Comunicabilidade da dívida; incidente;
embargos de executado
I. O sumário de RG 17/12/2018 (7539/15.1T8VNF-D.G1) é o seguinte:
1 - O facto de a questão da comunicabilidade da dívida ter sido invocada em incidente autónomo não impede ao cônjuge do executado a dedução de oposição à execução mediante embargos invocando factos e questões diversas das alegadas na oposição ao incidente, sendo que os fundamentos da oposição ao incidente têm de ser, obviamente, alegados, nesse incidente.
2 – Com efeito, tal como decorre do preceituado no art. 741º, nº 5 do C. P. Civil, se no âmbito do incidente de comunicabilidade a dívida for considerada comum, o cônjuge do executado adquire a qualidade de executado e como tal, tem de lhe ser possível deduzir oposição à execução (e todos os demais direitos que a lei confere ao executado), independentemente da forma como foi invocada no processo a questão da comunicabilidade da dívida.
2 – Com efeito, tal como decorre do preceituado no art. 741º, nº 5 do C. P. Civil, se no âmbito do incidente de comunicabilidade a dívida for considerada comum, o cônjuge do executado adquire a qualidade de executado e como tal, tem de lhe ser possível deduzir oposição à execução (e todos os demais direitos que a lei confere ao executado), independentemente da forma como foi invocada no processo a questão da comunicabilidade da dívida.
II. Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:
“A execução tem que ser promovida pela pessoa que no título figure como credor e deve ser instaurada contra a pessoa que no título tenha a posição de devedor”. É esta a regra quanto à legitimidade das partes na ação executiva, estabelecida no art. 53º, nº 1 do C. P. Civil e que já resultava do anterior art. 55º, nº 1.
Com a reforma da ação executiva introduzida pelo DL 38/2003 de 8/3, estabelecendo-se uma exceção à regra acabada de referir, passou a conceder-se ao exequente, no requerimento executivo (cfr. art. 825, nº 2 do anterior C. P. Civil) e ao executado, no prazo da oposição (cfr. art. 825, nº 2 do anterior C. P. Civil) a possibilidade de se estender ao cônjuge do executado a eficácia do título oponível ao cônjuge executado (v. Miguel Teixeira de Sousa, in A Execução das dívidas dos cônjuges: perspectivas de evolução, Caderno I, 2ª ed., Centro de Estudos Judiciários, disponível em: http://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/ProcessoCivil/Caderno_I_Novo%20_Processo_Civil_2edicao.pdf, pág 489; Maria José Capelo in Pressupostos Processuais Gerais na Ação Executiva, A Legitimidade e as Regras de Penhorabilidade, Themis, ano IV, nº 7, 2003, pág. 83 e J. H. Delgado de Carvalho in Acção Executiva para Pagamento de Quantia Certa, 2ª ed., pág. 121), invocando a comunicabilidade da dívida, nos casos em que, sendo a dívida comum, a execução se baseava em título executivo extrajudicial apenas conta um dos cônjuges, fazendo coincidir a situação processual com a situação substantiva.
Com esta reforma, passou pois, a ser possível introduzir no processo executivo a questão da comunicabilidade da dívida.
Com o Código de Processo Civil atualmente em vigor, mantém-se este regime (v. art. 741º), embora com alterações, sendo nomeadamente, facultada ao exequente a possibilidade de invocar a comunicabilidade da dívida em requerimento autónomo (quando não o tenha feito no requerimento executivo) até ao início das diligências para venda ou adjudicação dos bens penhorados e, caso o cônjuge do executado recuse a comunicabilidade da dívida, tal recusa dá lugar a um incidente destinado a determinar tal comunicabilidade (no regime anterior não era possível discutir a questão da comunicabilidade caso o cônjuge do executado, depois de citado, recusasse essa comunicabilidade).
Sendo a comunicabilidade da dívida suscitada no requerimento executivo, o cônjuge do executado pode opor-se-lhe na oposição à execução (v. art. 741º, nº 3 – a) do C. P. Civil).
