora de um imóvel indicado à penhora pela própria exequente, ficando a execução suspensa após a penhora e não tendo mais nenhuma sequência a não ser a sua extinção por via do acordo/transação das partes, o pagamento da quantia de €243.280,54 a título de remuneração adicional, não se mostra consentido por se revelar desproporcionado e excessivo, não se conformando por isso com os princípios constitucionais, mormente o princípio da proporcionalidade e proibição de excesso.

Sobre a questão da inconstitucionalidade do n.°5 do art.50.° da Portaria 282/2013 de 29.8 pronunciou-se o Ac. do TRP, de 2.6.2016 (Aristides Rodrigues de Almeida), acessível em www.dgsi.pt, constando do respetivo sumário,

“I - O critério da constituição do direito à remuneração adicional é a obtenção de sucesso nas diligências executivas, o que se verifica sempre que na sequência das diligências do agente de execução se conseguir recuperar ou entregar dinheiro ao exequente, vender bens, fazer a adjudicação ou a consignação de rendimentos, ou ao menos, penhorar bens, obter a prestação de caução para garantia da quantia exequenda ou que seja firmado um acordo de pagamento.

II - A remuneração adicional do agente de execução prevista na Portaria n. ° 282/2013, de 29.08, é sempre devida desde que haja produto recuperado ou garantido, exceto, nos processos executivos para pagamento de quantia certa em que há lugar à citação prévia do executado, se este efetuar o pagamento integral da quantia em dívida até ao termo do prazo para se opor à execução.

III - O artigo 50. °, n. ° 5, em conjugação com a tabela VIII, da Portaria n. ° 282/2013, interpretado no sentido de permitir que o agente de execução possa pedir de remuneração variável mais de €73.000,00 quando apenas procedeu à penhora de quatro imóveis indicados pelo exequente e hipotecados para garantia do crédito exequendo e, por sua iniciativa, à penhora de um crédito, após o que a execução se extinguiu por acordo de pagamento entre exequente e executado, é inconstitucional por violação dos princípios da proporcionalidade e da proibição do excesso ínsitos no princípio do Estado de direito democrático consignado no artigo 2. ° da Constituição.

IV - É ainda inconstitucional por violação do direito de acesso à justiça e aos tribunais na medida em que da referida norma resulte responsabilidade para o próprio exequente, o qual, face ao custo desmesurado que poderá ter de suportar com o pagamento ao agente de execução nos casos em que o seu direito de crédito tenha um valor significativo, verá significativa e desproporcionadamente cerceado o seu direito de acesso à justiça sempre que for incerta a existência de bens cuja penhora e venda possa gerar um produto suficiente para aquele pagamento.”

O juízo de inconstitucionalidade assente na violação dos princípios da proporcionalidade e da proibição de excesso, haveria de ser transposto para a situação da presente execução, caso se entendesse que apenas pela realização da penhora a senhora AE teria direito à remuneração adicional. Colhe aqui e com especial ênfase as referências e considerações tecidas decorrentes das normas relativas a custas e jurisprudência constitucional nessa matéria, e muito em particular a consagração - a que não pode ser alheia a discussão de (não) conformação constitucional a que se vinha assistido e as decisões proferidas - no n.°7 do art.6.° do Regulamento das Custas Processuais da possibilidade do juiz dispensar o pagamento da taxa de justiça remanescente nas causas de valor superior a €275 000, se a especificidade da situação o justificar atendendo à complexidade da causa e à conduta processual das partes, permitindo por conseguinte e em concreto que seja ajuizada da relação entre a atividade desenvolvida e o custo que a mesma haverá de representar para as partes. Como é sabido, antes da introdução de tal norma discutia-se efetivamente no domínio da legislação anterior a inconstitucionalidade das normas que não impunham nenhum limite à taxa de justiça e faziam atuar apenas o valor da ação, sem qualquer consideração sobre a complexidade da causa ou outros fatores relevantes. Contudo, já não são recentes as alterações legais, tendo em vista mitigar o efeito da aplicação automática do valor da ação e contornar assim as questões de inconstitucionalidade que se vinham colocando. Efetivamente, o DL n.°324/2003 de 27 de dezembro diploma que, alterou o art.27.° do CCJ, impondo embora de forma ainda mitigada um limite à taxa de justiça inicial e subsequente e permitindo que o juiz dispense o pagamento do remanescente nas circunstâncias do n.°3, ou que tal remanescente não seja pago (independentemente de qualquer decisão) nos casos previstos no n.° 4, traça já caminho nesse desiderato. Trata-se de medidas que deixam já antever a necessidade de, em certos casos, se estabelecer um limite à taxa de justiça devida a final, a qual tendo apenas em conta o valor da ação pode atingir montantes muito elevados sem correspondência no serviço prestado ou atividade desenvolvida no processo que os justifique materialmente, ou seja, que os justifique à luz do princípio da proporcionalidade entre o que é devido e o correspondente serviço, no pressuposto de que nos encontramos em face de normas que impõem o pagamento de uma taxa e não de um imposto (sendo que a distinção entre as duas figuras passa essencialmente pelo carácter sinalagmático da taxa que tem como correspetivo - ainda que apenas numa parte do seu valor - a prestação de um serviço ou um beneficio direto para o seu devedor). Também o art.73.°-B, introduzido pelo mesmo diploma que alterou a versão de 1996 do CCJ, ia no mesmo sentido limitador. E podemos dizer que no Regulamento das Custas Judiciais o legislador já consagrou outros critérios além do valor do processo para efeitos de fixação da taxa de justiça e custas a final, opção que não pode ser alheia, como já se disse, ao posicionamento do Tribunal Constitucional sobre a matéria, concretamente o acórdão n.° 227/2007 reportado às normas dos art.13.° n.°1 e tabela anexa, 15.° n.° 1 m) e 18.° n.° 2 do CCJ na versão anterior à entrada em vigor do DL 324/2003 de 17 de dezembro.

