"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



07/10/2020

Jurisprudência 2020 (67)


Cumulação subsidiária de pedidos;
omissão do pedido subsidiário*


1. O sumário de RG 12/3/2020 (665/16.1T8VVD.G1) é o seguinte:

I- Quando o autor alega factualidade que se subsume a duas causas de pedir diversas, uma que leva à nulidade do acto e outra que leva à anulabilidade, e apenas formula pedido no sentido de o acto ser declarado nulo, sendo óbvio que o resultado material que pretende pode ser alcançado quer pela via da nulidade quer da anulabilidade, pode o Tribunal, sem violar o disposto no art. 609º,1 CPC, interpretar o pedido formulado de forma a considerar que também está pedida a anulabilidade, porque: a) tal corresponde à tutela pretendida pelo autor, ainda que deficientemente expressa; b) a nulidade é um vício mais grave que a mera anulabilidade, donde a possibilidade de o Tribunal anular o negócio em vez de o declarar nulo é um minus em relação ao que foi pedido; c) os réus não são prejudicados em nada, pois a causa de pedir consta da petição inicial, nas suas contestações referiram-se a essa questão, embora desvalorizando-a, e nos temas da prova foram incluídos, sem reclamação da parte dos réus, factos subjacentes a essa causa de pedir; d) solução contrária seria um atentado à economia processual, porque, podendo a questão ser já pacificada neste processo, iria implica a necessidade de o autor intentar uma segunda acção, para obter o mesmo resultado, formulando de forma clara o pedido que aqui ficou esquecido.

II- Improcede a invocação da caducidade desse direito da autora a pedir a anulabilidade do negócio, uma vez que ficou provado que não foi entregue qualquer quantia a título de preço, facto esse que tem necessariamente de ser visto como o negócio não estar cumprido, para os efeitos do disposto no art. 287º, 2 CC.

2. Na fundamentação do acórdão escreveu-se o seguinte:

"A sede legal do princípio dispositivo é o art. 3º,1 CPC: “o Tribunal não pode resolver o conflito de interesses que a acção pressupõe sem que a resolução lhe seja pedida por uma das partes e a outra seja devidamente chamada para deduzir oposição”.

Explicando a razão de ser desta norma, escrevem Abrantes Geraldes e outros (CPC anotado), que “podendo as partes dispor dos direitos de natureza privada, sobre as mesmas recai o ónus de promover e de impulsionar os instrumentos de natureza processual destinados a assegurar a respectiva tutela. O Estado, através dos Tribunais, não age por iniciativa própria em matéria de direito privado; só dirime os litígios cuja resolução lhe seja solicitada pelos interessados ou por quem detenha legitimidade extraordinária ou indirecta, incluindo certos casos em que esta é atribuída ao Ministério Público”.

Não é preciso mais para concluir que o princípio do dispositivo não impede a solução que a recorrente pretende, pois o litígio foi trazido por ela ao Tribunal, mediante a entrega da petição inicial em Juízo.

Mas o princípio do dispositivo manifesta-se de forma mais directa, e por isso mais relevante, no andamento de cada processo civil em concreto.

Os mesmos autores, e na mesma obra, continuam assim: “o mesmo princípio estende-se à configuração do objecto do processo, através da formulação do pedido e da alegação da matéria de facto que serve de fundamento à acção ou à defesa (art. 5º,1).

Aqui interessa-nos explorar o conceito e o alcance do pedido.

A noção de pedido está consagrada no art. 581º,3 CPC, e corresponde ao efeito prático-jurídico que o autor pretende obter com a acção.

Assim, no caso concreto que nos ocupa, o pedido que a autora formulou é o de ser declarada a nulidade do negócio de compra e venda das motorizadas, com fundamento na simulação, decretando-se a sua restituição ao património conjugal.

É fácil de perceber, neste exemplo concreto, as duas vertentes do pedido: a vertente prática do pedido formulado é o de ver os dois motociclos regressar ao património conjugal. A vertente jurídica é obter a declaração de nulidade do dito negócio.

