"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



23/10/2014

Jurisprudência (37)


Indivisibilidade da confissão

Segundo o respectivo sumário, STJ 9/10/2014 (311/11.0TCFUN.L1.S1) decidiu o seguinte:

"1. De acordo com o princípio da indivisibilidade da confissão a que alude o art. 360.º do CC, se uma declaração complexa feita em depoimento de parte, requerido pela contraparte, contiver afirmações de factos desfavoráveis ao depoente, mas também factos que lhe são favoráveis, a contraparte que se quiser aproveitar de tal confissão como meio de prova plena deve, de igual modo, aceitar a realidade dos factos que lhe são desfavoráveis. Tendo que produzir oportuna declaração em que se reserva o direito de provar o contrário dos factos que lhe são desfavoráveis. Adquirindo, então, a confissão dos factos favoráveis, mediante a prova contrária dos factos que lhe desfavoráveis, a eficácia de prova plena. 

2. A indivisibilidade da confissão complexa tem, pois, como consequência a inversão do ónus da prova quanto à parte favorável ao confitente. 

3. Não tendo a autora cumprido tal ónus, face à confissão complexa da ré, há que considerar também como verdadeiros os factos  favoráveis ao confitente. 

4. Deve entender-se que o silêncio da contraparte, face a uma confissão complexa (feita perante si), não tomando qualquer posição, leva a que a mesma (confissão) se torne eficaz (quer quanto aos factos favoráveis, quer quanto aos desfavoráveis)."

II.  O acórdão aplica, de forma clara e totalmente correcta, o regime legal sobre a indivisibilidade da confissão. No caso em análise, a autora deveria ter extraído, ainda em 1.ª instância, as consequências da indivisibilidade da confissão (complexa) realizada pelo réu e ter provado o contrário do facto favorável alegado por este confitente (in casu, a aceitação da satisfação do montante ainda em dívida através da restituição de uma das betoneiras que a ré adquirira à autora).

Permita-se apenas uma nota de direito comparado sobre a matéria. No direito alemão vigora, atendendo ao disposto no § 290 ZPO, a regra da divisibilidade da confissão, pelo que se, por exemplo, o réu confessar que recebeu dinheiro do autor, mas alegar que o fez como donatário e não como mutuário, fica assente a entrega do dinheiro, mas permanece controvertida a celebração de um contrato de mútuo ou de doação. Quer dizer: os factos favoráveis ao confitente não são abrangidos pelo valor atribuído à confissão, pelo que, na hipótese de serem impugnados pela contraparte, recai sobre o confitente o ónus de realizar a sua prova (cf. v. g., MünchKommZPO/Prütting (2013), § 290 2). A solução contrasta com a inversão do ónus da prova que, quanto às afirmações favoráveis ao confitente, resulta do regime da indivisibilidade da confissão.


MTS