"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



26/02/2025

Jurisprudência 2024 (114)


Processo tutelar cível;
representação de menores; patrocínio judiciário

1. O sumário de RL 23/5/2024 (22446/18.8T8LSB-A.L1-2) é o seguinte: 

I – A nomeação de advogado à criança, nos quadros do nº. 2, do artº. 18º, do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, tem fundamentalmente como ratio legis a tutela e salvaguarda dos interesses dos filhos menores, normalmente o vértice mais fragilizado nas querelas que os progenitores alimentam e sustentam, assim se justificando que aquela opere no quadro da lei do apoio judiciário, tal como prevê o nº. 3, do artº. 103º, da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, aplicável como princípio orientador ao processo tutelar cível de regulação do exercício das responsabilidades parentais, desde logo por força do nº. 1, do artº. 4º, do RGPTC;

II – tal solução garante total isenção e imparcialidade na representação dos menores, na concretização do critério orientador do superior interesse da criança (que não dos seus pais) e evita que a sua posição possa ser contaminada ou influenciada pelos interesses dos seus progenitores, salvaguardando e tutelando que os únicos interesses que venham a ser afirmados em tribunal, pelo competente técnico jurídico nomeado, correspondam, com efectividade, aos interesses dos menores representados;

III – tal nomeação oficiosa permite, assim, que a Assistência jurídica prestada aos menores se venha a concretizar de forma mais objectiva, serena, desinteressada e equidistante, afirmando-se imune a quaisquer pressões dos progenitores, assim garantindo plenamente a salvaguarda do estrito interesse daqueles;

IV – sendo, ainda, a mesma susceptível de evitar ou prevenir uma “eventual alienação parental”, ou servir de alavancagem de “fenómenos disfuncionais de apegamento emocional exagerado a uma das partes”, assim se evitando que a posição processual do menor acompanhado por técnico de direito competente possa ser rotulada como um simples prolongamento acrítico e encapotado da posição de qualquer um dos progenitores, funcionando manipuladamente nas mãos destes;

V - caso que assim não se entenda, e se admita que os próprios menores tivessem o direito de escolher o advogado que os representasse (o que não é admissível nos quadros da lei do apoio judiciário), sempre tal colidiria com a sua incapacidade para o exercício de direitos, suprível, in casu, pelo poder paternal – os artigos 123º e 124º, do Cód. Civil;

VI - efectivamente, não cabendo a outorga de mandato forense nas excepções à incapacidade dos menores elencadas no artº. 127º, do mesmo diploma, e não resultando que tal outorga se possa qualificar como uma mera questão ou acto administrativo, tal suprimento de incapacidade para o exercício de tal direito sempre teria que ser operada mediante a intervenção de ambos os progenitores, não bastando para tal a mera intervenção de um;

VII - com efeito, a outorga de mandato forense, tanto mais num processo em que se procede à regulação do exercício das responsabilidades parentais dos menores em equação, não constitui, claramente, uma mera questão da sua vida administrativa, antes se traduzindo numa questão de particular importância para a vida dos menores, cujo exercício, conforme resulta da sentença proferida, pertence a ambos os progenitores, excluída que está a exclusividade de exercício a solo, assim impondo que o suprimento da incapacidade dos menores mandantes tivesse que ser operada por ambos os progenitores;

VIII – o artº. 5º da Convenção Europeia Sobre o Exercício dos Direitos das Crianças, ao enunciar as medidas processuais promotoras do exercício dos direitos processuais das crianças, no que concerne ao direito de serem Assistidas por advogado, prevê o direito de pedirem a designação de advogado – a alínea b) -, e não propriamente um direito de escolha ou de concreta indicação do advogado que preste tal Assistência;

IX – tal normativo efectua uma clara distinção entre as situações em que a criança tem liberdade para escolher ou indicar a pessoa que lhe deva prestar Assistência para o auxiliar a exprimir as suas opiniões, bem como para representá-lo – as alíneas a) e c) -, daquela situação em que tem apenas o direito de pedir que lhe seja designado um advogado – a alínea b) -, em que tal direito de escolha/indicação não é legalmente estatuído;

X - solução legal que bem se entende, pois, prevendo-se tal direito para efectiva tutela e defesa da posição processual da criança, caso existisse aquele direito de escolha sempre esta ficaria sujeita à influência de um ou de ambos os progenitores, o que poderia contaminar a necessária equidistância e isenção do profissional de direito.