E há outra conclusão que temos igualmente de extrair daqui: o que verdadeiramente interessa para a tutela judiciária que o autor vem pretender exercer, aquilo que ele verdadeiramente pretende não é a declaração de nulidade do contrato. Essa declaração não passa de uma realidade intelectual, uma construção do pensamento jurídico que é vista pelo autor apenas como um meio para atingir um fim. E esse fim, que é aquilo que a parte quer, é sempre um fim real, objectivo e palpável: in casu, é o reingresso dos motociclos no património do casal.

Como escreve Abrantes Geraldes, in Temas da Reforma do Processo Civil, vol. I, 2ª edição, fls. 119 e ss, “mais importante que a qualificação jurídica que seja dada pelo autor, deve atender-se ao efeito prático que o mesmo pretende efectivamente alcançar (2), o que é determinante para o conteúdo da decisão final ou para aferição das excepções dilatórias da litispendência ou de caso julgado”.

E bem se compreende que tem de ser assim. Os Tribunais existem para dirimir litígios concretos, resolvendo problemas práticos dos cidadãos, e não para fazer construções teóricas, ou elocubrações de natureza técnico-jurídica. É certo que estas, do ponto de vista do Tribunal, são essenciais para fazer a ligação entre o plano abstracto das normas jurídicas e o mundo dos factos concretos; já da perspectiva das partes que recorrem ao Tribunal não passam de um instrumento para atingir o seu verdadeiro objectivo, que é sempre de natureza prática.

Isto para dizer que no caso dos autos é incontroverso que a pretensão da autora, aquilo que ela verdadeiramente pretende com a instauração desta acção, é o regresso dos motociclos à propriedade e posse do casal, ou, melhor dizendo, ao património conjugal.

Sendo esta a sua pretensão, da leitura da petição inicial verificamos que são avançadas duas causas de pedir diversas, que, se devidamente escoradas no material fáctico pertinente, se mostram capazes de produzir o efeito jurídico/prático pretendido. E a sentença recorrida analisou essas causas de pedir. A primeira, assente na simulação como vício da vontade, melhor dizendo como divergência entre a vontade declarada e a vontade real, improcedeu por não terem resultado provados os factos constitutivos da mesma. A segunda assenta na conjugação do art. 1682º,1 CC, segundo o qual “a alienação ou oneração de móveis comuns cuja administração caiba aos dois cônjuges carece do consentimento de ambos, salvo se se tratar de acto de administração ordinária”, com o art. 1687º.1 CC, segundo o qual faltando o consentimento de um deles, a consequência é a anulabilidade.

Esta causa de pedir, como a própria sentença recorrida analisou e concluiu, procede. Ou seja, o Tribunal recorrido, aplicando o Direito aos factos provados, concluiu que com fundamento na violação desse artigo 1682º,1 CC, o contrato em causa é anulável.

Os vícios da nulidade e da anulabilidade têm algumas diferenças de regime jurídico mas, como decorre de uma leitura do art. 289º,1 CC, têm os mesmos efeitos: tanto a declaração de nulidade como a anulação do negócio têm efeito retroactivo, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente.

Assim, o cenário com que nos deparamos neste momento é o de a autora pretender o regresso dos motociclos ao património conjugal, e, pelo menos uma das causas de pedir que ela invocou na petição inicial, deve ser julgada procedente, o que deveria levar então à procedência da acção.

Cabe então perguntar em nome de que valor ou princípio deve o Tribunal abster-se de conceder o efeito prático/jurídico pretendido pela autora.

Desde logo, o art. 5º,3 CPC dispõe que o Juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito.

Em comentário a esta norma, pode ler-se no CPC anotado de Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Sousa que “o princípio da oficiosidade, no que respeita à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, tem como limite as questões cuja apreciação dependa da iniciativa do interessado, como acontece com a caducidade reportada a direitos disponíveis (art. 33º,1), a prescrição (art. 303º), a anulabilidade (art. 289º,1), a resolução (art. 436º,1) ou a compensação (art. 848º,1 CC). Está ainda condicionado pela necessidade de ser respeitado o contraditório, por forma a evitar decisões-surpresa, isto é, contra a corrente do que as partes alegaram (art. 3º,3).

