"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



21/09/2022

Jurisprudência 2022 (27)


Processo de inventário;
tornas; execução


1. O sumário de RL 3/2/2022 (2253/14.8TBFUN-B.L1-6) é o seguinte:

I.– A execução especial que incide sobre os bens adjudicados ao devedor de tornas que não cumpriu com o seu pagamento é o modo que é conferido ao credor das tornas de fazer valer o seu direito às mesmas, em substituição da execução comum.

II.– A decisão recorrida ao admitir os herdeiros a possibilidade de, perante as propostas apresentadas por terceiros compradores, licitarem nos termos do artº 820º nº 5 do CPC, assumiu que os herdeiros possuem o estatuto de exequentes nos autos, pois são estes os credores que se apresentam no âmbito da execução especial que decorre do artº 1378º nº 3 do CPC/95.

III.– Face a tal estatuto a dispensa do depósito do preço, à semelhança da licitação dos credores sem que assumam a qualidade de proponentes, resulta das normas adjectivas aplicáveis à venda judicial por força do artº 815º do CPC.


2. Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:

"Antes de abordarmos o objecto do recurso em concreto importa ter presente que os presentes autos de inventário foram intentados a 1 de junho de 2000, pelo que quanto aos tramites processuais aplicáveis no âmbito do processo especial de inventário haverá que considerar o regime do Código de Porcesso Civil de 1961 (aprovado pelo Decreto-Lei nº 44129, de 28 de dezembro de 1961), na versão subsequente à Reforma de 1995 (operada pelo Decreto-Lei nº 329/95, de 12 de dezembro). [...]

Logo, quanto à parte adjectiva que se prende com o processo de inventário todas as normas mencionadas são relativas ao CPC/95, aplicável aos presentes autos.

A questão a decidir tem na sua génese a licitação pelo interessado M... em bens que excedem a sua quota e, logo, a obrigação constituída de pagamentos de tornas aos demais interessados/herdeiros. [...]

Vigorando in casu o CPC/95 é no âmbito deste que haverá que aferir a forma como se processam os autos quando ocorre excesso de bens licitados. Assim, em primeiro lugar é a secretaria que, organizando o mapa da partilha, vai informar no processo a circunstância de que os bens licitados excedem a quota do respectivo interessado, conforme decorre dos art.º 1375.º e 1376.º do C.P.C.

Os interessados a quem haja de caber tornas são então notificados para requererem a composição dos seus quinhões ou reclamar o pagamento das tornas, concedendo-lhes assim o art.º 1377.º n.º 1 do C.P.C. o direito de optar por uma das duas situações como forma de preencherem o seu quinhão: receber tornas ou a adjudicação das verbas licitadas em excesso pelo devedor de tornas.

Se a opção for pelo pagamento das tornas, seguem-se os procedimentos previstos no art.º 1378.º do C.P.C.

Logo, dispõe o art. 1377º, nº 1, do CPC, na versão aqui considerada, que os «interessados a quem hajam de caber tornas são notificados para requerer a composição dos seus quinhões ou reclamar o pagamento das tornas».

Mais se lê, no nº 2 e nº 3 do citado preceito, que, «[s]e algum interessado tiver licitado em mais verbas do que as necessárias para preencher a sua quota, a qualquer dos notificados [interessados a quem hajam de caber tornas] é permitido requerer que as verbas em excesso ou algumas que lhe sejam adjudicados pelo valor resultante da licitação, até ao limite do seu quinhão», e podendo o licitante «escolher, de entre as verbas em que licitou as necessárias para preencher a sua quota».

Tal como nos diz Lopes Cardoso, in. Partilhas Judiciais, Vol. II, pág. 413: “… tornas haverá sempre que alguém licite em mais bens do que tem direito, ou quando, por virtude da composição dos lotes haja excesso da aludida quota.”

Deste regime resulta que o devedor de tornas, a pedido do credor das tornas que opta por as receber, é notificado pelo tribunal para as pagar ou depositar, na medida em que o valor dos bens que licitou excedem a sua quota hereditária.

