Segunda perícia;
requisitos
1. O sumário de RP 27/1/2020 (5818/17.2T8VNG-A.P1) é o seguinte:
I - A segunda perícia que, regulada nos art.s 487º a 489º, do CPC, se destina a corrigir a eventual inexatidão dos resultados da primeira (nº3, do art. 487º, do CPC), não é uma nova e autónoma perícia, antes o seu objeto se tem de conter no âmbito da primeira perícia realizada, movendo-se dentro das questões de facto já, aí, averiguadas.
II - Com a consagração da possibilidade de realização de segunda perícia, visou o legislador tão só possibilitar a dissipação de concretas dúvidas sérias que possam decorrer da primeira perícia, relativas a específicas questões suscetíveis de levar a um resultado distinto daquele que foi alcançado na primeira perícia, para que possam não pairar na perceção de factos relevantes para a decisão de mérito.
III - Para tanto, e não sendo lícito realizar no processo atos inúteis (art. 130º, do CPC), impõe-se que sejam densificadas, com fundamentos sérios, as razões da discordância relativamente ao relatório pericial apresentado, ficando a admissibilidade da segunda perícia dependente dessa fundada alegação, em requerimento tempestivamente apresentado (nº1, do art. 487º, do CPC), sem que o requerente tenha, contudo, de provar essas razões, pois que tal resultado apenas seria a alcançar com a realização da diligência requerida.
IV - Ao pronunciar-se sobre o meio de prova proposto, o tribunal tem, para além de analisar da efetiva afirmação de razões de dissonância (eventual inexatidão nos resultados da primeira que careçam de correção), de verificar se os motivos de discordância são, objetivamente, aptos a alcançar resultado distinto do da primeira perícia.
V - Cabendo ao juiz apreciar da proposição da prova e da sua admissibilidade, regendo-se a segunda perícia pelas disposições aplicáveis à primeira (cfr. art. 488º e, ainda, arts 467º a 486º, do CPC), analisando as razões alegadas, deve indeferir o requerimento sempre que a diligência se revele impertinente ou dilatória ou as questões suscitadas sejam desnecessárias, inadmissíveis ou irrelevantes, do mesmo modo que o podia fazer com relação à primeira (art. 476º, nº1 e 2, do CPC).
VI - É impertinente ou dilatória a perícia que não respeita a factos condicionantes da decisão final ou que, embora a eles respeitando, o respetivo apuramento não dependa de prova pericial, por não estarem em causa os conhecimentos especiais (cfr. art. 388º, do Código Civil) que aquela pressupõe, sendo que o que se pretende do perito é que realize uma observação técnica - objetiva -, do objeto da perícia e relate, no relatório final apresentado, o resultado dessa observação, não podendo integrar o seu objeto qualificações, questões jurídicas, opiniões e avaliações subjetivas, suscetíveis de influenciar a livre convicção do julgador.
VII - A segunda perícia, solicitada em processo de insolvência a questões jurídicas e a matérias que não relevam para a decisão aí a proferir, estando as questões de facto relevantes já assentes ou não dependendo o apuramento das mesmas de prova pericial (por não estarem em causa os conhecimentos especiais que aquela pressupõe) e pretendendo-se célere a decisão, incompatível com as delongas de mais uma perícia, a, meramente, elucidar dúvidas subjetivas e sem relevo para o resultado, é impertinente, dilatória e irrelevante, impondo-se o seu indeferimento.
VIII - Os limites impostos ao direito à prova – visando assegurar maiores valores que se levantam como o da efetiva realização da Justiça, que para efetivamente o ser tem de revestir de racionalização e de ser exercida de modo célere -, que não é um direito absoluto, são materialmente constitucionais, desde que assegurado o respeito pelo princípio da proporcionalidade, observado no caso da segunda perícia, sempre admissível quando requerida e justificada com alegação de razões fundadas, salvaguardando-se sérias inexatidões de resultados da primeira perícia, no que se reporta a factos com relevo para a decisão da causa.
2. Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:
"Insurge-se a apelante contra a decisão que indeferiu o seu requerimento a solicitar a realização de uma segunda perícia, pugnando pela sua admissão, alegando que o Tribunal a quo, ao indeferir a segunda perícia, ignorando as suas razões de discordância em relação ao relatório apresentado, violou, o artigo 487º, do Código de Processo Civil, diploma a que pertencem todos os preceitos citados sem outra referência.
Cumpre, pois, analisar da admissibilidade da segunda perícia, solicitada no próprio requerimento onde é exercido o contraditório ao Relatório Pericial e onde, embora se referindo, na segunda página do requerimento, o que “vem requerer”, se solicita a mesma, a final, invocando apenas os nº1 e 3 do referido artigo, e esclarecendo que os fundamentos que vêm invocados anteriormente “São” “as razões preponderantes, que impedem a Requerida de aceitar os termos do Relatório Pericial apresentado” e que o faz com vista à “substituição de senhor Perito por outro que assuma a função com a necessária isenção e independência”.
Apenas para o caso de se não dar provimento a essa pretensão, requer, então, “ao abrigo do disposto nos nº1 e 3 do artigo 487º do CPC, a realização de Segunda Perícia”, infundadamente, na verdade, adiante-se.
Assim, como bem fundamenta o Tribunal a quo, a requerente apresenta-se a pôr em causa, no requerimento de “resposta” ao relatório pericial, a isenção e a independência de quem o elaborou, sendo essas as razões da discordância que invoca, com vista à substituição do Sr. Perito, requerendo, sem invocação de fundamentos, subsidiariamente, segunda perícia.
Com efeito, fundamentos concretos, específicos, objetivos para a realização da Segunda perícia – sérias inexatidões da mesma - é que, efetivamente, invocados não vêm.
E estatui o nº1, do artº. 487º, do CPC, que “Qualquer das partes pode requerer que se proceda a segunda perícia, no prazo de 10 dias a contar do conhecimento do resultado da primeira, alegando fundadamente as razões da sua discordância relativamente ao relatório pericial apresentado”, que (v. nº 3) “tem por objeto a averiguação dos mesmos factos sobre que incidiu a primeira e destina-se a corrigir a eventual inexatidão dos resultados desta”.
Assim, impõe, presentemente, a lei, para que possa ser admitida segunda perícia, a requerer “no prazo de 10 dias a contar do conhecimento do resultado da primeira”, que, no requerimento, o requerente “alegue fundadamente as razões da sua discordância relativamente ao relatório pericial apresentado”, bem fundamentando a decisão recorrida “Agora, o pedido de segunda perícia tem de ser fundamentado com as razões por que a parte discorda da primeira perícia; não basta requerê-la, sendo exigido a quem a requerer que explicite os pontos em que se manifesta a sua discordância do resultado atingido na primeira, com apresentação das razões por que entende que esse resultado devia ser diferente (cfr. Prof. Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, 2ª ed., pág. 554; no mesmo sentido cfr. acórdão da RG de 7/05/2013, proc. nº. 590-A/2002, acessível em www.dgsi.pt).
A realização da segunda perícia, a requerimento das partes, não se configura como discricionária, pressupondo que a parte alegue, de modo fundamentado e concludente, as razões porque discorda do relatório pericial apresentado.
Como se refere no acórdão do STJ de 25/11/2004, proferido no proc. nº. 04B3648 (acessível em www.dgsi.pt e em CJ. STJ, Ano XII, Tomo III, pág. 123), «[A] expressão adverbial “fundadamente” significa precisamente que as razões da dissonância tenham de ser claramente explicitadas, não bastando a apresentação de um simples requerimento de segunda perícia.
Trata-se, no fundo, de substanciar o requerimento com fundamentos sérios, que não uma solicitação de diligência com fins dilatórios ou de mera chicana processual. E isto porque a segunda perícia se destina, muito lógica e naturalmente, a corrigir ou suprir eventuais inexactidões ou deficiências de avaliação dos resultados a que chegou a primeira»”. [...]