O grande obstáculo que pode ser utilizado para impedir que em casos como o presente seja concedido o efeito prático/jurídico pretendido pelo autor é o disposto no art. 609º,1 CPC: “a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir”.

Como se pode ler na obra supra citada, em anotação a este artigo, “a prática judiciária revelou situações cuja resolução implicou alguma atenuação da rigidez de tal regra, nos termos que foram objecto de uniformização:

a) no Assento nº 4/95 firmou-se a seguinte jurisprudência: “quando o tribunal conhecer oficiosamente da nulidade de negócio jurídico invocado no pressuposto da sua validade, e se na acção tiverem sido fixados os necessários factos materiais, deve a parte ser condenada na restituição do recebido, com fundamento no nº 1 do art. 289º do CC”;

b) No AUJ nº 3/01 concluiu-se que “tendo o autor, em acção de impugnação pauliana, pedido a declaração de nulidade ou anulação do acto jurídico impugnado , tratando-se de erro na qualificação jurídica do efeito pretendido, que é a ineficácia do acto em relação ao autor (nº 1 do art. 616º CC), o juiz deve corrigir oficiosamente tal erro e declarar tal ineficácia, como permitido pelo art. 664º do CPC [de 1961]”.

Dentro desta linha de atenuação da rigidez formal da regra do art. 609º,1 CPC, que nos parece a todos os títulos correcta, no caso dos autos nada obsta, antes tudo aponta para que se proceda à mesma atenuação, de forma a conseguir chegar à melhor solução.

Assim, não há dúvidas que a autora pretende a devolução dos motociclos ao património conjugal. Invocou pelo menos duas causas de pedir, baseadas uma na simulação e a outra na falta de legitimidade de um dos cônjuges para alienar bem comum do casal. A primeira improcede, mas a segunda procede. A autora não pediu expressamente que o Tribunal anule o contrato com base nesta segunda causa de pedir, tendo pedido apenas que o declare nulo com base na primeira.

Sendo a nulidade um vício mais grave que a mera anulabilidade, a possibilidade de o Tribunal anular o negócio em vez de o declarar nulo é um minus em relação ao que foi pedido (embora, como já vimos, com os mesmos efeitos práticos).

Finalmente, poder-se-á dizer que ao interpretar o pedido da autora desta forma maleável, de forma a entender que ela só por esquecimento deixou de formular expressamente o pedido de anulação do contrato, mas que este corresponde à sua verdadeira pretensão, estamos a prejudicar os réus, nomeadamente por violação do princípio do contraditório?

Se pudermos afirmar que uma decisão nesse sentido teria apanhado os réus de surpresa, por eles não estarem de todo a contar com essa condenação, e não se terem podido defender contra ela, alegando factos e interpretando o direito, então não teremos dúvidas em afirmar que haveria uma violação do contraditório, e como tal não se poderia avançar por essa solução.

Porém, não é isso que sucede.

Primeiro, porque a autora fez constar da petição inicial a referência a esta segunda causa de pedir (cfr. artigos 32º a 42º dessa peça).

Segundo, porque todos os factos subjacentes a essa causa de pedir foram alegados e discutidos pelas partes.

Terceiro, porque os réus A. L. e F. M., nas suas contestações, demonstraram estarem cientes dessa causa de pedir alegada pela autora (arts. 4º e 19º de tais peças), limitando-se a desvalorizar a mesma; e ainda, como escreve a autora nas suas conclusões de recurso, especial relevo deve ser dado à contestação do 1º Réu, que se defende invocando que o negócio em causa consubstanciou “…um acto de mera administração ordinária do património do casal.”, como alega no artigo 27 da sua contestação.