Não procedendo o devedor das tornas ao seu pagamento ou depósito, tem ainda assim o credor das tornas novamente duas opções ao seu dispor, podendo requerer: (i) a adjudicação dos bens adjudicados em excesso ao devedor para preenchimento da sua quota, procedendo logo ao depósito das tornas que excedem o seu valor; (ii) a venda dos bens adjudicados ao devedor no processo de inventário, para que as tornas sejam pagas a partir do produto da venda de tais bens.

Com efeito, prescreve o nº 1 do art. 1378º que «[r]eclamado o pagamento das tornas, é notificado o interessado que já de as pagar, para as depositar», acrescentando o nº 2 do mesmo artigo que «[n]ão sendo efetuado o depósito, podem os requerentes pedir que das verbas destinadas ao devedor lhes sejam adjudicadas, pelo valor constante da informação prevista no artigo 1376.º, as que escolherem e sejam necessárias para preenchimento das suas quotas, contante que depositem imediatamente a importância das tornas que, por virtude da adjudicação, tenham de pagar. (…)».

E, nos termos do nº 3 do citado artigo 1378º, «[p]odem também os requerentes pedir que, transitada em julgado a sentença, se proceda no mesmo processo à venda dos bens adjudicados ao devedor até onde seja necessário para o pagamento das tornas».

No caso vertente foi este último o caminho seguido pelos recorrentes, que após terem sido notificados do mapa informativo, onde consta o excesso de licitação e o pagamento de tornas pelo recorrido, solicitam a notificação deste para proceder ao depósito dos valores devidos a cada um dos herdeiros a título de tornas. Face ao incumprimento por parte do licitante e devedor solicitaram os interessados a venda dos bens licitados em excesso.

Escreve a este propósito Lopes Cardoso (in ob cit. págs. 452-453): «Está aqui a criação de um novo, privativo e prático, processo executivo, embora especial.

Regra geral, o direito definido executa-se com base em título idóneo a esse fim (…), mediante formalismo próprio.

No caso considerado tudo é diferente, pois o credor das tornas limita-se a pedir, em simples requerimento, o que no nº 3 do art. 1378.º se lhe consente. Então, formulado tal pedido e transitada que seja a sentença homologatórias das partilhas, procede-se à venda, no próprio processo de inventário dos bens adjudicados ao devedor até onde seja necessário para pagamento do seu débito ao requerente, isto sem haver necessidade de lhe instaurar qualquer processo executivo, de o citar para o efeito de nomear bens à penhora.».

O legislador veio consagrar uma forma de execução especial mais expedita e fácil, que apenas incide sobre os bens adjudicados em excesso ao devedor de tornas, a ter lugar no âmbito do processo de inventário, facilitando ao interessado com direito às tornas a satisfação do seu crédito e evitando o recurso ao processo executivo comum.

Tem sido entendido que esta execução especial que incide sobre os bens adjudicados ao devedor de tornas que não cumpriu com o seu pagamento é o modo que é conferido ao credor das tornas de fazer valer o seu direito às mesmas, em substituição da execução comum, estando-lhe por isso vedado o recurso à mesma, designadamente para que se faça pagar da dívida de tornas por outros bens que não aqueles que foram partilhados no âmbito do processo de inventário.

Neste sentido, se pronunciou o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 24/04/2007 no proc. 53-D/1998.C1 in. www.dgsi.pt ao referir: “Em suma, a cobrança coerciva, não só das tornas mas também dos juros devidos pela demora no pagamento das tornas reclamadas, deve ser efectivada nos termos do n.º3 do art. 1378º do CPC, só podendo a venda incidir sobre bens adjudicados ao devedor de tornas e realizar-se no processo de inventário. Sempre vedado, pois, ao credor de tornas e juros instaurar uma execução por apenso ao inventário e penhorar outros bens do devedor que advieram a este por título diverso da adjudicação em inventário.”

