"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



30/05/2014

Procedimento extrajudicial pré-executivo




1. O art. 1.º L 32/2014, de 30/5 (LPEP), aprova o procedimento extrajudicial pré-executivo (PEP), aplicável a partir de 1/9/2014 (art. 34.º LPEP).

O PEP é um procedimento de natureza facultativa que se destina, entre outras finalidades expressamente previstas na LPEP, à identificação de bens penhoráveis através da disponibilização de informação e consulta às bases de dados de acesso directo electrónico previstas no CPC para os processos de execução cuja disponibilização ou consulta não dependa de prévio despacho judicial (art. 2.º LPEP). O carácter facultativo do PEP implica que não pode ser considerado um processo especial que deva prevalecer sobre o processo comum e que a sua não utilização pelo credor não tem nenhum efeito preclusivo.

2. O recurso ao PEP é admissível desde que estejam verificadas as seguintes condições:

-- O requerente esteja munido de título executivo que reúna as condições para aplicação da forma sumária do processo comum de execução para pagamento de quantia certa (art. 3.º, al. a), LPEP; cf. 550.º nCPC);

-- A dívida seja certa, exigível e líquida (art. 3.º, al. b), LPEP); a exigência da liquidez da dívida não impede que possam ser exigidos juros vincendos (art. 5.º, n.º 1, al. e), LPEP);

 – O requerente indique o seu número de identificação fiscal em Portugal, bem como o do requerido (art. 3.º, al. c), LPEP).

3. A apresentação do requerimento inicial é efectuada em plataforma informática do Ministério da Justiça ou por este aprovada, criada especificamente para o efeito, nos termos a definir por portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça (art. 4.º LPEP). O requerimento inicial tem o conteúdo estabelecido no art. 5.º LPEP.

Ao requerimento inicial é atribuído um número provisório pelo sistema informático de suporte à actividade dos agentes de execução (SISAAE) e é devolvido ao requerente um identificador único do pagamento, referente aos valores devidos pelo início do procedimento (art. 6.º, n.º 1, LPEP; sobre estes valores, cf. art. 20.º, n.º 1 e 2, LPEP). Depois de efectuado o pagamento devido, o requerimento é automaticamente distribuído a um agente de execução (art. 6.º, n.º 3, e 7.º LPEP).

O agente de execução tem cinco dias úteis para recusar o requerimento (art. 8.º, n.º 1 a 4, LPEP) ou para realizar as consultas em várias bases de dados (art. 8.º, n.º 1 e 9.º, n.º 1, LPEP), no registo informático de execuções (art. 8.º, n.º 2, e 9.º, n.º 2, LPEP) ou ao Banco de Portugal (art. 8.º, n.º 1, e 9.º, n.º 5, LPEP).

Após a concretização das consultas, o agente de execução elabora um relatório em que resume o resultado das mesmas, indicando quais os bens identificados (e aparentemente livres de ónus ou encargos (art. 10.º, n.º 2, al. b), LPEP) ou aparentemente onerados ou com encargos (art. 10.º, n.º 2, al. b), LPEP)) ou a circunstância de não terem sido identificados bens penhoráveis (art. 10.º, n.º 1 e 2, al. a), LPEP). O relatório também deve informar a circunstância de o requerido constar da lista pública de devedores, ter sido declarado insolvente, ter falecido ou, sendo pessoa coletiva, ter sido já dissolvido e liquidado, e ainda ser executado ou exequente em processos de execução pendentes (art. 10.º, n.º 3, LPEP).

4. O relatório é notificado ao requerente, que tem o prazo de 30 dias para:

– (i) Requerer a convolação do procedimento extrajudicial pré-executivo em processo de execução (art. 11.º, n.º 1, al. a), LPEP); a convolação não é automática, dado que o requerente tem de apresentar requerimento executivo ou requerimento de execução de decisão judicial condenatória (art. 18.º, n.º 1, al. a), LPEP) e juntar o relatório elaborado pelo agente de execução (art. 18.º, n.º 1, al. b), LPEP); como decorre do art. 19.º, n.º 1, LPEP, a convolação não pressupõe que tenham sido encontrados bens penhoráveis, mas na execução resultante da convolação também não se repetem as diligências para a localização desses bens (art. 18.º, n.º 4, LPEP); isto significa que não se aplica o disposto no art. 749.º, n.º 1, nCPC, pelo que, em termos práticos, é grande a probabilidade de a execução se extinguir nos termos do art. 748.º, n.º 3, nCPC;

– (ii) No caso de não terem sido identificados bens susceptíveis de penhora, requerer a notificação do requerido (art. 11.º, n.º 1, al. b), LPEP) para este:

– Pagar o valor em dívida, acrescido dos juros vencidos até à data limite de pagamento e dos impostos a que possa haver lugar, bem como dos honorários devidos ao agente de execução (art. 12.º, n.º 1, al. a), LPEP);

– Celebrar acordo de pagamento com o requerente (art. 12.º, n.º 1, al. b), e 17.º LPEP);

– Indicar bens penhoráveis (art. 12.º, n.º 1, al. c), LPEP);

– Opor-se ao procedimento (art. 12.º, n.º 1, al. d), e 16.º LPEP).

O requerido é notificado nos termos do art. 13.º (pessoas singulares) e 14.º (pessoas colectivas) LPEP.

5. Decorrido o prazo de 30 dias sobre a data da notificação do requerido sem que haja deste qualquer reacção, o agente de execução procede à inclusão do requerido na lista pública de devedores no prazo de 30 dias (art. 15.º, n.º 1, LPEP). Esta inclusão possibilita que o requerente obtenha uma certidão electrónica de incobrabilidade da dívida a emitir pelo agente de execução (art. 25.º, n.º 1, LPEP).

6. O requerido pode apresentar oposição ao PEP (art. 12.º, n.º 1, al. d), LPEP), com base nos fundamentos previstos no CPC para a oposição à execução, de acordo com o título executivo em causa (art. 16.º, n.º 1, LPEP; cf. art. 729.º a 731.º e 857.º nCPC). A esta oposição aplica-se o regime previsto no CPC para a oposição à execução (art. 16.º, n.º 2, LPEP; cf. art. 728.º e 732.º nCPC). A oposição é tramitada de forma autónoma como processo especial de oposição ao PEP (art. 16.º, n.º 3, LPEP).

7. Se o PEP tiver terminado sem a identificação de quaisquer bens penhoráveis e não tiver sido convolado em processo de execução, o requerente pode, no prazo de três anos após o termo do PEP, solicitar a realização de novas consultas (art. 19.º, n.º 1, LPEP).

8. Dos actos praticados pelo agente de execução cabe reclamação para o órgão de fiscalização e disciplina e, quanto a aspectos de legalidade, para o juiz (art. 27.º, n.º 1, LPEP).


MTS