E quarto, porque nos temas da prova, o Tribunal incluiu factos subjacentes a esta causa de pedir, como os de saber se a venda foi realizada sem o consentimento da autora, e saber se a Autora só teve conhecimento desse negócio no dia 15 de Novembro de 2015.

A solução que agora defendemos traz inegáveis vantagens do ponto de vista da economia processual, pois permite resolver já nestes autos o presente litígio, coisa que a solução contrária não permitiria, pois, se se mantivesse a decisão de primeira instância, o rigor do conceito de pedido levaria necessariamente a aceitar que a autora poderia propor uma nova acção agora só com base na segunda das referidas causas de pedir, formulando o pedido correspondente, e não haveria excepção de caso julgado, por serem diferentes os pedidos.

Duplicação de processos em Tribunal.

Perda de tempo e de recursos.

Finalmente, não podemos deixar de mencionar aqui, em suporte da tese que defendemos, o próprio acórdão do STJ que a recorrente cita nas suas alegações, e que é bastante esclarecedor (18-01-2018, Revista n.º 1005/12.4TBPVZ.P1.S1; Abrantes Geraldes (Relator): 

“I - Sem embargo da oficiosidade relativamente à qualificação jurídica exposta pelas partes, o tribunal não pode na sentença extravasar do objecto do processo que é integrado tanto pelo pedido como pela causa de pedir (art. 609.º, n.º 1, do CPC). II - Esta limitação é especialmente imposta quando esteja em causa a declaração de anulação de um negócio jurídico, uma vez que a sua arguição, para além de depender da iniciativa do interessado, está sujeita a um prazo de caducidade que não é de conhecimento oficioso (art. 287.º do CC). III - Numa acção cujo objecto seja integrado exclusivamente pela declaração de nulidade de um contrato de compra e venda com fundamento em simulação não pode ser declarada a anulação do mesmo contrato com fundamento na falta de consentimento dos outros filhos dos vendedores, ao abrigo do art. 877.º, n.º 2, do CC. IV - Nos casos em que a delimitação do objecto do processo não resulte com total evidência da petição inicial, revela-se necessária a interpretação da vontade manifestada pelo autor e a apreciação do modo como esse objecto foi compreendido quer pela parte contrária, quer pelo tribunal. V - Numa acção em que foi pedida a declaração de nulidade de um contrato de compra e venda com fundamento em simulação, mas em que também se aludiu à anulabilidade do mesmo contrato com fundamento na falta de consentimento dos demais filhos dos vendedores, nos termos do art. 877.º do CC (venda a filhos ou netos), apesar da improcedência do pedido de declaração de nulidade, é legítimo na sentença declarar a anulação do contrato numa situação em que concorrem as seguintes circunstâncias: a) Foram alegados na petição inicial factos relacionados com a anulabilidade prevista no art. 877.º do CC e na contestação os réus defenderam-se com a alegação da existência do consentimento dos demais filhos e com o facto de estes terem tido conhecimento da venda há mais de um ano, factos que apenas interessavam na medida em que estivesse em causa a anulação do contrato ao abrigo do art. 877.º, n.º 2, do CC; b) Os demais filhos dos vendedores que pela ré vendedora foram chamados a intervir na acção instauraram uma acção autónoma contra os mesmos réus pedindo que fosse declarada a anulação do contrato de compra e venda com fundamento no art. 877.º do CC, tendo os réus alegado nessa acção a excepção de litispendência fundada no facto de esse pedido de anulação já ter sido deduzido na presente acção; c) A excepção de litispendência alegada na segunda acção foi julgada procedente, sendo os réus absolvidos da instância, decisão que, apesar do recurso interposto pelos autores, foi confirmada pela Relação; d) Na audiência prévia da presente acção o juiz integrou nos temas de prova matéria relacionada com a falta de consentimento dos demais filhos dos vendedores, o que apenas interessaria para a acção na perspectiva da posterior apreciação de um pedido de anulação formulado ao abrigo do art. 877.º do CC; e) Antes da audiência de julgamento os autores apresentaram requerimento no sentido de ser apreciada subsidiariamente a anulação do contrato de compra e venda, pretensão que foi indeferida com a justificação de que se tratava de uma mera divergência de qualificação jurídica, a qual seria oportunamente considerada na sentença. VI - Uma perspectiva formal que, nestas circunstâncias conjugadas, considerasse como único objecto do processo a declaração de nulidade do contrato de compra e venda com fundamento em simulação, desconsiderando a anulablidade do mesmo contrato ao abrigo do art. 877.º, n.º 2, do CC, traduziria uma situação de abuso objectivo do direito de defesa, cujos efeitos deveriam ser vedados por aplicação do disposto no art. 334.º do CC”.

