Embargos de executado;
compensação; requisitos*
I – A execução não pode ser suspensa com fundamento na pendência de causa prejudicial; com tal fundamento apenas pode ser suspensa a oposição à execução por embargos.
II – A compensação de créditos pode ser invocada na oposição à execução até ao limite do crédito exequendo, sem que seja necessário, para tanto, que o contracrédito invocado esteja judicialmente reconhecido; basta que estejam reunidos os requisitos materiais da compensação previstos no artigo 847.º do Código Civil.
2. Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:
"A suspensão da instância relativa aos embargos tem como pressupostos a existência da causa prejudicial (que todos admitem) e a possibilidade de invocar a compensação inerente àquela causa (que o Recorrente afasta, em síntese porque o crédito é litigioso e não está reconhecido).
No âmbito do art.729, h), do Código de Processo Civil (CPC), o que está em causa, a jurisprudência mostra-se dividida.
Entendemos que a solução interpretativa daquele, que se mostra mais ajustada, é a que está expressa no acórdão da Relação do Porto, de 18.1.2021 (proc.324/14, em www.dgsi.pt), apoiada pelo Prof. Teixeira de Sousa (Blog do IPPC, entrada de 22.3.2016).
Em síntese, são invocáveis os seguintes argumentos:
“Não pode deixar de causar alguma estranheza a exigência de que o contracrédito conste de um título executivo, atendendo a que a finalidade da invocação do contracrédito é a oposição à execução, e não a execução do contracrédito.”
O argumento (evitar que seja retardado o pagamento do crédito exequendo) “é apelativo, mas há que referir que, seguindo essa mesma orientação, então todas as causas de extinção do crédito exequendo deveriam constar não só de documento (para satisfazer a -- aliás, muito discutível -- exigência do art. 729.º, al. g), CPC), mas, além disso, de documento com valor de título executivo.”
“A exigência de que o contracrédito conste de um título executivo não é harmónica no contexto do art 729.º, dado que exige para uma das formas de extinção da obrigação um requisito que não é exigido para nenhuma outra forma de extinção do crédito exequendo.”
“A imposição de um ónus de alegação do contracrédito (mesmo não superveniente) nesse processo” (declarativo) “é contrariada por três razões retiradas do direito positivo:
“Em primeiro lugar, nada no disposto no art. 266.º, n.º 2, al. c), CPC (quanto à invocação da compensação por via de reconvenção) permite concluir que existe qualquer ónus de alegação desse contracrédito na acção pendente, sob pena de preclusão da alegação do contracrédito numa acção posterior; recorde-se que a regra é a de que a dedução de um pedido reconvencional é sempre uma faculdade do réu, nunca um ónus desta parte; aliás, compreende-se perfeitamente a inexistência desse ónus, dado que em parte alguma do sistema jurídico se encontra a regra de que o devedor tem de invocar o contracrédito contra um crédito específico do seu credor…;
“Em segundo lugar, resulta da comparação entre as al. g) e h) no art. 729.º CPC que, enquanto o facto extintivo ou modificativo que pode ser invocado com base na al. g), tem de ser posterior ao encerramento da discussão em 1.ª instância, esta exigência não é feita quanto à invocação do contracrédito; a proximidade da regulação dos regimes joga certamente no sentido de que a exigência que é feita na al. g) não pode ser estendida para a al. h); em reforço desta conclusão pode ainda argumentar-se com o disposto no art. 860.º, n.º 3, CPC; a oposição à execução com fundamento em benfeitorias não é admissível se estas já pudessem ter sido invocadas num anterior processo declarativo; pode assim afirmar-se que a lei define claramente os casos em que considera verificar-se a preclusão da alegação de um fundamento de oposição à execução, pelo que há que concluir que o regime legal aponta indiscutivelmente para que o contracrédito que pode ser invocado nos termos da al. h) não tem de ser posterior ao encerramento da discussão em 1.ª instância: a lei não o diz e o elemento sistemático da interpretação não só não corrobora essa exigência, como a contradiz;
“Finalmente, o disposto no art. 732.º, n,º 5, CPC permite concluir que, se o executado não alegar o contracrédito através dos embargos de executado, nunca mais o pode alegar para provocar a extinção do crédito exequendo (ou uma outra parcela do mesmo crédito que seja alegada numa execução posterior); portanto, onde realmente o direito positivo consagra um ónus de invocar o contracrédito é na acção executiva (para maiores desenvolvimentos sobre este ponto, cf. o paper divulgado em Paper (172)).
Em conclusão, o contracrédito reclamado (também) na causa que foi tida por prejudicial pode aqui ser considerado para efeitos da compensação pedida; sendo aquela uma causa prejudicial, como ninguém discute, e estando nós no incidente declarativo, é possível suspender esta instância."
*3. [Comentário] Para além do que se refere sobre a compensação como meio de oposição à execução (com o que se concorda...), o acórdão também é interessante por ter aceitado a suspensão dos embargos de executado sem ter admitido a suspensão da própria execução. Portanto, aquela suspensão não implica esta última suspensão -- o que também está correcto.
MTS