Restituição provisória da posse;
prestação de caução*
1. O sumário de RG 19/3/2020 (477/19.0T8EPS-A.G1) é o seguinte:
[I]. No caso dos processos nominados, como é o caso do processo cautelar de restituição provisória de posse, não é aplicável o disposto no artigo 374º, nº 2 do CPC que apenas é aplicável ao arresto e ao embargo de obra nova (artº 376º, nº 2 do CPC), não sendo assim admissível a prestação de caução pelos requerentes da providência de restituição provisória de posse.
[II]. A substituição da providência decretada por caução a prestar pelo requerido só é viável se a caução oferecida se mostrar adequada, idónea e suficiente para prevenir a lesão ou repará-la integralmente (artº 368º, 3, 2ª parte CPC), isto é, a caução só será admissível quando permita atingir o mesmo efeito a que se destinava a providência cautelar concretamente requerida, cabendo ao requerente da substituição o ónus da prova quanto à suficiência e à adequação da caução que pretende prestar.
[III]. A fixação de uma caução de 5.000,00 euros não é suficiente a prevenir nem a reparar a lesão, pois o seu montante não é proporcional nem aproximado da estimativa provável do dano, sendo que os apelantes calcularam o valor da receita diária da sociedade 1ª requerente em 1.200,00 euros/dia nos meses de Verão e em 3.000,00/dia, aos fins de semana, sendo manifesta a desproporção entre os alegados proveitos e o valor da caução que se propõem prestar.
[IV]. A substituição da providência decretada por caução não é adequada e suficiente para tutelar a posição jurídica das requerentes do procedimento cautelar, pois que prejudicará os seus interesses de forma desequilibrada em relação às requeridas do procedimento/requerentes no incidente, na medida em que pressupõe que aquelas cessem a atividade económica a que se dedicam e que constitui a finalidade para que foram criadas.
2, Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:
"Da prestação de caução pelos requeridos do procedimento cautelar
Os apelantes [requeridos] reclamam também, subsidiariamente, que lhes seja permitido prestar caução pelo montante de 5.000,00, relativamente à 1ª requerente do procedimento cautelar e 1.000,00 à 2ª requerente.
O art.º 368º, n.º 3, do Código de Processo Civil, dispõe expressamente que “A providência decretada pode ser substituída por caução adequada, a pedido do requerido, sempre que a caução oferecida, ouvido o requerente, se mostre suficiente para prevenir a lesão ou repará-la integralmente.”
O disposto no artº 368º, nº 3 do CPC é aplicável à generalidade das providências cautelares especificadas (artº 376º, nº 1 do CPC).
A substituição da providência cautelar por caução não conduz à sua revogação, nem representa reconhecimento do direito de que o requerente se arroga titular.
“Este mecanismo só é viável se a caução oferecida se mostrar adequada, idónea e suficiente para prevenir a lesão ou repará-la integralmente (artº 368º, 3, 2ª parte), isto é, a caução só será admissível quando permita atingir o mesmo efeito a que se destinava a providência cautelar concretamente requerida, cabendo ao requerente da substituição o ónus da prova quanto à suficiência e à adequação da caução que pretende prestar.
Por conseguinte, a caução será adequada quando respeite a finalidade prática que a providência cautelar visava alcançar e quando constitua um meio idóneo para garantir os danos passados ou futuros.
Por sua vez, a caução será suficiente quando permita salvaguardar o receio de lesão que esteve na base da providência, bem como os eventuais danos e prejuízos que possam advir para o requerente em consequência dessa substituição. O mesmo é dizer que a caução será suficiente quando o seu montante for proporcional ou aproximado da estimativa provável do dano” (cfr. defende Marco Filipe Marco Carvalho, obra citada, p. 372 e 373).
Face à providência decretada, a sociedade X – Eventos Turísticos, Lda. e a sociedade Y foram restituídas à posse da denominada Quinta do …, as quais recebem as receitas de exploração do estabelecimento.
Posteriormente, na sequência da oposição deduzida, foi determinado que a requerente Y – Café e Snack-Bar, Lda. entregasse à sociedade Construções ..., Unipessoal, Lda. os bares sitos na “Quinta ...”, uma vez que o contrato tinha sido celebrado com prazo certo – até 30.09.2019 e este, entretanto, decorreu. Consequentemente, não tem que se atender à repercussão da requerida substituição por caução na sua actividade económica.
Os bens que estão a ser utilizados pelas requerentes do procedimentos são bens da herança por morte de M. F. e da sua mulher, tendo sido dados de arrendamento por M. F. a Construções ... Unipessoal, Lda., na qualidade de cabeça de casal da herança aberta por óbito da sua mulher e herdeiro, que por sua vez, no dia 25 de Maio de 2019, celebrou contrato de arrendamento e cedência de exploração com E. P., M. C. e marido, F. G. e C. M., dando de arrendamento esses bens e a sua exploração, com exceção dos Bares ... que tinham sido objecto de contrato com a sociedade Y. A E. P., M. C. e marido, F. G. e C. M., constituíram em 17.07.2019, a sociedade, 1ª requerente do procedimento cautelar, o que já estava previsto no contrato de arrendamento/exploração.
Ora, a fixação de uma caução de 5.000,00 euros não é suficiente a prevenir nem a reparar a lesão, pois o seu montante não é proporcional nem aproximado da estimativa provável do dano. Aliás, os apelantes não referem porque é que pediram a fixação deste valor e não outro, nem revelam como estimaram este valor. Não pode deixar de se realçar que tendo os apelantes calculado o valor da receita diária da sociedade 1ª requerente em 1.200,00 euros/dia nos meses de Verão e em 3.000,00/dia, aos fins de semana, tivessem considerado suficiente a quantia de 5.000,00, relativamente à 1ª requerente do procedimento, por já se mostrar suficiente para prevenir a lesão, quando a desproporção entre os alegados proveitos e a caução que se propõem prestar é manifesta. Mesmo que o contrato celebrado com a Y não tivesse terminado por caducidade, também o valor oferecido - 1.000,00 - relativamente a esta sociedade se mostraria insuficiente. É que tendo sido acordada uma renda de 7.500,00 euros por um período de exploração de cerca 4 meses, é de presumir que o seu rendimento é superior, permitindo-lhe pagar esta quantia e outras despesas necessárias e ainda obter lucro, escopo de qualquer sociedade comercial, pelo que quantia de 1.000,00 é também claramente insuficiente, não sendo proporcional à estimativa provável do dano, ainda que tendo em conta apenas o tempo que à data da entrada do requerimento, ainda faltava decorrer até à caducidade do contrato.
Acresce que, tal como é referido no despacho recorrido, a substituição da providência decretada por caução “não é adequada e suficiente para tutelar a sua posição jurídica, pois que prejudicará os interesses das requeridas de forma desequilibrada em relação aos requerentes, na medida em que pressupõe que as requeridas cessem a atividade económica a que se dedicam e que constitui a finalidade para que foram criadas.”
E face ao exposto, bem andou o tribunal a quo ao não considerar necessária a realização de diligências probatórias, pois que sempre o requerido seria de improceder."
3. [Comentário] Segundo se consegue perceber, a RG decidiu bem ao não admitir a substituição da restituição provisória da posse pela prestação de caução pelos requeridos.
Equívoca, por uma aparente troca entre requeridas e requerentes, parece ser a formulação do penúltimo parágrafo acima transcrito.
MTS