Título executivo;
resolução; perda do benefício do prazo
1. O sumário de RE 5/12/2019 (734/18.3T8MMN-A.E1) é o seguinte:
I - Os contratos de mútuo dados à execução pela exequente CGD, designadamente nos termos do mencionado artigo 9.º, n.º 4, do DL 287/93, constituem título executivo, sem necessidade de outras formalidades, aferindo-se a legitimidade de exequente e executados pelos outorgantes daqueles contratos.
I - Os contratos de mútuo dados à execução pela exequente CGD, designadamente nos termos do mencionado artigo 9.º, n.º 4, do DL 287/93, constituem título executivo, sem necessidade de outras formalidades, aferindo-se a legitimidade de exequente e executados pelos outorgantes daqueles contratos.
II - Tendo exequente e executados legitimidade processual para a execução, são igualmente parte legítima nos embargos que daquela acção constituem um apenso, com estrutura declarativa, ainda que tenha existido transmissão do direito litigioso, por acto entre vivos, como é o caso da cessão de créditos.
III - Na contestação aos embargos, a Exequente pode suprir o que haja omitido no requerimento executivo com base em título complexo, o que fez, invocando o incumprimento pelos mutuários das cláusulas contratuais, mercê da insolvência do marido e da doação por este efectuada do imóvel hipotecado a favor dos filhos, com reserva de usufruto, o que determinou a sua resolução, com a consequência do vencimento imediato de todas as prestações.
IV - “Quando se pretenda dar à execução contrato de mútuo garantido por hipoteca, abrangido pela alª c) do nº 2 do artigo 550º do CPC, e o vencimento da obrigação exequenda dependa apenas da sua resolução, é necessária a junção, para além do contrato, do documento comprovativo da efectivação da resolução, ou seja, do documento comprovativo da comunicação à contraparte da declaração resolutória, bem como da sua recepção por esta – ou de que a carta de resolução foi enviada para o domicílio ou sede do devedor (artº 224º nº 2 CC)”.
V - Assim, ainda que tal incumprimento do clausulado contratual esteja demonstrado, não tendo a exequente, previamente à instauração da acção executiva, exercido o direito potestativo à sua resolução, não estão verificados os requisitos de exigibilidade da quantia exequenda, pelo que, aquando da entrada da presente execução em juízo, a exequente não possuía título executivo válido contra os embargantes, ora Apelantes.
2. Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:
"Na sentença recorrida foram tecidas judiciosas considerações, com apoio em pertinente doutrina e jurisprudência, para concluir que «a doação do imóvel hipotecado aos embargados CC e DD e a declaração de Insolvência do mutuário FF se apresentam como válidas causas de resolução automática dos contratos de empréstimo por parte da embargada/exequente, pelo que se releva legal e legítimo o recurso à acção executiva».
Subscrevemos integralmente a fundamentação a este respeito expressa na sentença recorrida, considerando ainda que «o acordo (a que acima se fez referência entre a exequente/embargante e os mutuários) era precisamente no sentido de a EE poder considerar antecipadamente vencida toda a dívida e exigir o seu imediato pagamento no caso de designadamente de alienação das garantias e insolvência do devedor. Pelo que tratando-se de factos pessoais - a doação do imóvel dado em garantia e a ocorrência da declaração de insolvência do mutuário FF – tais factos consubstanciam causa expressa (do conhecimento dos devedores) para a credora EE considerar imediatamente vencidas e exigíveis as obrigações da parte devedora»
Porém, significa o que vimos de afirmar igualmente concluímos pela «bondade da actuação da exequente/embargante que ao lançar mão da acção executiva mais não fez do que fazer valer validamente os seus direitos»?
A questão contende com a da perda do benefício do prazo.
A este respeito pronunciou-se o recente Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11.07.2019 [Proferido no processo n.º 4739/16.0T8LOU-A.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt.], para cuja fundamentação se remete e de cujo sumário se extrai que:
«I - O vencimento das prestações a que se refere o artigo 781º do Código Civil é um benefício concedido por lei ao credor que, querendo beneficiar dele, deverá manifestar a sua vontade nesse sentido, interpelando o devedor para cumprir imediatamente a totalidade da obrigação.
