Como é afirmado por Salvador da Costa, a reconstituição do pensamento legislativo que presidiu ao disposto neste normativo não se revela fácil (cf. Salvador da Costa, em «Alteração do Registo das Custas pela Lei n.º 27/2019, de 28 de março», disponível em https://drive.google.com/file/d/1rBagyGN1ZLMvaWaUUA7tFzSGc4CR99BK/view).
De todo o modo, na fixação do seu sentido e alcance, partiremos do pressuposto de que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (n.º 3 do art.º 9.º do Código Civil).
Assim sendo, verificamos, desde logo, que o legislador pretendeu criar uma norma de efeito equivalente àquela que se encontrava prevista no n.º 6 do referido art.º 26.º do RCP, de acordo com a qual se a parte vencida for o Ministério Público ou gozar do benefício de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, «o reembolso das taxas de justiça pagas pelo vencedor é suportado pelo Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, I. P.».
Atualmente, e face às normas acima identificadas, o Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, I.P. é responsável pelo reembolso da taxa de justiça paga pela parte vencedora, quando for parte vencida na ação o Ministério Público ou o beneficiário do apoio judiciário, na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo; e, por outro lado, o Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, I.P. é beneficiário das custas de parte pagas (leia-se, taxa de justiça) pela parte vencida, quando o beneficiário do apoio judiciário, na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, for parte vencedora na ação.
E dizemos apenas taxa de justiça paga, porque, quanto aos demais elementos que integram as custas de parte (isto é, os encargos e os honorários), os mesmos já são levados a regra de custas, por força do disposto nas subalíneas i) e ii) da alínea a) do art.º 16.º e alínea c) do n.º 3 do art.º 30.º do RCP, do art.º 36.º da Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, e do n.º 1 do art.º 8.º da Portaria n.º 10/2008, de 3 de janeiro. Pelo que o sentido daquela expressão «custas de parte pagas» só terá alguma utilidade se for entendida como dizendo respeito a «taxa de justiça paga».
Quando o Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, I.P. é responsável pelo reembolso da taxa de justiça, sabemos que o reembolso da taxa de justiça não depende da apresentação da nota discriminativa de custas de parte, mas tão-só de requerimento dirigido ao juiz, apresentado pela parte vencedora no processo (cf. Salvador da Costa, em «As Custas Processuais, Análise e Comentário», 7.ª edição, Almedina, p. 236).
Resta saber qual o procedimento que deve ser adotado quando o Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, I.P. é beneficiário das custas de parte pagas (leia-se, taxa de justiça paga) pela parte vencida, nos termos do n.º 7 do art.º 26.º do RCP.
A resposta encontra-se na alínea f) do n.º 3 do art.º 30.º do RCP, de acordo com a qual a conta é processada pela secretaria, através dos meios informáticos previstos e regulamentados por portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça, nela devendo ser, nomeadamente, indicados os montantes a pagar ou, quando seja caso disso, a devolver à parte responsável.
E este procedimento é coerente com o sistema de custas processuais.
Isto porque estamos perante um crédito que é devido pela parte vencida ao Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, I.P., cujo montante é equivalente ao valor da taxa de justiça paga pela parte vencida. E, atenta a particularidade das circunstâncias, a existência de tal crédito não depende do envio de nota discriminativa e justificativa de custas de parte nem, tão-pouco, de um pagamento da taxa de justiça pela parte vencedora. Tal direito de crédito do IGFEJ nasce da verificação dos elementos da previsão n.º 7 do art.º 26.º do RCP: o primeiro, a existência de uma parte vencedora que é beneficiária de apoio judiciário, na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, e, o segundo, o pagamento de custas de parte (leia-se, taxa de justiça) pagas pela parte vencida.
Além de que há uma obrigação que a lei faz impender sobre a secretaria, que é a de processar a conta nela indicando, nomeadamente, os montantes a pagar ou, quando seja caso disso, a devolver à parte responsável [alínea f) do n.º 3 do art.º 30.º do RCP]. E um dos montantes a pagar é aquele que resulta do n.º 7 do art.º 26.º do RCP, de acordo com o qual a parte vencida ao Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, I.P. deve um montante equivalente às «taxas de justiça pagas».
Por último, este entendimento não contende com o n.º 1 do art.º 30.º da Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de abril, que estabelece que «[a]s custas de parte não se incluem na conta de custas», uma vez que não estamos perante meras custas de parte, mas antes perante um crédito devido ao Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, I.P. nascido ao abrigo do n.º 7 do art.º 26.º do RCP.
Este procedimento permite ainda ultrapassar a dificuldade relativa à não intervenção do Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, I.P. em cada um dos processos em que teria direito ao crédito equivalente à «taxa de justiça paga» pela parte vencida e em que não é notificado da sentença proferida por forma a solicitar, processo a processo, os créditos que lhe são devidos, sendo que a diferença entre os beneficiários deste crédito justifica a diferença de tratamento na forma da respetiva liquidação.
Face ao acima exposto, a conta reclamada não merece censura e deve manter-se nos seus precisos termos, pelo que, sem necessidade de outros considerandos, indefere-se a reclamação da conta de custas apresentada pelo Digno Magistrado do Ministério Público."
[MTS]