Incidente da instância;
indeferimento liminar; recurso de apelação*
1. - No âmbito do incidente de intervenção principal provocada passiva, suscitado pela parte demandada, não cabe recurso de apelação autónoma se a decisão incidental for de rejeição liminar da intervenção (por não se verificarem os pressupostos legais de admissibilidade ou manifesta improcedência), caso em que o recurso deve ser interposto posteriormente, nos termos dos n.ºs 3 e 4 do art.º 644.º do NCPCiv..
2. - A intervenção a que alude o art.º 316.º, n.º 3, al.ª a), do NCPCiv. depende da verificação de litisconsórcio voluntário entre o réu e o interessado que se pretende chamar, o que pressupõe a existência de uma relação material controvertida – de acordo com a configuração do autor na sua petição – em que sejam sujeitos passivos tais réu e interessado.
3. - Se, num tal âmbito incidental, o autor apenas alegou a existência de uma dívida faturada (referente a transporte de frutas), de pendor contratual, de que é credor aquele e devedor o demandado, a relação material controvertida vem reportada a esses sujeitos (e respetivos interesses) e a esse horizonte contratual, e não a outra(s) sociedade(s), pelo que apenas eles têm interesse em demandar e em contradizer, sendo, pois, as partes legítimas, não se mostrando que ocorra litisconsórcio voluntário passivo com a sociedade que se pretende fazer intervir.
II. O decidido no acórdão tem o seguinte voto de vencido:
"Concorda-se com a 2ª parte do acórdão e respectiva decisão, mas não com o decidido na 1ª parte, por se entender que o recurso deve ser admitido a subir imediatamente, tal como foi determinado na 1ª instância.
Ouvida a parte contrária, no suscitado incidente de intervenção principal provocada, proferiu-se despacho, à sombra do art. 318º, nº 2, do NCPC.
Com tal decisão terminou o referido incidente.
Assim, posto termo a tal incidente o recurso a interpor é o que está previsto no art. 644º, nº 1, a), in fine, do NCPC.
No acórdão cita-se posição doutrinal de Abrantes Geraldes, na sua obra Recursos …, no sentido do decidido, mas da consulta que efectuámos na referida obra (última edição, a 7ª), não conseguimos descortinar que assim seja. O mesmo autor no CPC Anotado dele (e mais dois outros autores), no 1º Vol. (última edição, a 3ª), consultado o mesmo, do que conseguimos descortinar, também não defende a posição que fez vencimento.
Também se citou Lebre de Freitas (no CPC Anotado, Vol. 1º, 4ª Ed.,) para defender a controversa questão, a propósito de despacho que admita a intervenção não ser autonomamente recorrível. Mas o nosso caso é exactamente o contrário.
Tal professor na referida obra, Vol. 3º (última edição, a 3ª), que cobre a análise do regime de recursos também não aponta para o decidido. Só no referido Vol. 1º (mencionada edição) o faz e defende exactamente o contrário da posição agora sentenciada. Diz tal autor que em caso de não admissão da intervenção - é o nosso caso - o recurso sobe imediatamente.
Também se diz no acórdão que estamos perante uma decisão de indeferimento/rejeição in limine do aludido incidente. Tratando-se de um indeferimento liminar, então menos se justifica o decidido, atento aquele art. 644º, nº 1, a), do NCPC.
Ou seja, a decisão incidental de indeferimento deve subir imediatamente e não diferidamente. No mesmo sentido pode ver-se Rui Pinto, na Rev. da Fac. Direito de Lisboa, 2020, nº 2, no seu artigo doutrinal Oportunidade processual de interposição de apelação à luz do artigo 644º do CPC, págs. 632/637."
*III. [Comentário] Houve um tempo em que, perante algum emaranhado legal, à pergunta "Quando é que sobe o agravo?" a resposta era "Quando Alberto dos Reis quis". Hoje o panorama dos recursos é outro e problemas deste tipo já não se levantam.
Compreensivelmente, o art. 644.º, n.º 1, al. a), CPC estabelece que cabe apelação autónoma, entre outras, da decisão que pôs termo a um incidente processado autonomamente. Na verdade, se o incidente terminou (ou, no caso do indeferimento liminar, quase não chegou a começar), não tem sentido reter o recurso até à decisão final do processo. Não só não há nenhuma interferência da pendência do recurso na continuação da tramitação da acção, como, até em termos de eficiência processual, seria estranho que o recurso de uma decisão que pôs termo a um incidente tivesse de aguardar pelo recurso interposto da decisão proferida na acção.
MTS