«Deve, desde já, afirmar-se que o despacho reclamado fez a correta aplicação da lei processual ao caso concreto, não sendo, efetivamente, admissível o recurso de revista.
Na reclamação que apresenta contra esse despacho, o recorrente-reclamante entende que a revista cabe no âmbito de admissibilidade do art.671º, n.1 do CPC. Embora reconheça que está em causa uma decisão de natureza interlocutória, o reclamante desenvolve uma tese pretendendo equiparar decisões interlocutórias sobre admissibilidade de meios de prova às decisões previstas no art.671º, n.1, in fine. Sustentando que as decisões interlocutórias se dividem em interlocutórias meramente formais e interlocutórias substanciais ou materiais, o reclamante entende que o acórdão recorrido se encontraria nesta última categoria, pelo que a revista seria comportável no âmbito do artigo 671º, n.1 do CPC.
Tal tese não tem o mínimo suporte na letra da lei (que não procede a qualquer distinção quanto a tipologias de decisões interlocutórias), tal como não tem qualquer suporte doutrinal ou jurisprudencial.
As citações doutrinais que reproduz no seu requerimento em nada servem a tese que sustenta, quando lidas com a devida atenção e no devido contexto, pois aí não se dá acolhimento à ideia de que uma decisão interlocutória como a dos presentes autos possa caber no âmbito de admissibilidade do art.671º, n.1 do CPC.
As regras que disciplinam a admissibilidade (ou inadmissibilidade) dos recursos não são suscetíveis de interpretação analógica. São normas que servem a certeza e a segurança dos atos processuais, não se prestando a interpretações subjetivas baseadas nas particularidades dos casos concretos. Assim, não é por o recorrente entender que determinado meio de prova é muito importante para o seu caso que a decisão da segunda instância passará a ser suscetível de revista.A natureza interlocutória de uma decisão assenta em critérios objetivos, e define-se por delimitação negativa do âmbito de admissibilidade da revista estabelecido pelo n.1 do art.671º. Assim, as decisões que são proferidas antes do conhecimento do mérito da causa (e que não põem fim ao processo por outras razões) são decisões que respeitam a questões inerentes à marcha do processo; logo, são decisões interlocutórias. Questões essas que o legislador pretendeu que fossem decididas de modo célere – excluindo, em regra, o acesso ao STJ – evitando demoras que se projetariam no tempo da prolação da decisão final.Como afirma Maria dos Prazeres Beleza: são “razões de celeridade, combinadas com a natureza processual da matéria em causa, que justificam a irrecorribilidade para o Supremo Tribunal de Justiça de acórdãos da Relação que apreciem recursos interpostos de decisões interlocutórias em matéria processual da 1ª instância. É bom de ver que os recursos de decisões interlocutórias carecem de ser julgados rapidamente, tendo em conta os efeitos de um eventual provimento; a inadmissibilidade de dois graus de recurso, restrita às decisões interlocutórias da 1ª instância em matéria processual, tem implícita a consideração de ser mais simples decidir em matéria processual do que em questões de mérito.”1
Apesar da natureza interlocutória das decisões respeitantes aos meios de prova, o legislador não excluiu a reapreciação de tal tipo de decisões, pois conferiu às partes o direito a um grau de recurso – a apelação – [art.644º, n.2, alínea d)], assim se alcançando um equilíbrio entre o direito ao recurso (enquanto expressão da tutela jurisdicional efetiva) e as razões de celeridade processual que servem o interesse geral da boa administração da justiça.No caso presente, a decisão que foi alvo de apelação não conheceu do mérito da causa, nem pôs fim ao processo (por outras razões), sendo, portanto, uma decisão de natureza interlocutória. Assim, a revista nunca poderia ser admitida nos termos do art.671º, n.1. Tal revista só poderia ser admitida caso se demonstrasse o preenchimento de alguma das hipóteses previstas nas alíneas a) e b) do n.1 do art.671º, o que manifestamente não ocorre no caso concreto.»
«Os acórdãos da Relação que apreciem decisões interlocutórias que recaiam unicamente sobre a relação processual só podem ser objeto de revista nas situações referidas nas als. a) e b) do n.º 2 do art. 671.º do CPC.O acórdão da Relação que recai sobre decisão interlocutória confinada à relação processual não é suscetível de recurso de revista excecional, por a situação quadrar precisamente no disposto no art. 671.º, n.º 2, do CPC.»
«Tendo o acórdão recorrido apreciado decisão interlocutória da 1.ª instância que incidiu unicamente sobre a relação processual, o recurso de revista apenas pode ser admitido nas situações previstas nas als. a) e b) do n.º 2 do art. 671.º do CPC.»
[MTS]