Realizada a perícia, o resultado da mesma é expresso em relatório, no qual o perito se pronuncia fundamentadamente sobre o respetivo objecto (artº 484º do CPC), o qual é notificado às partes, que dele podem reclamar, se entenderem que há nele qualquer deficiência, obscuridade ou contradição, ou que as conclusões não se mostram devidamente fundamentadas (artº 485º nº1 e 2 do CPC). A reclamação consiste, assim, em apontar a deficiência ao relatório apresentado e pedir que a resposta seja completada; em denunciar a obscuridade e solicitar que o ponto obscuro seja esclarecido; em notar a contradição e exprimir o desejo de que ela seja desfeita; ou em acusar a falta de fundamentação das conclusões e pedir que sejam motivadas.
Deferida a reclamação, pode o tribunal determinar que o perito supra as deficiências do relatório, por escrito, ou então que preste os esclarecimentos solicitados, oralmente, na audiência de julgamento (artº 486º do CPC).
Qualquer das partes pode, também, requerer que se proceda a segunda perícia, no prazo de 10 dias, a contar do conhecimento do resultado da primeira.(…)
Actualmente, como resulta do citado artº. 487º nº 1 (correspondente ao 589º nº1 do anterior CPC sem quaisquer alterações), exige-se que, para além da discordância com a primeira perícia, o requerente da segunda perícia alegue fundadamente as razões da sua discordância relativamente ao relatório pericial apresentado.
Ou seja, o pedido de segunda perícia tem de ser fundamentado com as razões por que a parte discorda da primeira perícia. Não basta requerê-la, sendo ainda exigido a quem a requer que explicite os pontos em que se manifesta a sua discordância do resultado atingido na primeira, com apresentação das razões por que entende que esse resultado devia ser diferente (cfr. Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, 2ª ed., pág. 554 e ac desta RG de 7/05/2013, disponível em www.dgsi.pt).
Como se refere no acórdão do STJ de 25/11/2004 (também disponível em www.dgsi.pt.) “A expressão adverbial “fundadamente” significa precisamente que as razões da dissonância tenham de ser claramente explicitadas, não bastando a apresentação de um simples requerimento de segunda perícia. Trata-se, no fundo, de substanciar o requerimento com fundamentos sérios, que não uma solicitação de diligência com fins dilatórios ou de mera chicana processual. E isto porque a segunda perícia se destina, muito lógica e naturalmente, a corrigir ou suprir eventuais inexactidões ou deficiências de avaliação dos resultados a que chegou a primeira” (no mesmo sentido, Ac desta RG de 17/01/2013, também disponível em www.dgsi.pt).
Esta exigência de fundamentação imposta às partes que requeiram a segunda perícia decorre de duas ordens de razões: a primeira, de natureza processual, ou seja, impedir que seja utilizada como "mero expediente dilatório" ou "mera chicana processual"; a segunda, de natureza substantiva, apontar e precisar as razões da discordância com o resultado da primeira perícia, as quais não podem deixar de incidir sobre eventuais inexactidões, insuficiências ou contradições de que padeça a primeira perícia, atento o disposto no n.º 3 do art. 487º do Código de Processo Civil (cfr. neste sentido Ac STJ, de 25-11-2004; da RP, de 23-11-2006 e de 07-10-2008; da RL, de 28-09-2006, todos disponíveis em www.dgsi.pt).
Acentua-se ainda que a segunda perícia não invalida a primeira, sendo uma e outra livremente apreciadas pelo Tribunal (artº. 489º do CPC), sendo a segunda perícia mais um meio de prova que servirá ao tribunal para melhor esclarecimento dos factos (Fernando Pereira Rodrigues “Os Meios de Prova em Processo Civil”, Março de 2015, Almedina, pág. 151 e ac desta RG de 22/06/2010 acessível em www.dgsi.pt)” ” [Ac. da RG de 14/2/2019, processo nº 2587/17.0T8BRG-A.G1 (Relatora: Maria Amália Santos), in dgsi].