Também foi esta a orientação seguida pelo Acórdão da Relação do Porto proferida a 9/05/2019 no proc. Nº 798.18.0T8PNF.P1, ao referir que:« Não podemos esquecer que o processo de inventário se destina a pôr termo à comunhão hereditária, pelo que surgindo o crédito de tornas no âmbito da partilha do património da herança, a sua cobrança encontra-se limitada pelos bens ou direitos que compõem a herança. O crédito de tornas dos AA. resulta da composição deficitária do seu quinhão hereditário e a dívida de tornas da R. também é a que resulta do seu quinhão preenchido em excesso, pelo que só os bens que lhe foram adjudicados no processo de inventário é que podem responder pela dívida de tornas.

Tal interpretação é não só a que melhor vai ao encontro do previsto do art.º 1378.º do C.P.C. que não constitui apenas uma norma de direito processual como considerou a sentença recorrida, mas antes estabelece o regime a que está sujeito o cumprimento da dívida de tornas, mas também a que se coaduna com a circunstância da herança constituir um património autónomo.

Como é pacífico, a herança indivisa tem a natureza jurídica de património autónomo sendo constituída por uma universalidade de bens, sendo que cada um dos chamados à sucessão é titular de uma quota que incide sobre essa mesma universalidade e não sobre quaisquer bens específicos – só com a realização da partilha e repartição dos bens se concretiza tal direito.

Conforme resulta dos art.º 2068.º e 2097.º do C.Civil, pelas dívidas da herança apenas responde o património que a integra e já não o património de cada herdeiro.

No art.º 2071.º do C.Civil vem contemplada a regra da responsabilidade limitada do herdeiro pelos encargos da herança, na sequência da consideração da mesma como um património autónomo, na consagração do princípio de que só os bens da herança respondem pelos encargos hereditários.

Mesmo após a realização da partilha, cada um dos herdeiros só responde pelos encargos que sejam devidos na proporção da quota que lhe caiba na herança, como estabelece o art.º 2098.º n.º 1 do C.Civil, a menos que os próprios herdeiros deliberem outra coisa. A regra é a limitação da responsabilidade do herdeiro aos bens que recebe da herança. (…) [a] dívida de tornas constitui-se no âmbito e por causa da partilha do património hereditário, considerando-se que a razão de ser que leva o legislador a confinar aos bens da herança a garantia pelas dívidas ou encargos dela, tem neste âmbito igual pertinência, fundamentando o entendimento de que a dívida de tornas está limitada na sua garantia patrimonial ao património da herança recebido pelo devedor de tornas, o que também encontra acolhimento no regime previsto no art.º 1378.º n.º 3 do C.P.C.»

Porém, a propósito desta temática e perante tal decisão do Acórdão da Relação do Porto, decidiu-se no Acórdão do STJ, proferido no mesmo proc. nº 798.18.0T8PNF.P1.S1, datado de 23/01/2020 (ECLI in https://jurisprudencia.csm.org.pt) que:«(…) afigura-se que a orientação assumida pela Relação parte do pressuposto erróneo de considerar que, porque a dívida de tornas se constitui “no âmbito e por causa da partilha do património hereditário”, lhe é extensível, sem mais, o princípio da limitação da garantia patrimonial vigente para as dívidas e os encargos da herança.».

Prosseguindo «O crédito de tornas é um crédito que resulta de uma actividade (a licitação) exercida, com finalidades aquisitivas, pelo herdeiro que arrematou os bens pelo valor que considerou adequado. A esse crédito corresponde, do lado passivo, uma dívida própria do herdeiro licitante, contraída mediante a intervenção da sua vontade no acto de licitação, dívida à qual se aplicam as regras gerais da responsabilidade obrigacional, designadamente em matéria de prescrição (cfr. Lopes Cardoso, Partilhas Judiciais, Vol. II, 3ª ed., Almedina, Coimbra, 1980, pág. 431) e de responsabilidade patrimonial do devedor.».

Ora, também aqui se discute a questão de os recorrentes, perante a ausência de pagamento de tornas por parte do recorrido, terem feito uso do procedimento executivo, incidental e simplificado, que se encontrava previsto no nº 3 do art.1378º do antigo CPC (procedimento que actualmente se encontra previsto no nº 2 do art. 1122º do CPC, na redacção da Lei nº 117/2019, de 13 de Setembro), em nada altera a natureza do crédito de tornas e da correspondente dívida.

