Autoridade de caso julgado;
factos supervenientes*
1. O sumário de STJ 26/272019 (4043/10.8TBVLG.P1.S1) é o seguinte:
I - A excepção de caso julgado e a autoridade de caso julgado são duas vertentes, a primeira negativae a segunda positiva, do caso julgado.
II - A excepção implica a identidade de sujeitos, de pedido e de causa de pedir – art. 581.º, n.ºs. 1 e 4, do CPC – e tem o efeito negativo de impedir o conhecimento do mérito de uma segunda acção, impondo a absolvição da instância.
III - A autoridade não implica a identidade objectiva e tem o efeito positivo de impor a primeira decisão com pressuposto indiscutível da segunda decisão de mérito.
IV - A sentença, transitada em julgado, proferida em acção anterior, que reconheceu à seguradora laboral o direito de se sub-rogar no direito de indemnização da lesada contra o terceiro responsável pelo acidente, quanto a prestações pagas até à sua prolação, tem autoridade de caso julgado na acção posterior onde a seguradora laboral pede o reembolso das prestações pagas, de idêntica natureza, desde então.
2. Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:
"Estamos perante um acidente sofrido pela lesada CC, que foi considerado, simultaneamente, como acidente de trabalho e acidente de viação.
Em consequência de tal acidente e das graves lesões nele sofridas pela lesada, a autora, seguradora laboral, foi condenada no processo especial de acidente de trabalho a pagar-lhe uma pensão anual e outras prestações suplementares (acompanhamento de terceira pessoa, subsídio por elevada incapacidade e de reabilitação).
A autora veio propor depois acção contra o réu BB (a referida acção nº 243/08), com fundamento no art. 31º, nº 4, da LAT (então em vigor), a pedir a condenação deste a pagar-lhe determinadas importâncias, já satisfeitas à lesada, e, bem assim, as pensões e prestações suplementares posteriores à propositura da acção.
Na sentença que veio a ser proferida nessa acção foi reconhecido o invocado direito de sub-rogação da autora quanto às indemnizações pagas à lesada derivadas das lesões corporais [...] sofridas no acidente, mas apenas "pelas efectivamente já desembolsadas e não, nesta acção, pelas que futuramente venham a ser desembolsadas (art. 593º do CC e Assento do STJ nº 2/78, de 09.04.77)".
Ora, o objecto da presente acção tem a ver, precisamente, com estas prestações: a autora pretende ser reembolsada pelo réu das prestações que, depois da sentença proferida na acção anterior, pagou à aludida sinistrada, com fundamento no direito de sub-rogação que ali lhe foi reconhecido.
Diz-se no Acórdão recorrido que nas duas acções não se discutem direitos exercidos sobre objectos idênticos, já que as prestações exigidas na primeira acção são diversas, pelo período a que se reportam e respectivo montante, das exigidas na presente acção.
Neste sentido, acrescenta-se, "a decisão de condenação no pagamento das primeiras prestações, no pressuposto de uma sub-rogação legal validamente invocada, não é pressuposto da segunda decisão, não tornando esta última dependente da primeira".
Com o devido respeito, parece-nos que não se decidiu bem, num juízo em que terá pesado, porventura, o entendimento acima referido sobre a falta de legitimidade substantiva para a demanda do BB, mas a que agora não pode aqui atribuir-se relevo, tendo em conta a força e autoridade do caso julgado que deve ser reconhecido à anterior decisão: como se disse, essa autoridade apenas exige a identidade subjectiva das partes das duas acções, podendo as respectivas causas de pedir e/ou pedidos ser diversos.
Repare-se que as prestações satisfeitas e a satisfazer pela autora foram as fixadas previamente na decisão proferida no processo laboral.
Na acção anterior (nº 243/08) foi reconhecido à autora o direito de se sub-rogar no direito de indemnização da lesada contra o terceiro responsável pelo acidente de viação, para obter deste o reembolso das prestações referidas, já efectivamente pagas até aí.
A presente acção tem, assim, por pressuposto aquilo que anteriormente foi definido; apesar de as prestações pedidas serem diversas, elas têm uma base comum de onde emergem, sendo a causa de pedir, nas duas acções, em grande parte, a mesma: o acidente, as lesões sofridas pela lesada, a obrigação de indemnização a que a autora estava vinculada, concretizada no dever de pagamento daquelas prestações fixadas no Tribunal do Trabalho e o direito de reembolso a cargo do réu dessas prestações efectivamente pagas pela autora.
No que concerne a tal base comum, abrangendo elementos que constituem pressuposto lógico e necessário da decisão, impõe-se a autoridade do caso julgado, não cabendo discutir aqui, portanto, o que, a esse título, já foi decidido com trânsito e que aqui deve ser acatado: o montante das prestações, porquanto foi anteriormente fixado; nem o referido direito de reembolso, assente na responsabilidade do réu, também já antes reconhecida.
O que poderia estar em causa nesta acção seria, pois, tão só, a prova do pagamento pela autora das prestações posteriores à anterior sentença, aqui peticionadas; no fundo, apenas a "liquidação" do que, a esse título, foi pago pela autora à lesada em data posterior à anterior decisão.
Enfim, tudo como se decidiu na, também bem fundamentada, sentença da 1ª instância."
*3. [Comentário] O STJ decidiu bem. O objecto da presente acção são os montantes pagos pela seguradora à lesada no acidente depois da primeira acção. Neste pressuposto, não pode deixar de se entender que está assente entre as partes o facto -- isto é, o acidente -- que constitui a fonte desta novas prestações.
MTS