Caso tal incidente seja deduzido pelo exequente em requerimento autónomo (tal como ocorreu no caso em apreço), resulta do disposto no art. 741º, nº 3 – b) do C. P. Civil que a respetiva impugnação, quando deduzida, terá de o ser na oposição a esse incidente.
Mas quererá isto dizer que neste caso, tal como se entendeu na decisão recorrida, está vedada ao cônjuge do executado a possibilidade de deduzir embargos à execução?
Entendemos que não.
Com efeito, sendo permitido ao cônjuge do executado utilizar os meios de defesa previstos nos arts. 729º e 731º do C. P. Civil quando pretenda, além do mais, contestar a comunicabilidade da dívida alegada no requerimento executivo (v. arts 726º, nº 7 e 741º, nº 2, ambos do C. P. Civil) não faria sentido que, no caso em que tal comunicabilidade é invocada em requerimento autónomo, o cônjuge do executado não pudesse lançar mão dos meios de oposição previstos nos mencionados preceitos.
Na verdade, tal como decorre do preceituado no art. 741º, nº 5 do C. P. Civil, se no âmbito do incidente de comunicabilidade a dívida for considerada comum, o cônjuge do executado adquire a qualidade de executado e como tal, tem de lhe ser possível deduzir oposição à execução (e todos os demais direitos que a lei confere ao executado), independentemente da forma como foi invocada no processo a questão da comunicabilidade da dívida.
Conforme refere J. H. Delgado (in ob. cit., pág. 120) uma vez decidido o incidente de comunicabilidade, a dívida haja sido considerada comum, o cônjuge adquire o estatuto de parte principal, com poderes totalmente equiparados aos do executado, já que esta equiparação é reconhecida quando o cônjuge é citado na sequência da penhora de bens imóveis ou estabelecimento comercial, próprios do executado ou comuns, e o credor configurou a dívida como própria do executado (cfr, art. 787º, nº 1),
Acrescenta este Autor que a autonomização dos dois números do art. 787º apenas serve para tornar claro que, quando o exequente invocar a comunicabilidade da dívida, a recusa pelo cônjuge dessa comunicabilidade não tem a virtualidade de definir a responsabilidade patrimonial por essa dívida como própria daquele que a contraiu. Com efeito, no regime anterior, o art. 825º do C. P. Civil previa que se o cônjuge recusasse a comunicabilidade, a execução não poderia prosseguir contra ele.
Entendendo-se que, no caso em que a comunicabilidade da dívida é invocada em requerimento autónomo, o cônjuge do executado não pode deduzir oposição à execução, deixaria na disponibilidade do exequente a possibilidade (ou não) de o cônjuge do executado deduzir tal meio de defesa.
Parece-nos que a diferença de regimes entre o caso em que a comunicabilidade é invocada no requerimento executivo e aquela em que tal comunicabilidade apenas é alegada posteriormente em incidente autónomo (prevista no art. 741º, nº 3 do C. P. Civil), se prenderá, essencialmente, com razões de celeridade processual.
Efetivamente, sendo a questão da comunicabilidade invocada em requerimento autónomo, quando a execução já se encontra “em marcha”, a dedução de oposição ao incidente far-se-á de forma independente da eventual dedução de embargos à execução, já que a tramitação de um incidente processual, cujas regras se encontram previstas no art. 293 a 295º e seguintes, será mais célere que o processamento de uma oposição à execução mediante embargos de executado, desde logo porque o prazo para a oposição ao incidente é de 10 dias, enquanto os prazos para a dedução e para a contestação dos embargos são, respetivamente, de 20 dias contados da respetiva citação/notificação (v. art. 293º, nº 2 e nº 2 do art. 732º, ambos do C. P. Civil).
Na verdade, determinando a dedução do incidente de comunicabilidade da dívida, na pendência da execução, a suspensão da venda, quer dos bens próprios do cônjuge executado que já se mostrem penhorados, quer dos bens comuns do casal, até à decisão a proferir (v. art. 741º, nº 4 do C. P. Civil), justifica-se que de forma célere se decida que bens respondem pela dívida invocada na execução e, portanto, que bens poderão aí ser penhorados e vendidos (v. arts. 1695º e 1696º do C. Civil).