Embora se destine a corrigir a eventual inexatidão dos resultados da primeira perícia, os resultados da segunda não têm prevalência sobre os resultados da primeira, nem aquela tem o caráter de recurso desta, sendo ambos os resultados valorados segundo a livre convicção do julgador, fornecendo uma e outra elementos de prova sobre os factos - diga-se já, não sobre direito ou subsunção jurídica, porque esta cabe em exclusivo ao julgador nem sobre factos que apenas podem ser provados por documentos, pois que são eles que têm de ser juntos - que o julgador aprecia livremente, em conjugação com todas as restantes provas, para formar a sua convicção [José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, vol. 2º, 3ª Edição, Almedina, pág 345].
O que a lei teve em vista ao consagrar a possibilidade de realização de segunda perícia foi possibilitar a dissipação de dúvidas sérias que decorram da primeira perícia, por forma a que não subsistam na perceção de factos com relevância para a decisão de mérito.
A segunda perícia pressupõe que sejam invocadas razões de discordância quanto ao juízo técnico da primeira perícia e visa corrigir inexatidões nos resultados a que a primeira perícia chegou.
E o objetivo [a] atingir com a exigência de fundamentação das razões de discordância é, desde logo, evitar segundas perícias dilatórias, exigindo-se, para tanto, à parte que concretize os pontos de facto não suficientemente esclarecidos na primeira perícia, enunciando as razões por que entende que o resultado da perícia deveria ser diferente. A parte tem de indicar os pontos de discordância (as inexatidões a corrigir) e justificar a possibilidade de uma distinta apreciação técnica. Não cabe ao tribunal aprofundar o bem ou o mal fundado da argumentação apresentada, sendo que só a total ausência de fundamentação constitui razão para indeferimento do requerimento para a realização da segunda perícia (RP 10-7-13, 1357/12 e RE 18-9-12, 4162/09). Fundamentando o requerente as razões da sua discordância face ao resultado da primeira perícia, a lei não permite ao juiz uma avaliação de mérito da argumentação apresentada como suporte da divergência, devendo o juiz determinar a realização da segunda perícia, desde que conclua que a mesma não tem caráter impertinente ou dilatório (RP 11-1-16, 4135/14) [António Santos Arantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, O Código de Processo Civil Anotado, vol. I, Almedina, pág 546-547].
O objetivo a alcançar com a exigência de fundamentação das razões de discordância é evitar segundas perícias desnecessárias, inúteis e dilatórias, exigindo a lei, para o evitar, a especificação, a concretização, dos pontos de facto não cabalmente esclarecidos na primeira perícia e a indicação das razões do entendimento de dever o resultado da perícia ter sido diferente, tendo o requerente de indicar os pontos de discordância, isto é, as inexatidões a corrigir, e justificar a possibilidade de uma diversa apreciação técnica. [...]
Indo um pouco mais longe e seguindo a evolução da legislação adjetiva, bem se concluiu no Acórdão da Relação de Guimarães de 14/2/2019 [...], “o requerimento da parte a solicitar a realização da segunda perícia pode ser indeferido pelo tribunal, se se considerar que na primeira perícia o perito já respondeu de forma clara e completa aos quesitos formulados”, referindo-se” “não temos dúvidas em afirmar que a realização da segunda perícia é sindicável pelo tribunal, considerando-se, nomeadamente, que a primeira perícia deu já cumprimento ao pedido da parte e que nela se respondeu já às questões solicitadas, embora não possam ainda ser emitidos juízos de valor sobre o resultado da mesma. A intervenção do tribunal deve aqui limitar-se a aferir se a prova pericial – a primeira perícia – cumpriu já os desideratos(…) Ou seja, a parte tem o dever de justificar o motivo por que pretende a realização da segunda perícia – quais as razões por que discorda da primeira -, competindo ao tribunal verificar se ela tem razão de ser – se existem inexactidões nos resultados da primeira que careçam de correcção.
