Dever de fundamentação da decisão; matéria de facto
1. É o seguinte o sumário de RP 20/10/2014 (756/13.0TTVNG.P1):
"I – A fundamentação consiste na indicação das razões de facto e de direito que conduzem o julgador, num raciocínio lógico a decidir em determinado sentido. Mas essa indicação não pode ser feita por simples adesão para os fundamentos indicados pelas partes – n.º 2 do preceito [isto é, do art. 154.º do Cód. Proc. Civil]. Proíbe-se, deste modo, esta fundamentação passiva, por simples adesão: as razões hão-de ser expostas num discurso próprio, assente numa análise e ponderação também próprias.
II – Assim, decidida a causa através de sentença, sem se ter assentado expressamente os factos provados e não provados e respectiva fundamentação, tal decisão é de anular, atento o disposto no artigo 662.º, n.º 2, alínea c), do Cód. Proc. Civil.
III – Mesmo que as partes tenham por requerimento acordado na matéria de facto, tal não dispensa o Tribunal de prolatar despacho onde enumere quais os factos que considere provados e não provados e a respetiva fundamentação, devendo, se necessário, caso os restantes factos não abrangidos pelo acordo das partes sejam relevantes para a decisão da causa, proceder ao respetivo julgamento."
2. Transcrevendo o decidido num outro acórdão, afirma-se no acórdão em análise o seguinte:
"Conforme se refere no Acórdão desta Secção de 04/07/2011 [378/10.8TTVNG.P1], «desta disposição [isto é, do art. 712.º, n.º 4, aCPC, correspondente ao art. 662.º, n.º 2, al. c), nCPC] decorre que se a decisão da matéria de facto contiver os vícios [aí] apontados, a decisão pode ser anulada pela Relação, mesmo oficiosamente.Tem-se entendido que tal estatuição deverá ser aplicada àquelas situações em que se assentou os factos na sentença, mas se omitiu o despacho de resposta aos quesitos e respectiva fundamentação ou o despacho a assentar a matéria de facto provada e não provada e respectiva fundamentação. Igualmente se tem entendido que se a decisão da matéria de facto omitir a relação dos factos não provados, é de aplicar a mesma disciplina. Por último, também se tem entendido que a norma é de aplicar nos casos em que a decisão da matéria de facto foi completamente omitida, quer quanto aos factos provados, quer quanto aos não provados, quer quanto à respectiva fundamentação, como sucede in casu. Ora, relativamente a esta última situação, que é a nossa, a aplicação da norma impõe-se, se não por maioria, pelo menos por identidade de razão. Na verdade, se uma decisão da matéria de facto, deficiente, obscura ou contraditória, impede a Relação de sindicar, quer a decisão de facto, quer a decisão de direito, a omissão da decisão de facto impede, em absoluto e em toda a extensão, a referida sindicância. Daí que, a nosso ver, a disciplina constante da norma em apreço é igualmente aplicável aos casos em que a decisão da matéria de facto foi completamente omitida»".
Interessa apenas acrescentar que a decisão de 1.ª instância que não conhece de matéria de facto de que devia conhecer -- ou que omite por completo esse conhecimento -- é nula (cf. art. 615.º, n.º 1, al. d), nCPC). A aplicação do disposto no art. 662.º, n.º 2, al. c), nCPC a um caso em que o conhecimento da matéria de facto tenha sido completamente omitido implica que, nesta hipótese, a nulidade da decisão -- que não é, em regra, conhecida ex officio (cf. art. 615.º, n.º 4, nCPC) -- se torna de conhecimento oficioso.
MTS