"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



18/09/2024

Jurisprudência 2024 (7)

 
Recurso de revista;
acção de arrendamento*

 
1. O sumário de STJ 11/1/2024 (786/22.1 T8PTM.E1.S1) é o seguinte:

O artigo 629.º, n.º 3, alínea a), do Código de Processo Civil assegura o recurso para o Tribunal da Relação, e só o recurso para o Tribunal da Relação.
 
 
2. Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:

"11. A Ré, agora Recorrente, interpôs recurso de revista excepcional.

12. O recurso de revista excepcional pressupõe o preenchimento dos requisitos gerais de admissibilidade do recurso de revista, designadamente dos requisitos relacionados com o conteúdo da decisão recorrida — art. 671.º, n.º 1 —, com a alçada e com a sucumbência — art. 629.º, n.º 1 —, com a legitimidade dos recorrentes — art. 631.º — e com a tempestividade do recurso — art. 638.º do Código de Processo Civil [---]

13. Em consequência,

“[p]ara se determinar se é, no caso, de admitir a revista excepcional, deve começar por se apurar se, no caso concreto, estão preenchidos os requisitos gerais de admissibilidade da revista, rejeitando logo o recurso, sem necessidade de apreciação dos requisitos específicos, se se concluir que não se mostram verificados tais requisitos” [Cf. acórdão do STJ de 22 de Fevereiro de 2018 — processo n.º 2219/13.5T2SVR.P1.S1]

14. O art. 629.º, n.º 1, do Código de Processo Civil determina que

O recurso ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal, atendendo-se, em caso de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, somente ao valor da causa.

15. Ora, o tribunal de que se recorre é o Tribunal da Relação e a alçada da Relação é, desde 1 de Janeiro de 2008 [---], de 30 000 euros [---].

16. O valor da causa foi fixado pelo Tribunal de 1.ª instância em 14.158,65 euros — com o seguinte explicação: “(300x30 meses=9.000,00+ € 5.158,65) – (catorze mil cento e cinquenta e oito euros e sessenta e cinco cêntimos) - art.296.º, 297.º, n.º 1, 298.º, n.º 1 e 306.º, do Código de Processo Civil”.

17. Embora o art. 629.º, n.º 3, alínea a), do Código de Processo Civil determine que,

“Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso para a Relação:

a) Nas ações em que se aprecie a validade, a subsistência ou a cessação de contratos de arrendamento, com exceção dos arrendamentos para habitação não permanente ou para fins especiais transitórios; […]”

a disposição legal em causa assegura, tão-só, o recurso para o Tribunal da Relação e não para o Supremo Tribunal de Justiça [---]

18. O art. 629.º, n.º 3, alínea a), do Código de Processo Civil assegura um segundo grau de jurisdição [---], e só um segundo grau de jurisdição [---]

19. O caso sub judice é um dos casos prototípicos em que o Tribunal da Relação conhece do objecto do processo enquanto tribunal de recurso, e só enquanto tribunal de recurso [---]

20. Em tais casos prototípicos, o art. 629.º, n.º 3, alínea a), do Código de Processo Civil assegura o recurso para o Tribunal da Relação, e só o recurso para o Tribunal da Relação.

21. Ora, no caso sub judice, a Ré, agora Recorrente, pretende o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.

22. Em termos em tudo semelhantes aos da fundamentação do acórdão do 14 de Setembro de 2023 — processo n.º 13600/21.6T8PRT.P1.S1 —, dir-se-á que

“a situação de ‘recurso sempre admissível’, invocada pelo recorrente e fundada no artigo 629.º, n.º 3, al. a) do CPC, não se verifica [...] pois o que está em causa é um recurso para o Supremo Tribunal de Justiça e não para a Relação”.
 
 
3. [Comentário] O STJ decidiu bem, dado que o valor da causa não excede o valor da alçada da Relação.

Importa acentuar que o disposto no art. 629.º, n.º 3, al. a), CPC não significa, de modo algum, que, se o valor da causa permitir a interposição de um recurso de revista, este recurso não seja admissível. De outra forma, transformar-se-ia uma regra que se destina a beneficiar aquele que, tendo celebrado um contrato de arrendamento, é parte numa acção cujo valor não excede a alçada da 1.ª instância numa regra que prejudicaria esse contraente numa acção cujo valor é superior à alçada da Relação. A finalidade do disposto naquele preceito é a de beneficiar as partes, nunca a de as prejudicar.

MTS