"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



22/10/2020

Jurisprudência 2020 (78)


Inventário; dívidas dos cônjuges;
relacionação*


1. O sumário de RL 7/5/2020 (1510/14.8TMLSB-A.L1-6) é o seguinte:

I - As dívidas dos cônjuges entre si não devem ser relacionadas no inventário para partilha dos bens do casal subsequente ao divórcio.

II - Mas esse passivo tem de ser considerado no momento da partilha.

III - Por isso, justifica-se a suspensão da instância no inventário após a realização a conferência de interessados, até que seja proferida decisão transitada em julgado nos autos de prestação de contas que correm por apenso.


2. Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:

"No caso concreto não está em causa uma questão sobre relacionação de bens. Portanto, é óbvio que a referência doutrinária feita pelo apelante não tem pertinência.

Relevante é sim, a parte em que Lopes Cardoso indica como se faz o pagamento e em que momento, das dívidas dos cônjuges entre si.

Assim, e concordando com este autor, tal passivo não é relacionado mas tem de ser considerado no momento da partilha. Por isso, bem andou a 1ª instância ao ordenar a suspensão da instância até que seja proferida decisão transitada em julgado no apenso de prestação de contas, ao abrigo do disposto no art. 272º nº 1 do Código de Processo Civil."


*3. [Comentário] A RL decidiu bem quanto à suspensão da instância.

Importa, no entanto, chamar a atenção para a circunstância de a citação da obra de Lopes Cardoso se encontrar desactualizada. Efectivamente, quando na referida edição de 1980 se afirmava, segundo a transcrição do Apelante que consta do recurso, que

A execução desta disciplina não impõe que na partilha se dê pagamento ao cônjuge credor do que o outro cônjuge lhe está devendo.,

afirma-se agora (Lopes Cardoso, Partilhas Judiciais III (2015), 341) que

A execução desta disciplina impõe que na partilha se dê pagamento ao cônjuge credor do que o outro cônjuge lhe está devendo, como se diz adiante.

Portanto, o crédito de compensação de um dos cônjuges sobre o outro deve mesmo ser objecto de relacionação (Lopes Cardoso, Partilhas Judiciais III (2015), 342). No mesmo sentido, Teixeira de Sousa/Lopes do Rego/Abrantes Geraldes/Pinheiro Torres, O Novo Regime do Processo de Inventário e Outras Alterações na Legislação Processual Civil (2020), 159.

MTS