Entidades sem personalidade judiciária;
representação judiciária
1. O sumário de RL 23/5/2024 (11622/23.1T8SNT-A.L1-6) é o seguinte:
I- Quando ocorre a apresentação de duas contestações por entidades diferentes que se arrogam representantes do mesmo Condomínio réu, a decisão sobre a invalidade de uma delas não pode basear-se no mero critério cronológico, considerando inválida a que foi apresentada em segundo lugar.
II- Tal questão tem de ser decidida após prévia determinação da entidade que representa, nos termos do art.º 26º do CPC, o réu Condomínio.
2. Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:
"Quanto ao mérito do recurso, temos que a decisão recorrida partiu de um pressuposto para decidir pela validade da primeira contestação apresentada e pela, consequente, invalidade da segunda contestação, sendo que ambas foram apresentadas no mesmo dia, a horas diferentes.
Tal pressuposto foi o de que se tratavam de contestações apresentadas pelo mesmo réu, ou seja, o CONDOMÍNIO QPL. Atendendo a esse pressuposto entendeu também que não tinha de cumprir qualquer contraditório prévio, pois não havia com quem fazê-lo, como resulta do despacho supratranscrito que apreciou dessa questão de nulidade em sede de admissão do recurso.
Acontece, porém, que tal pressuposto é errado. Como resulta das procurações (que foram assinadas por pessoas diferentes), há duas entidades que se arrogam representantes do condomínio.
O condomínio enquanto centro autónomo de imputação de efeitos jurídicos, não sendo dotado de personalidade jurídica, carece, para atuar em juízo, de estar representado por uma pessoa singular ou coletiva dotada de personalidade jurídica, tal como decorre do estabelecido no artigo 26º do CPC, em conjugação com o artigo 1437º, do CCivil.
Havendo mais do que uma pessoa que se arroga representante do condomínio e atua em juízo invocando essa qualidade, não se pode considerar que as contestações apresentadas estão em situação de igualdade, prevalecendo um critério meramente cronológico para determinar a respetiva validade.
Assiste por isso inteira razão à recorrente quando alega que
“IX. Perante a apresentação de duas contestações nos autos em representação do Réu Condomínio, incumbia à decisão recorrida indagar e decidir quem legitimamente podia representar o Réu Condomínio em juízo e quem detinha validamente poderes forenses para o efeito.X. O Tribunal a quo nenhuma diligência ordenou ou realizou, tão pouco convidou as partes a pronunciar-se sobre essa temática nuclear, condicionante da prossecução dos autos”.
A decisão recorrida errou ao aplicar o critério cronológico, pois esse não era o aplicável à situação. Para decidir qual era a contestação que vinculava o réu Condomínio tinha de apurar previamente quem o representava.
A questão da nulidade decorrente da falta de contraditório prévio (cfr. Art.º 3º/3 do CPC) acaba por ser consequência da ilegalidade da decisão. Ou seja, considerou-se desnecessário tal contraditório porque se entendeu que a entidade era a mesma. Se a decisão fosse no sentido de considerar que uma das entidades é que representava o Condomínio, sem que tivesse sido dada a oportunidade a qualquer delas se pronunciar sobre a questão, aí sim, haveria nulidade, na medida em que se estava a decidir do que verdadeiramente importava. Daí que não faça sentido anular a decisão para que as partes se pronunciem sobre a questão que foi tratada e que foi a da mera cronologia da apresentação das contestações, sendo esse o efeito da mera anulação da decisão por violação do contraditório prévio.
A decisão é ilegal, pois, em face da factualidade a atender para a questão da validade das contestações, de onde resulta que duas entidades distintas se arrogam representantes do Condomínio, violou o disposto no art.º 26º do CPC. Aliás, a questão cronológica é absolutamente irrelevante para o caso. O que importa é determinar quem representa o Condomínio réu, sendo a questão da validade da contestação uma consequência dessa decisão.
Note-se que a questão da representação do Condomínio vai muito mais longe do que a mera questão de saber qual das contestações é válida. A decisão sobre tal questão é fundamental para todo o processo, pois será ela que irá determinar quem tem legitimidade para agir no processo em representação do Condomínio (da decisão recorrida parece até decorrer que qualquer uma das entidades que se arroga dos poderes de representação pode agir em juízo, prevalecendo os atos que forem praticados em primeiro lugar).
Assim, em face do exposto, a decisão deve ser revogada, determinando-se o prosseguimento dos autos para determinação da entidade que representa legalmente o Condomínio e, em função disso, decidir qual das contestações é válida e qual a entidade que poderá agir no processo em representação daquele réu."
[MTS]
[MTS]