2. Na fundamentação do acórdão escreveu-se o seguinte:

"Em primeiro lugar, enunciemos o quadro legal geral no âmbito do qual se apreciará acerca do objecto recursório.

Prevendo acerca da constituição de advogado, estatui o artº. 18º, do Regime Geral do Processo Tutelar Cível – aprovado pela Lei nº. 141/2015, de 08/09 -, que:

“1 - Nos processos previstos no RGPTC é obrigatória a constituição de advogado na fase de recurso.
2 - É obrigatória a nomeação de advogado à criança, quando os seus interesses e os dos seus pais, representante legal ou de quem tenha a guarda de facto, sejam conflituantes, e ainda quando a criança com maturidade adequada o solicitar ao tribunal [...]

O antecedente normativo – artº. 17º -, do mesmo diploma, no seu nº. 1, prevendo acerca da iniciativa processual, estatui que “salvo disposição expressa e sem prejuízo do disposto nos artigos 52.º e 58.º, a iniciativa processual cabe ao Ministério Público, à criança com idade superior a 12 anos, aos ascendentes, aos irmãos e ao representante legal da criança”.

Por sua vez, prescrevem os nºs. 1 a 3, do artº. 103º, da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo – aprovada pela Lei nº. 142/2015, de 08/09 -, cujos princípios orientadores são aplicáveis aos processos tutelares cíveis (o preâmbulo do nº. 1, do artº. 4º, do RGPTC), que:

“1 - Os pais, o representante legal ou quem tiver a guarda de facto podem, em qualquer fase do processo, constituir advogado ou requerer a nomeação de patrono que o represente, a si ou à criança ou ao jovem.
2 - É obrigatória a nomeação de patrono à criança ou jovem quando os seus interesses e os dos seus pais, representante legal ou de quem tenha a guarda de facto sejam conflituantes e ainda quando a criança ou jovem com a maturidade adequada o solicitar ao tribunal.
3 - A nomeação do patrono é efetuada nos termos da lei do apoio judiciário” (sublinhado nosso).

No âmbito da condição jurídica dos menores, e prevendo acerca da sua incapacidade, estatui o artº. 123º, do Código Civil, que “salvo disposição em contrário, os menores carecem de capacidade para o exercício de direitos”, aduzindo o artº. 122º, do mesmo diploma, serem menores os que ainda não tenham “completado dezoito anos de idade”.

O artº. 125º, ainda do Cód. Civil, estatui a propósito da anulabilidade dos actos dos menores, enquanto que o artº. 127º prevê acerca das excepções à incapacidade dos menores, considerando excepcionalmente válidos os actos aí elencados.

Convenção Europeia dobre o Exercício dos Direitos das Crianças, adoptada em Estrasburgo, em 25 de Janeiro de 1996 – aprovada pela Resolução da Assembleia da República nº. 07/2014, de 27/01 -, enunciando acerca das medidas processuais para promover o exercício dos direitos das crianças, e dos direitos processuais desta, prescreve no artº. 5º que “nos processos perante uma autoridade judicial, que digam respeito a crianças, as Partes deverão considerar a possibilidade de lhes conceder direitos processuais adicionais, em especial:

a) O direito de pedirem para serem assistidas por uma pessoa adequada, da sua escolha, que as ajude a exprimir as suas opiniões;
b) O direito de pedirem, elas próprias ou outras pessoas ou entidades por elas, a designação de um representante distinto, nos casos apropriados, um advogado;
c) O direito de nomear o seu próprio representante;
d) O direito de exercer, no todo ou em parte, os direitos das partes em tais processos” [...]