Ela é, por isso sindicável, como o são, no geral, todas as provas requeridas pelas partes – devendo o tribunal emitir sobre as mesmas um juízo, não só de legalidade, se elas são legalmente admissíveis –, mas também se elas são pertinentes e têm por objecto a prova dos factos que se propõem provar.
Isso mesmo resulta, cremos que de forma clara, do disposto no artº 476º nº1 do CPC, ao ali se referir que “Se entender que a diligência não é nem impertinente nem dilatória, o juiz ouve a parte contrária sobre o objecto proposto, facultando-lhe aderir a este ou propor a sua ampliação ou restrição”, acrescentando o nº 2 que “Incumbe ao juiz, no despacho em que ordene a realização da diligência, determinar o respectivo objecto, indeferindo as questões suscitadas pelas partes que considere inadmissíveis ou irrelevantes ou ampliando-a a outras que considere necessárias ao apuramento da verdade” ”. [...]
É impertinente ou dilatória a perícia que não respeita a factos condicionantes da decisão final ou que, embora a eles respeitando, o respetivo apuramento não depende de prova pericial, por não estarem em causa os conhecimentos especiais que aquela pressupõe[8], sendo que o que se pretende do perito é que realize uma objetiva observação técnica do objeto da perícia e relate, no relatório final apresentado, o resultado dessa observação, devendo ser dela afastadas questões jurídicas, opiniões e avaliações subjetivas, suscetíveis de influenciar a livre convicção do julgador.
Ora, in casu, as inexatidões que o apelante aponta à perícia e aos resultados da mesma, consignados no respetivo relatório, relacionam-se com a imputada falta de isenção e independência ou seja a Requerida, ora Apelante, insurge-se é contra o próprio Perito, cuja substituição solicitou.
Ora, foi indeferido o pedido de substituição do perito (por despacho proferido a fls 1530, transitado em julgado) e a realização de uma segunda perícia revela-se sem fundamento (apenas havendo as alegações efetuadas para apreciação daquele pedido de substituição, que, definitivamente, indeferido se mostra, nenhumas deficiências ou inexatidões se tendo, pois, a considerar, como bem entendeu o Tribunal a quo, que refere, a fundamentar o indeferimento, que “a requerida se limita a invocar as mesmas razões do requerimento de resposta ao relatório do perito.
Acrescenta-se que a perícia foi ordenada (oficiosamente) a fim de permitir ao tribunal conhecer melhor da situação económico-financeira da requerida.
A requerida não nega que deve à requerente, apenas pondo em causa a qualificação do crédito, sendo certo que, quanto a esta, o tribunal não está vinculado á posição das partes, nem do A.I., nem do perito, sendo apreciada no momento oportuno, ou seja, aquando da prolação da sentença de graduação de créditos”.
Assim, e para lá de inadmissível, por fundamentos objetivos não serem invocados e por o relatório pericial responder de forma cabal a todos os quesitos propostos, não havendo fundadas razões a justificar a sua realização, também se mostra irrelevante, pois que, como refere o Tribunal a quo, a requerida não nega que deve à requerente, apenas pondo em causa a qualificação do crédito, sendo certo que, quanto a esta, o tribunal não está vinculado á posição das partes, nem do A.I., nem do perito, sendo apreciada no momento oportuno, ou seja, aquando da prolação da sentença de graduação de créditos, se for caso disso.
Irrelevante é posição que possa entender-se manifestada na primeira perícia ordenada em contrário ao agora decidido, pois certo é que juízos de direito, qualificações jurídicas ou considerandos sobre factos que têm de ser provados por documento, nenhuma relevância têm para a decisão a proferir, nunca podendo ser considerados pelo julgador na decisão a proferir. [...]