II - Se a obrigação puder ser liquidada em duas ou mais prestações, a falta de realização de uma delas importa o vencimento de todas. O vencimento imediato significa exigibilidade imediata, mas não dispensa a interpelação do devedor.
III - A resolução, enquanto declaração receptícia ou recipienda – que é aquela que carece de ser dada a conhecer a um destinatário – à luz do disposto no artigo 224º do Código Civil, é eficaz nos casos seguintes: (i) quando chegue ao poder do destinatário ou seja dele conhecida (nº 1 do citado normativo); (ii) quando seja enviada, mas só por culpa do destinatário não tenha sido oportunamente recebida (nº 2).
IV - Sendo a declaração recipienda, não pode ser considerada eficaz pela sua simples emissão, competindo à exequente alegar e provar que efectivamente emitiu as correspondentes declarações de resolução, o que não aconteceu, e não invocou sequer o conhecimento das mesmas, por parte dos executados, através de uma outra qualquer forma.
V - Quando se pretenda dar à execução contrato de mútuo garantido por hipoteca, abrangido pela alª c) do nº 2 do artigo 550º do CPC, e o vencimento da obrigação exequenda dependa apenas da sua resolução, é necessária a junção, para além do contrato, do documento comprovativo da efectivação da resolução, ou seja, do documento comprovativo da comunicação à contraparte da declaração resolutória, bem como da sua recepção por esta – ou de que a carta de resolução foi enviada para o domicílio ou sede do devedor (artº 224º nº 2 CC). É igualmente necessária a junção aos autos do documento comprovativo da interpelação para o cumprimento, em todos os casos em que não se esteja perante uma obrigação com prazo certo, sob pena de faltar um dos requisitos da obrigação exequenda (artº 713º)».
Tal como no caso que nos ocupa, não houve na situação tratada naquele aresto a comunicação prévia da resolução do contrato, afirmando-se na fundamentação respectiva que «apesar de estar demonstrado o incumprimento das obrigações pelos executados, a exequente (…) teria de ter demonstrado que exercitou o seu direito potestativo, traduzido na competente interpelação ao pagamento do montante total que fez constar da execução.
Isto porque, só com o exercício do direito potestativo, a efectuar mediante interpelação para o pagamento, por via da resolução dos contratos, é que esse montante total se tornava exigível, pois só então se operaria o vencimento. O que, como já se referiu, não aconteceu».
É certo também, tal como no aresto do Supremo Tribunal de Justiça que vimos referindo, que «vale como interpelação a citação para a acção executiva, como interpelação judicial que é».
Porém, como ali afirmado, «a interpelação extra-judicial do devedor, antes de iniciada a instância executiva, não se mostra efectuada e teria de ser antecedente à instauração da execução.
O que significa que, podemos concluir, não estão verificados os requisitos de exigibilidade da quantia exequenda (…).
Quando deu entrada da presente execução, a exequente, (…) não possuía título executivo válido contra os recorridos.
Mas poderá a execução prosseguir quanto aos valores vencidos?
Já deixámos dito que não estão verificados os requisitos de exigibilidade da quantia exequenda tal como pretendido pela exequente, ora recorrente. E ainda que, quando deu entrada da presente execução, a exequente não possuía título executivo válido contra os embargantes, ora recorridos.
Sendo assim, são inteiramente válidos e aqui aplicáveis tais argumentos, pelo que não é admissível a redução da quantia exequenda».
Em conclusão, o nosso mais Alto Tribunal confirmou a apelação, que havia julgado os embargos procedentes e determinado a extinção da execução.
Assim sendo, concluindo-se na situação em presença, pelo incumprimento de obrigações contratualmente assumidas que são fundadoras da resolução dos contratos de mútuo celebrados entre Exequente e Executada, mas não tendo aquela, previamente à instauração da acção executiva, exercido o direito potestativo à sua resolução, não estão verificados os requisitos de exigibilidade da quantia exequenda, pelo que, aquando da entrada da presente execução em juízo, a exequente não possuía título executivo válido contra os embargantes, ora Apelantes.
[MTS]