Contudo, como foi dito, tal não impedirá o cônjuge do executado de exercer os seus direitos de defesa por meio de embargos, invocando factos e questões diversas das alegadas na oposição ao incidente, devendo os embargos ser julgados extintos por inutilidade superveniente caso o incidente de comunicabilidade seja julgado improcedente.
Assim, o facto de a questão da comunicabilidade da dívida ter sido invocada em incidente autónomo não impede ao cônjuge do executado a dedução de oposição à execução mediante embargos, sendo que os fundamentos da oposição ao incidente têm de ser, obviamente, alegados, nesse incidente."
Com a reforma da ação executiva introduzida pelo DL 38/2003 de 8/3, estabelecendo-se uma exceção à regra acabada de referir, passou a conceder-se ao exequente, no requerimento executivo (cfr. art. 825, nº 2 do anterior C. P. Civil) e ao executado, no prazo da oposição (cfr. art. 825, nº 2 do anterior C. P. Civil) a possibilidade de se estender ao cônjuge do executado a eficácia do título oponível ao cônjuge executado (v. Miguel Teixeira de Sousa, in A Execução das dívidas dos cônjuges: perspectivas de evolução, Caderno I, 2ª ed., Centro de Estudos Judiciários, disponível em: http://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/ProcessoCivil/Caderno_I_Novo%20_Processo_Civil_2edicao.pdf, pág 489; Maria José Capelo in Pressupostos Processuais Gerais na Ação Executiva, A Legitimidade e as Regras de Penhorabilidade, Themis, ano IV, nº 7, 2003, pág. 83 e J. H. Delgado de Carvalho in Acção Executiva para Pagamento de Quantia Certa, 2ª ed., pág. 121), invocando a comunicabilidade da dívida, nos casos em que, sendo a dívida comum, a execução se baseava em título executivo extrajudicial apenas conta um dos cônjuges, fazendo coincidir a situação processual com a situação substantiva.
Com esta reforma, passou pois, a ser possível introduzir no processo executivo a questão da comunicabilidade da dívida.
Com o Código de Processo Civil atualmente em vigor, mantém-se este regime (v. art. 741º), embora com alterações, sendo nomeadamente, facultada ao exequente a possibilidade de invocar a comunicabilidade da dívida em requerimento autónomo (quando não o tenha feito no requerimento executivo) até ao início das diligências para venda ou adjudicação dos bens penhorados e, caso o cônjuge do executado recuse a comunicabilidade da dívida, tal recusa dá lugar a um incidente destinado a determinar tal comunicabilidade (no regime anterior não era possível discutir a questão da comunicabilidade caso o cônjuge do executado, depois de citado, recusasse essa comunicabilidade).
Sendo a comunicabilidade da dívida suscitada no requerimento executivo, o cônjuge do executado pode opor-se-lhe na oposição à execução (v. art. 741º, nº 3 – a) do C. P. Civil).
Caso tal incidente seja deduzido pelo exequente em requerimento autónomo (tal como ocorreu no caso em apreço), resulta do disposto no art. 741º, nº 3 – b) do C. P. Civil que a respetiva impugnação, quando deduzida, terá de o ser na oposição a esse incidente.
Mas quererá isto dizer que neste caso, tal como se entendeu na decisão recorrida, está vedada ao cônjuge do executado a possibilidade de deduzir embargos à execução?
Entendemos que não.
Com efeito, sendo permitido ao cônjuge do executado utilizar os meios de defesa previstos nos arts. 729º e 731º do C. P. Civil quando pretenda, além do mais, contestar a comunicabilidade da dívida alegada no requerimento executivo (v. arts 726º, nº 7 e 741º, nº 2, ambos do C. P. Civil) não faria sentido que, no caso em que tal comunicabilidade é invocada em requerimento autónomo, o cônjuge do executado não pudesse lançar mão dos meios de oposição previstos nos mencionados preceitos.