Ajuizando acerca da necessidade (e, mesmo da obrigatoriedade) de nomeação de advogado a menor, aduz-se no douto Acórdão da RL de 13/07/2017 – Relator: António Santos, Processo nº. 1201/14.0T8VFX.L1-6 -, que incumbindo “ao Advogado o dever de agir de forma a defender os interesses legítimos do cliente, sem prejuízo do cumprimento das normas legais e deontológicas ( cfr. artº 97º, do EOA ), sendo que, no exercício da profissão, mantém sempre e em quaisquer circunstâncias a sua independência, devendo agir livre de qualquer pressão ( cfr. artº 89º, do EOA ), ou de influências exteriores [ abstendo-se de negligenciar a deontologia profissional no intuito de agradar ao seu cliente , antes devendo utilizar todos os conhecimentos técnicos , saberes e procedimentos que a legis artis consigna e que se supõe estarem na sua posse ] , é manifesto que em última instância é ao Advogado nomeado que compete aferir de qual o meio adequado a lançar mão para melhor defender os interesses legítimos do menor.

Acrescenta, citando a possibilidade de nomeação já prevista no transcrito artº. 103º, da LPCJP, importar “não olvidar que, regendo-se os processos tutelares cíveis regulados no RGPTC pelos princípios orientadores de intervenção estabelecidos na lei de protecção de crianças e jovens em perigo , na respectiva tramitação deve outrossim ser assegurado o princípio da Audição e participação da criança , de forma a que, a criança, com capacidade de compreensão dos assuntos em discussão, tendo em atenção a sua idade e maturidade, seja sempre ouvida sobre as decisões que lhe digam respeito, preferencialmente com o apoio da assessoria técnica ao tribunal, sendo garantido, salvo recusa fundamentada do juiz, o acompanhamento por adulto da sua escolha sempre que nisso manifeste interesse [ cfr. artº 4º,nº1. Alínea c), do RGPTC].

E, precisamente em sede de regulação das responsabilidades parentais [cfr. art. 35º, n.º 3 e artº 5º (1) , ambos do RGPTC], é o legislador peremptório em estabelecer que “ A criança com idade superior a 12 anos ou com idade inferior, com capacidade para compreender os assuntos em discussão, tendo em atenção a sua idade e maturidade, é ouvida pelo tribunal, nos termos previstos na alínea c) do artigo 4.º e no artigo 5.º, salvo se a defesa do seu superior interesse o desaconselhar “. [...]

Enunciados os critérios gerais, centremo-nos na matéria controvertida.

Nomeadamente a de aferir se a obrigatoriedade de nomeação de advogado à criança – na situação em que os seus interesses e os dos seus pais sejam conflituantes, ou quando revelar suficiente maturidade para o solicitar ao tribunal – pode ocorrer mediante procuração pela mesma outorgada a mandatário judicial, ou seja, constituindo, por si, advogado nos autos ; ou se, ao invés, tal nomeação deve ocorrer nos quadros da lei do apoio judiciário, nomeando-lhe patrono oficioso. [...]

Aqui chegados, é tempo de retornar ao caso concreto, aplicando as enunciadas directrizes ou princípios.

Conforme resulta dos pontos 2 e 3 do relatório, em 14/06/2023, foi junto aos autos requerimento, assinado pelo menor Al........., no qual era solicitada a nomeação de advogado que o defendesse, bem como aos demais 3 irmãos, contendo, em anexo, carta com a assinatura destes, bem como comprovativo de apoio judiciário entretanto formulado.

Logo em 16/06/2023, e independentemente da sorte do pedido formulado junto da Segurança Social, é proferido despacho a conceder o patrocínio judiciário às 4 crianças, diligenciando-se pela nomeação de Patrono Oficioso através do Sinoa, o que veio a ser concretizado no mesmo dia – pontos 4 e 5 do relatório -, inclusive mediante remessa de ofício de nomeação, por parte da Ordem dos Advogados, ao Patrono nomeado – ponto 6 do relatório.

Prolatada sentença de Regulação das Responsabilidades Parentais, datada de 22/08/2023, em 14/09/2023 os menores Al.  Af. , por intermédio de Advogada, vieram requerer aos autos a junção de procuração forense, no âmbito da qual “vêm constituir como sua procuradora e advogada, Dra. SS. (….), a quem conferem poderes forenses gerais para os representar no âmbito do processo nº. (…)/18.8T8LSB e apensos que correm termos no Juiz 7 do Tribunal de Família e Menores de Lisboa”.