E como doutamente se decidiu no Acórdão da Relação de Guimarães de 4/10/2018:
“1- Para que seja deferida a realização de segunda perícia é necessário que o requerente alegue, de modo fundamentado e concludente, as razões pelas quais discorda do relatório pericial.
2- Essas razões têm de incidir sobre eventuais inexactidões (latu sensu [sic]), contradições ou insuficiências de que eventualmente padeça a perícia e que, caso venham efetivamente a verificar-se, sejam suscetíveis de levar a um resultado distinto daquele que foi alcançado na primeira perícia.
3- O requerente tem de: a) especificar os pontos sobre que discorda do relatório de perícia; e b) indicar as concretas razões dessa discordância.
4- O requerente não tem de demonstrar a procedência dessas razões, uma vez que essa demonstração apenas pode ser alcançada com a realização da segunda perícia.
5- No entanto, os motivos de discordância por eles indicados terão de ser aptos, do ponto de vista objetivo, atentas as circunstâncias do caso concreto, a criar um estado de dúvida no julgador médio sobre se a perícia efetuada não padecerá dos vícios que o requerente lhe assaca e que caso venham a ser demonstradas levam a que seja alcançado um resultado distinto do da primeira perícia” [Ac. RG de 4/10/2018 (Relator: José Alberto Moreira Dias e, em que a ora relatora foi adjunta)].
Como aí bem se refere, “não basta um estado de dúvida subjetivo do requerente da segunda perícia para se ordenar a realização desta, mas terá aquele expor as concretas razões que alicerçam esse seu “estado de dúvida”, razões essas que terão, à luz de um padrão objetivo – “bonus pater família [sic]” –, perante as concretas circunstâncias do caso, fazer gerar no juiz médio um estado de dúvida sobre se eventualmente a perícia não padecerá das inexatidões que o requerente lhe assaca e que importará suprir caso sejam efetivamente verificáveis, por levarem a um resultado distinto daquele que foi alcançado na primeira perícia”.
Acresce que a primeira perícia foi oficiosamente ordenada, com o objeto determinado, e indeferido que foi o requerimento de substituição do perito pelas razões invocadas, nenhuma outra perícia, solicitada, pelas razões que levaram ao indeferimento (transitado em julgado) do requerimento de substituição do perito, se justifica para a decisão da causa, nem se justificando mais demoras, pelo que bem indeferiu o Tribunal a quo a diligência, infundada, impertinente, irrelevante e dilatória.
Com efeito, subsunções jurídicas, meras conclusões e factos que têm de ser provados por documento estão fora do objeto de perícia, que lhes não pode dar resposta, nunca podendo, pois, o resultado da perícia ser distinto.
Cabendo às partes carrear para os autos a prova pelo meio idóneo próprio (designadamente, certidões do processo em causa), não sendo o sendo a perícia, bem indeferiu o Tribunal a quo a diligência solicitada.
Assim, e por a primeira perícia, oficiosamente ordenada, ter respondido ao que lhe foi solicitado e a segunda não poder ir além da primeira, nem dar satisfação ao que lhe está vedado, não sendo o meio idóneo a provar o que com ela se pretende demonstrar, e, ainda, por meras questões de direito não integrarem o seu objeto, nos termos bem referidos pelo Tribunal a quo e pela apelada nas suas contra-alegações, conclui-se que a segunda perícia é, na verdade, irrelevante para a decisão, impertinente e dilatória, bem tendo sido indeferida. Infundadas e não aptas a alterar o resultado da perícia são, pois, as razões indicadas pela Requerente/Apelante, mencionadas nas conclusões da apelação.
A prova pericial efetuada deu cumprimento ao que lhe foi pedido, deu satisfação ao objeto da perícia ordenada e, cumpridos que se mostram os seus desideratos, bem foi indeferido o requerimento de segunda perícia, pois que a prova pericial não tem o objetivo que a apelante pretende."
[MTS]