E é também a este ângulo de visão que foge o n.°5 do art. 50.° da Portaria n.°282/2013 quando permitisse que as partes, no caso a executada, venha a ter que suportar custas - já os montantes devidos ao agente de execução se integram no conceito de custas - em valor superior a duzentos e quarenta mil euros, sem permitir que se atenda às especificidades da execução e ao labor da senhora agente de execução, designadamente, sem permitir qualquer conformação do valor da remuneração adicional à singeleza dos atos praticados pela agente de execução (no caso a penhora, efetuada por comunicação à conservatória, sem que se descortine outros atos e, sem perder de vista que os atos concretos levados a cabo pela AE são remunerados pela tabela fixa) e às especificidades da execução, que fica suspensa após a penhora e até à sua extinção. O limite dessa remuneração adicional no presente caso tem apenas como baliza o valor da execução. O montante da remuneração adicional no caso concreto e atentas tais circunstâncias prefigura-se como desproporcionado, desequilibrado na economia custo-benefício do recurso à justiça (e note-se que o exequente tem sempre - salvas raríssimas exceções que não se aplicam neste caso - que indicar agente de execução para cobrar coercivamente uma quantia em processo executivo, não permitindo o sistema solução menos onerosa.). Por outro lado, tal custo, sem nenhuma “válvula de escape”, mormente um teto máximo que não apenas o do valor da execução, em execuções com valor elevado, contende com o principio de acesso à justiça, na medida em que impõe um pagamento excessivo, sempre que, como no caso, hajam sido efetuadas penhoras, findando a execução numa fase precoce por acordo das partes a que o agente de execução é alheio; donde, a abdicar-se da exigência de nexo causal, a norma em causa, n.°5 do art.50.°, por referência à tabela VIII, que consentisse que a remuneração adicional a pagar se cifre em €243.280,54 (iva incluído), revela-se inconstitucional por violação dos princípios da proporcionalidade, da proibição de excesso decorrentes do principio de Estado de Direito Democrático consagrado no art.2.° da CRP, e do principio de acesso à justiça e aos tribunais, o que impediria a sua aplicação.”

Em conformidade com este entendimento, concluiu o Tribunal a quo que no caso dos autos não é devida remuneração adicional à apelante, e em consequência, julgou procedente a reclamação apresentada pela executada e ora apelada.

Concordamos inteiramente com o entendimento vertido no já citado ac. RL 26-09-2019 (Arlindo Crua), p. 6186/15.2T8LSB-A.L1-2 e na decisão recorrida, sendo de sublinhar a forma aprofundada completa como o Tribunal a quo abordou a questão, tendo aliás ponderado todos os argumentos invocados pela apelante nas suas conclusões de recurso.

Na verdade, e como se refere no citado acórdão:

“(…) também se nos afigura decorrer do quadro legal enunciado, e sua interpretação, que para existir lugar à remuneração adicional, deve o valor recuperado ou garantido no processo executivo derivar da atividade ou das diligências promovidas pelo agente de execução.

Donde, seria logicamente um desvirtuar das finalidades ínsitas a tal acréscimo de remuneração, reconhecer a sua existência e exigibilidade quando o resultado obtido não emerge ou decorre daquela atividade ou diligências, por às mesmas ser alheio, por as mesmas terem-se desenvolvido independentemente da sua vontade ou contributo, por não ter tido qualquer intervenção ou participação naquela recuperação ou garantia do crédito.