Tal procuração foi assinada por ambos os menores, então com as idades, respetivamente, de 16 e 15 anos, após o que consta o seguinte:

M., mãe dos menores, titular das responsabilidades parentais dos mesmos, residente na Rua [...] pelo presente dá o seu consentimento ao acto praticado”, seguindo-se a assinatura de tal progenitora – pontos 7 e 8 do relatório.

Temos, então, uma situação em que dois menores, com as idades de 16 e 15 anos, a quem já havia sido nomeado, a seu pedido, advogado oficioso, vêm juntar aos autos, decorridos aproximadamente 3 meses daquela nomeação, procuração forense, na qual mandatam como sua procuradora determinada Advogada, sendo este acto objecto de expresso consentimento da progenitora mãe.

Vejamos.

Não se discute nos autos a obrigatoriedade de nomeação de advogado às crianças em equação, nos quadros do transcrito nº. 2, do artº. 18º do RGPTC. O que parece evidente no que concerne ao preenchimento da 2ª parte de tal normativo no que se reporta aos menores Al., Af. e As., então com 16, 15 e 12 anos, daí decorrendo presuntiva maturidade para o solicitarem junto do Tribunal.

E, por outro lado, indiscutível parece, ainda, o preenchimento do estatuído na 1ª parte do mesmo normativo, decorrendo com evidência dos autos a existência de conflituantes interesses entre os progenitores e os menores filhos, o que igualmente justifica a obrigatoriedade daquela nomeação.

Efectivamente, atento o clima de exacerbada litigância entre os progenitores, que emana com veemência dos autos, traduzido num litígio que subsiste há quase 7 anos, e em que a sentença reguladora do exercício das responsabilidades parentais é prolatada quase 6 anos após o início do processo tutelar, sem que se encontre ainda transitada, parece evidente e cristalino que os interesses daqueles são antagónicos, desde logo no que concerne à própria subsistência do litígio, que em nada beneficia o equilíbrio e saudável crescimento e desenvolvimento dos filhos.

Ora, atenta a ratio legis daquela nomeação, fundamentalmente prevista para tutela e salvaguarda dos interesses dos filhos menores, normalmente o vértice mais fragilizado nas querelas que os progenitores alimentam e sustentam, cremos justificar-se que aquela opere no quadro da lei do apoio judiciário, tal como prevê o transcrito nº. 3, do artº. 103º, da LPCJP, aplicável como princípio orientador ao presente processo tutelar cível, desde logo por força do nº. 1, do artº. 4º, do RGPTC.

Efectivamente, tal solução (que foi, em concreto, adoptada nos presentes autos) garante total isenção e imparcialidade na representação dos menores, na concretização do critério orientador do superior interesse da criança (que não dos seus pais) e evita que a sua posição possa ser contaminada ou influenciada pelos interesses dos seus progenitoressalvaguardando e tutelando que os únicos interesses que venham a ser afirmados em tribunal, pelo competente técnico jurídico nomeado, correspondam, com efectividade, aos interesses dos menores tutelados.

Tal nomeação oficiosa garante e permite, assim, que a assistência jurídica prestada aos menores se venha a concretizar de forma mais objectiva, serena, desinteressada e equidistante, afirmando-se imune a quaisquer pressões dos progenitores, assim garantindo plenamente a salvaguarda do estrito interesse daqueles.

Na terminologia supra referenciada, tal nomeação é ainda susceptível de evitar ou prevenir uma “eventual alienação parental”, ou servir de alavancagem de “fenómenos disfuncionais de apegamento emocional exagerado a uma das partes”, assim se evitando que a posição processual do menor acompanhado por técnico de direito competente possa ser rotulada como um simples prolongamento acrítico e encapotado da posição de qualquer um dos progenitores, funcionando manipuladamente nas mãos destes.

Todavia, ainda que assim não se entenda, e se admita que os próprios menores tivessem o direito de escolher o advogado que os representasse (o que não é admissível nos quadros da lei do apoio judiciário), sempre tal colidiria com a sua incapacidade para o exercício de direitos, suprível, in casu, pelo poder paternal – os artigos 123º e 124º, do Cód. Civil.