Na verdade, tal como decorre do preceituado no art. 741º, nº 5 do C. P. Civil, se no âmbito do incidente de comunicabilidade a dívida for considerada comum, o cônjuge do executado adquire a qualidade de executado e como tal, tem de lhe ser possível deduzir oposição à execução (e todos os demais direitos que a lei confere ao executado), independentemente da forma como foi invocada no processo a questão da comunicabilidade da dívida.
Conforme refere J. H. Delgado (in ob. cit., pág. 120) uma vez decidido o incidente de comunicabilidade, a dívida haja sido considerada comum, o cônjuge adquire o estatuto de parte principal, com poderes totalmente equiparados aos do executado, já que esta equiparação é reconhecida quando o cônjuge é citado na sequência da penhora de bens imóveis ou estabelecimento comercial, próprios do executado ou comuns, e o credor configurou a dívida como própria do executado (cfr, art. 787º, nº 1),
Acrescenta este Autor que a autonomização dos dois números do art. 787º apenas serve para tornar claro que, quando o exequente invocar a comunicabilidade da dívida, a recusa pelo cônjuge dessa comunicabilidade não tem a virtualidade de definir a responsabilidade patrimonial por essa dívida como própria daquele que a contraiu. Com efeito, no regime anterior, o art. 825º do C. P. Civil previa que se o cônjuge recusasse a comunicabilidade, a execução não poderia prosseguir contra ele.
Entendendo-se que, no caso em que a comunicabilidade da dívida é invocada em requerimento autónomo, o cônjuge do executado não pode deduzir oposição à execução, deixaria na disponibilidade do exequente a possibilidade (ou não) de o cônjuge do executado deduzir tal meio de defesa.
Parece-nos que a diferença de regimes entre o caso em que a comunicabilidade é invocada no requerimento executivo e aquela em que tal comunicabilidade apenas é alegada posteriormente em incidente autónomo (prevista no art. 741º, nº 3 do C. P. Civil), se prenderá, essencialmente, com razões de celeridade processual.
Efetivamente, sendo a questão da comunicabilidade invocada em requerimento autónomo, quando a execução já se encontra “em marcha”, a dedução de oposição ao incidente far-se-á de forma independente da eventual dedução de embargos à execução, já que a tramitação de um incidente processual, cujas regras se encontram previstas no art. 293 a 295º e seguintes, será mais célere que o processamento de uma oposição à execução mediante embargos de executado, desde logo porque o prazo para a oposição ao incidente é de 10 dias, enquanto os prazos para a dedução e para a contestação dos embargos são, respetivamente, de 20 dias contados da respetiva citação/notificação (v. art. 293º, nº 2 e nº 2 do art. 732º, ambos do C. P. Civil).
Na verdade, determinando a dedução do incidente de comunicabilidade da dívida, na pendência da execução, a suspensão da venda, quer dos bens próprios do cônjuge executado que já se mostrem penhorados, quer dos bens comuns do casal, até à decisão a proferir (v. art. 741º, nº 4 do C. P. Civil), justifica-se que de forma célere se decida que bens respondem pela dívida invocada na execução e, portanto, que bens poderão aí ser penhorados e vendidos (v. arts. 1695º e 1696º do C. Civil).
Contudo, como foi dito, tal não impedirá o cônjuge do executado de exercer os seus direitos de defesa por meio de embargos, invocando factos e questões diversas das alegadas na oposição ao incidente, devendo os embargos ser julgados extintos por inutilidade superveniente caso o incidente de comunicabilidade seja julgado improcedente.
Assim, o facto de a questão da comunicabilidade da dívida ter sido invocada em incidente autónomo não impede ao cônjuge do executado a dedução de oposição à execução mediante embargos, sendo que os fundamentos da oposição ao incidente têm de ser, obviamente, alegados, nesse incidente."
[MTS]