Deste modo, constitui-se o direito a tal acréscimo remuneratório quando, existindo, por um lado, sucesso nas diligências executivas (recuperação ou entrega de dinheiro ao credor exequente; liquidação dos bens; adjudicação ou consignação de rendimentos; ou, pelo menos, concreta penhora de bens; o estabelecimento de um acordo de pagamento), este decorra ou provenha em consequência, decorrência ou como fruto da atividade ou diligências realizadas pelo agente de execução.

O que implica, necessariamente, não dever inferir-se ou concluir-se no sentido de que um qualquer mecanismo de resolução extrajudicial, obtido entre o exequente e o executado (com eventual participação de terceiros), tenha por fonte ou causa a atuação ou as diligências praticadas pelo agente de execução. O que surge com maior acuidade, nomeadamente, quando estas se limitam à realização dos atos ou diligências normais ou previstos na regular tramitação do processo executivo, englobados na remuneração fixa prevista no Anexo VII da citada Portaria.

Ademais, não se olvide, nos termos já expostos, que a remuneração do agente de execução deve ser proporcional e adequada, eivada de um juízo de razoabilidade e de adequação à sua atividade concretamente desenvolvida, empenho revelado, diligência evidenciada e real contributo para o resultado obtido no respetivo processo executivo.”

Acrescentaríamos apenas três notas:

A primeira para atualizar as referências jurisprudenciais invocadas na decisão recorrida, indicando dois acórdãos proferidos em datas próximas da prolação de tal decisão:

- O ac. RE 10-10-2019 (Florbela Lança), p. 1984/13.4TBABF.E1, que subscreve a tese adotada na decisão recorrida;

- O ac. RL 07-11-2019 (Anabela Calafate), p. 970/17.0T8AGH-A.L1-6, que subscreve a tese defendida pela apelante.

A segunda para reconhecer que MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA[...] sustentou, posição semelhante à invocada pela apelante, com argumentos que, salvo o devido respeito, não nos convencem, na medida em que, como se expôs na decisão recorrida, tendo as penhoras lugar antes da citação, o executado nunca tem conhecimento das mesmas antes de ser chamado ao processo, o que significa que terminando o processo por acordo entre exequente e executado sem que o agente de execução tenha tido qualquer intervenção ou papel na conciliação daqueles, não é possível imputar-se o desfecho da causa ao labor do agente de execução, sendo certo que decorre do preâmbulo da portaria 282/2013 que esse é o fundamento da remuneração adicional.

No caso dos autos essa conclusão é aliás reforçada, na medida em que o crédito exequendo e legais acréscimos foram garantidos através da caução prestada pela executada sendo certo que, como sustenta a apelada, o acordo que firmou com a exequente previa o pagamento extrajudicial da quantia exequenda, o que se confirma em função do teor do mesmo acordo (cfr. fls. 189-190).

A terceira, para reiterar que não faz sentido que a apelante seja remunerada em função de penhoras cujo levantamento foi determinado pelo Tribunal na sequência de oposição à penhora, e com fundamento no excesso quantitativo, sendo certo que, como se refere na sentença proferida no apenso C, uma das penhoras levantadas [...] foi inclusivamente levada a cabo numa altura em que a execução já se achava suspensa, na sequência da prestação de caução pela executada. Como se lê na fundamentação da sentença proferida no apenso C, “(…) tendo a senhora AE penhorado primeiro o imóvel a que atribuiu valor superior a 7 milhões de euros e tendo também à data notificado a requerida do valor em dívida que era inferior ao valor atribuído a esse imóvel, afigura-se-nos que logo aí ao proceder a sucessivas e subsequentes penhoras já as mesmas se configuravam excessivas (…)”.

A decisão recorrida considerou por isso – e bem – que a única iniciativa relevante que a apelada tinha levado a cabo nos autos de execução com vista à satisfação do crédito exequendo e legais acréscimos consistiu na penhora de imóvel que foi mantida.

Nesta conformidade, nada mais havendo a acrescentar a tal fundamentação, e porque entendemos que seria inútil afirmar o mesmo com palavras diferentes, só nos resta aderir ao entendimento manifestado pela 1ª instância, e confirmar o decidido."

*3. [Comentário] Apenas uma nota pessoal: não sem agradecer a gentileza da citação, cabe referir que no link indicado no acórdão transcreve-se apenas o ac. RL 11/1/2018 (3559/16.7T8PRT-B.P1), sem se expandir qualquer opinião sobre a tese nele defendida.

MTS