Efectivamente, não cabendo a outorga de mandato forense nas excepções à incapacidade dos menores elencadas no artº. 127º, do mesmo diploma, e não resultando que tal outorga se possa qualificar como uma mera questão ou acto administrativo, tal suprimento de incapacidade para o exercício de tal direito sempre teria que ser operada mediante a intervenção de ambos os progenitores, não bastando para tal a mera intervenção da progenitora mãe.

Com efeito, a outorga de mandato forense, tanto mais num processo em que se procede à regulação do exercício das responsabilidades parentais dos menores em equação, não constitui, claramente, uma mera questão da sua vida administrativa, antes se traduzindo numa questão de particular importância para a vida dos menores, cujo exercício, conforme resulta da sentença proferida, pertence a ambos os progenitores, excluída que está a exclusividade de exercício a solo. O que, deste modo, sempre impunha que o suprimento da incapacidade dos menores mandantes tivesse que ser operada por ambos os progenitores.

E, nem se afirme, em desabono do consignado, que a regulação efectuada nos autos ainda não transitou em julgado. Efectivamente, se é certo este não trânsito, também é certo que, neste momento, é o teor de tal decisão que prevalece, atento o efeito meramente devolutivo do recurso interposto.

Ora, o progenitor pai, não só não deu o seu assentimento à outorga do referenciado mandato forense, consentindo na outorga da procuração, como impugnou tal acto, deduzindo expressa oposição ao mesmo, conforme resulta do requerimento mencionado no ponto 9 do relatório, no qual pugna pela ineficácia ou nulidade quer da outorgada procuração, quer dos posteriores requerimentos subscritos pela procuradora forense, o que sempre preencheria a legitimidade para a anulabilidade de tal acto, nos termos enunciados no artº. 125º, do Cód. Civil.

Aliás, é na sequência de tal requerimento e da posterior posição assumida pelo Digno Magistrado de Ministério Público, que é proferida a decisão sob apelo que, corroborando-os, declara nulo e sem nenhum efeito o mandato conferido, bem como ineficazes os actos praticados sob a sua égide.

Por outro lado, não entendemos que o supra exposto seja contraditado pelo quadro legal transcrito, nomeadamente pelo enunciado no citado artº. 5º da Convenção Europeia Sobre o Exercício dos Direitos das Crianças.

Efectivamente, este normativo, ao enunciar as medidas processuais promotoras do exercício dos direitos processuais das crianças, no que concerne ao direito de serem assistidas por advogado, prevê o direito de pedirem a designação de advogado – a alínea b) -, e não propriamente um direito de escolha ou de concreta indicação do advogado que preste tal assistência.

Ou seja, tal como referenciado pelo progenitor pai em sede contra-alegacional, aquele normativo efectua uma clara distinção entre as situações em que a criança tem liberdade para escolher ou indicar a pessoa que lhe deva prestar assistência para o auxiliar a exprimir as suas opiniões, bem como para representá-lo – as alíneas a) e c) -, daquela situação em que tem apenas o direito de pedir que lhe seja designado um advogado – a alínea b) -, em que tal direito de escolha/indicação não é legalmente estatuído.

Solução legal que bem se entende, pois, prevendo-se tal direito para efectiva tutela e defesa da posição processual da criança, caso existisse aquele direito de escolha sempre esta ficaria sujeita à influência de um ou de ambos os progenitores (nos termos supra argumentados), o que poderia contaminar a necessária equidistância e isenção do profissional de direito. 

Desta forma, o que surge como direito fundamental da criança e, consequentemente, dos Recorrentes menores, no que concerne ao acesso ao direito e a tutela jurisdicional efectiva – o artº. 20º, da Constituição da República Portuguesa -, é a previsão de poder contar com o necessário acompanhamento de advogado em processo que corra termos perante autoridade judicial, nomeadamente em sede de patrocínio judiciário, e não propriamente que se deva reconhecer uma qualquer tutela constitucional de um alegado direito de escolha, sem que tal determine inconstitucionalidade interpretativa do disposto no citado artº. 18º, do RGPTC, em contravenção com o consignado no mencionado artº. 20º, da Constituição da República Portuguesa."

[MTS]