Como bem se frisa no Acórdão do STJ a que vimos fazendo referência «(a) função desse procedimento circunscreve-se ao processo de inventário, sem afectar nem o conteúdo nem o objecto do direito de crédito dos aqui AA., pelo que, na parte em que o mesmo não foi satisfeito respondem todos os bens do devedor(…)». Prosseguindo ainda que «[e]sta orientação é aquela que se entende ser compatível com o facto de o crédito de tornas resultar do reconhecimento pela sentença homologatória da partilha, sendo o procedimento executivo do referido nº 3 do art. 1376º do antigo CPC um procedimento incidental e simplificado que não preclude a possibilidade de lançar mão da execução comum nem dos meios de conservação da garantia patrimonial(…). Por outras palavras, o facto de os bens terem sido licitados por um determinado valor e de os credores da herança não terem pedido a sua adjudicação, assim como o facto de os bens terem sido vendidos por valor inferior ao da licitação, são vicissitudes que não afectam o reconhecimento de, com a homologação da partilha, se ter constituído a favor dos herdeiros um crédito que segue as regras gerais do direito substantivo.».

Tal solução, transportada para a questão que ora nos ocupa, significa que o crédito dos recorrentes sobre o recorrido obedece às regras gerais de direito, pelo que tendo o interessado M... licitado todos os bens da herança deixada por óbito do Pai, S…, falecido em 16/05/2000, deve nomeadamente aos demais filhos ( bem como à interessada viúva) o valor das respectivas tornas, neste caso dos herdeiros M... e J... o valor global de 1.963.156,84 € (981.578,42+981.578,42 €).

Foi com base nesta dívida que os ora interessados requereram a venda dos bens e foi na qualidade de herdeiros e admitidos como exequentes, nos termos do artº 820º nº5 do CPC, que os mesmos manifestaram vontade de adquirir o bem e admitidos nesses termos licitaram as verbas nº 1 e 2, respectivamente. Tendo, o recorrente M..., nessa execução licitado o bem da verba nº 1, pelo preço de 385.000,00 €, inferior às tornas a que tem direito, no valor de 981.578,47 €. E a exequente J... licitado o bem constante da verba nº 2, pelo preço de 400.000,00 €, também inferior às tornas a que tem direito, no valor de 981.578,47 €.

Entendem os recorrentes que não lhes está vedado invocar a compensação por forma a isentá-los do depósito dos preços pelos quais adquiriram os mencionados bens pela execução. A questão, porém, não se prende apenas com uma eventual compensação, mas sim a forma como deve ser encarada quer a dívida, quer a forma como é executada e a solução do litígio passar por esta questão essencial.

O Tribunal recorrido sustenta o indeferimento da dispensa de pagamento do depósito do preço no seguinte: «Embora os credores de tornas não sejam os únicos interessados dos presentes autos de inventário, não tendo o interessado M... estado presente da diligência de abertura de propostas por carta fechada, ainda que o mesmo viesse a manifestar concordância com o requerido, não poderia ser alvo de deferimento. Qualquer interessado em adquirir os bens colocados à venda mediante propostas por carta fechada, terá de se submeter às mesmas regras legais existentes, e para adquirir os bens, terá, naturalmente, de pagar o respetivo valor. A partir do momento em que os bens são colocados à venda naquela modalidade, qualquer interessado poderá apresentar propostas, em cumprimento das regras legais estabelecidas e terá a possibilidade de adquirir os bens, consoante as propostas que forem aceites e consoante o resultado das licitações que ocorram (que, no caso concreto, foram abertas à luz do artigo 820.º, n.º 5, do CPC).

Há que evitar que os interessados do processo de inventário, mediante acordo entre si, possam afastar qualquer hipótese de outros interessado poderem adquirir os bens, como tão bem explicou a propoente S…, Lda., na parte final da diligência realizada a 29.06.2021. E esta mesma proponente justificou plenamente o interesse na posição que manifestou, já que, conforme decorre do requerimento que apresentou, mantém interesse na aquisição, e esperança que tal possa vir a acontecer, perante a eventualidade de não ser pago o preço na sequência da notificação para o efeito (a que se reporta o artigo 824.º, n.º 2, do CPC), de a venda ficar sem efeito e de o bem ser adquirido pelo proponente que tiver apresentado a proposta de valor imediatamente inferior (possibilidade prevista no artigo 825.º, n.º 1, al. a) do CPC).