Assim, consideramos que nesta parte assiste razão à recorrente, e que o Tribunal recorrido, interpretando de forma extensiva e completa a pretensão da autora, podia e devia ter conhecido do pedido implícito de anulação do negócio.


*3. [Comentário] A RG decidiu segundo o "sentimento jurídico", mas de uma forma que não é isenta de reparos.

Na petição inicial, a Autora alega duas causas de pedir distintas (a nulidade, por simulação, do negócio celebrado pelo seu (ex-)marido e a anulabilidade deste negócio pela falta de consentimento de ambos os cônjuges), mas formula apenas o pedido de declaração de nulidade. Em termos estritos, o que a Autora deveria ter formulado era uma cumulação subsidiária de pedidos: devia ter formulado, como pedido principal, o pedido de declaração de nulidade do negócio e, como pedido subsidiário, o pedido de anulação desse mesmo negócio (note-se, aliás, que não haveria nenhum obstáculo na inversão da ordem do pedido principal e do pedido subsidiário). 

Visto por esta (correcta) perspectiva, imediatamente se pode concluir que o problema é mais complexo do que a RG dá a entender. No fundo, a questão em causa é a de saber como justificar que se possa apreciar e, eventualmente, considerar procedente um pedido subsidiário não explicitamente formulado pelo demandante.

Este enquadramento permite desde logo afastar que se esteja perante um caso subsumível ao disposto no art. 5.º, n.º 3, CPC, porque não se trata de qualificar juridicamente uma causa de pedir, mas antes de atender a duas causas de pedir distintas e, portanto, a dois pedidos igualmente distintos (dado que, como é bom de ver, uma coisa é a declaração de nulidade de um negócio, outra é a anulação desse mesmo negócio).

O caso sub iudice também nada tem a ver com as consequências da declaração de nulidade de um acto, dado que a anulabilidade do negócio celebrado pelo (ex-)marido não é certamente uma decorrência legal daquela declaração de nulidade. 

Refira-se ainda que a RG "joga" com a circunstância de a anulabilidade ser (alegadamente, acrescente-se) um minus em relação à nulidade. Bastaria então que o único pedido formulado pela Autora tivesse sido o da anulabilidade do negócio para que então se devesse entender que a RG estaria impedida de vir a conhecer da questão da nulidade (isto é, de passar de um minus para um maius), apesar de, ainda por cima, aquela ser uma questão de conhecimento oficioso (art. 286.º CC).

A melhor argumentação jurídica teria sido a de que o tribunal a quo, em cumprimento do dever de colaboração (art. 7.º, n.º 2, CPC), deveria ter solicitado à Autora que esclarecesse se, além da causa de pedir consubstanciada na nulidade (baseada em simulação), também pretendia fazer valer a anulabilidade do negócio (fundamentada na falta de consentimento de ambos os cônjuges). Portanto, o que a RG pode censurar à 1.ª instância é o não cumprimento do dever de esclarecimento.

Seria então neste quadro que a RG poderia ter considerado que, não devendo a Autora ser prejudicada pela omissão de uma conduta devida da 1.ª instância e havendo todos os elementos para o exercício do poder de substituição pela Relação, se poderia conhecer de um pedido subsidiário fundamentado, mas não formulado explicitamente por aquela Parte.

MTS