Importa, assim, garantir o cumprimento das regras legais, independentemente de quem pretenda adquirir os bens em causa (de ser ou não credor de tornas, nos presentes autos de inventário), havendo que assegurar, em qualquer caso, o pagamento do preço, conforme impõe o artigo 824.º, n.º 2, do CPC. Destarte, indefere-se o requerido por R…, M... e J..., não podendo os mesmos beneficiar de compensação nos autos (que redundaria em prejuízo da posição dos demais proponentes, sendo inadmissível à luz 853 nº 2 Código Civil), pelo que, em qualquer caso, para que possam adquirir os bens colocados à venda, sempre terá o respetivo preço de ser pago, nos termos previstos no artigo 824.º, n.º 2, do CPC, sob pena de vir a aplicar o disposto no artigo 825.º do CPC.».

A decisão recorrida labora em erro na sua apreciação quando alude que está em causa a defesa de todos os interessados na venda, pois ao admitir os herdeiros a possibilidade de, perante as propostas apresentadas por terceiros compradores, licitarem nos termos do artº 820º nº 5 do CPC, assumiu que os herdeiros possuem o estatuto de exequentes nos autos, pois são estes os credores que se apresentam no âmbito da execução especial que decorre do artº 1378º nº 3 do CPC/95.

Não vislumbramos que aos herdeiros tenha sido permitido licitar, nos termos em que foi admitido aquando da abertura de propostas, mas se entenda que os mesmos não podem beneficiar do demais regime aplicável aos exequentes, em nome de um princípio de impossibilidade de frustração dos interesses dos demais compradores, princípio esse que não está a coberto do previsto no âmbito do artº 853º nº 2 do CC, relativo à exclusão da compensação. Pois é certo que não é admitida a compensação, se houver prejuízo de direitos de terceiro, constituídos antes de os créditos se tornarem compensáveis, ou se o devedor a ela tiver renunciado. In casu, efectuada uma venda judicial ao abrigo de um procedimento executivo, a natureza ou génese de tal procedimento não afasta as normas que presidem a tal venda, mormente a qualidade e estatuto de exequentes, figurando estes como os herdeiros a quem são devidas tornas pelo herdeiro devedor, assumindo este a posição de executado.

Logo, não está tanto em causa a eventual compensação em termos gerais e previstos na lei substantiva, ainda que em termos dogmáticos a situação se reconduza a tal figura, o que ocorre é que a dispensa do depósito do preço, à semelhança da licitação dos credores sem que assumam a qualidade de proponentes, resulta das normas adjectivas aplicáveis à venda judicial.

Assim, como bem frisam os recorrentes, tal prerrogativa assiste aos exequentes/herdeiros por força do artº 815º do CPC. Pois, nos termos de tal preceito o exequente que adquira bens pela execução é dispensado de depositar a parte do preço que não seja necessária para pagar a credores graduados antes dele e não exceda a importância que tem direito a receber; igual dispensa é concedida ao credor com garantia sobre os bens que adquirir.

Importa referir que tal decisão em nada prejudica o herdeiro devedor que face ao valor acrescido que decorre da licitação dos herdeiros credores vê a sua dívida diminuída, não assistindo ao proponente, terceiro em relação aos herdeiros do inventário, qualquer direito constituído, assim, como esse direito não existe ou se sobrepõe no caso de venda judicial ocorrida em qualquer processo executivo, em que ao exequente assiste o direito de licitar nos bens levados à venda judicial e por conseguinte, ficar dispensando do depósito do preço pelo qual exerce tal direito.

Do exposto, conclui-se pela procedência da pretensão recursória, declarando-se que os recorrentes ficam dispensados do pagamento dos bens pelos quais licitaram, nos termos do artº 815º nº 1 do CPC, revogando-se, assim, o despacho recorrido."

[MTS]