"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



05/06/2023

Jurisprudência 2022 (197)


Responsabilidade civil; nexo de causalidade;
matéria de facto; presunções judiciais


1. O sumário de RE 27/10/2022 (1431/20.5T8FAR.E1) é o seguinte:

I – Ao apreciarmos, à luz das regras da experiência comum, a narração factual respeitante à causa de um acidente, e extrairmos as ilações que esse circunstancialismo fático convoca, estamos também já a influenciar ou determinar a questão de direito. Tanto assim é, que na motivação da matéria de facto da decisão recorrida se considera que “a projeção se relaciona com a manobra de flexão e excesso de lotação de passageiros, aliada à ausência de cintos de segurança”, enquanto a Apelante, na impugnação da matéria de facto, defende que a projeção foi causada pelo excesso de velocidade do veículo e pela manobra de flexão.

II – Provado que os dois passageiros que seguiam acomodados sentados, num carro de golfe com lotação para duas pessoas, foram projetados no início da manobra de flexão efetuada pelo condutor para contornar a rotunda à esquerda, e não provado qualquer outro circunstancialismo de facto de onde resulte que aquele excesso de lotação de alguma forma influiu na condução do veículo, tendo os passageiros declarado que o condutor arrancou de forma repentina, acelerando, e desse modo imprimindo velocidade ao mesmo, e fletindo à esquerda alguns metros após, deve concluir-se, em face das regras da experiência comum, que só a velocidade imprimida e a manobra apertada à esquerda, desadequadas para o veículo e local, poderiam ter a força centrífuga necessária a projetar ambos os passageiros do veículo, como se mostra provado, impondo-se a modificação da matéria de facto.

III – Tendo presente a teoria da adequação, não havendo qualquer base factual comprovativa de que a circunstância de a Autora fazer a viagem juntamente com o condutor e outro passageiro, num veículo com lotação de dois lugares, tivesse concorrido para a produção do acidente e dos danos que sofreu, deve concluir-se que ainda que a entrada voluntária da Autora no carro, já com a lotação preenchida, tivesse atuado como condição da produção do evento danoso, a sua atuação sempre deixaria de ser considerada como causa adequada do acidente quando para a produção deste concorreram decisivamente as circunstâncias que podem qualificar-se como anormais ou extraordinárias, decorrentes da atuação do condutor do veículo, essa sim, determinante do acidente, não existindo concausalidade na produção do evento danoso, nem se justificando a decretada repartição de culpa.

IV - Assim, não vindo questionada a verificação dos demais pressupostos da obrigação de indemnizar, por força do contrato de seguro titulado pela apólice junta aos autos, a companhia de seguros é a responsável pela satisfação à lesada dos danos emergentes do evento danoso decorrente de culpa exclusiva do condutor do veículo segurado.


2. Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:

"Em face do disposto no artigo 483.º do CC “aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação".

Acresce que, nos termos genéricos do artigo 342.º do Código Civil [---], também afirmados a propósito da matéria referente à responsabilidade civil, no artigo 487.º, n.º 1, do mesmo diploma legal, ao autor (lesado) incumbe a prova dos factos constitutivos do direito invocado, no caso, “a culpa do autor da lesão”, apreciada, na falta de outro critério legal, pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso - n.º 2 do citado artigo 487.º - incumbindo, ao invés, à ré seguradora a prova de que o acidente ocorreu por culpa do lesado.

Ora, os pressupostos deste tipo de responsabilidade, designada por responsabilidade por factos ilícitos, agrupam-se num elenco de cinco, a saber: a) o facto; b) a ilicitude; c) a imputação do facto ao lesante; d) o dano; e) um nexo de causalidade entre o facto e o dano [---].

Como é evidente, a existência de um dano é condição essencial da obrigação de indemnizar: o facto ilícito e culposo tem que causar um prejuízo a alguém, o sofrimento de uma perda nos seus interesses patrimoniais ou mesmo não patrimoniais.

No caso, não se colocam dúvidas que os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pela autora foram causados pelo acidente.

É também sabido que o facto é ilícito quando viola um direito subjetivo de outrem, de natureza absoluta, ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios, como ocorre quando a norma violada protege interesses particulares, mas sem conceder ao respetivo titular um direito subjetivo, dependendo, então, a indemnização a arbitrar que a tutela dos interesses particulares figure, de facto, entre os fins da norma violada e que o dano se tenha registado no círculo de interesses privados que a lei visa tutelar [---].

Na espécie, e grosso modo, a matéria de facto alegada pela Autora relativamente à dinâmica do acidente quando submetida a julgamento, em ambas as instâncias, logrou revelar-se provada, salvo quanto ao facto de ter sido chamada pelo condutor, o que, conforme bem se considerou na decisão recorrida, é irrelevante, porquanto se trata de uma praticante de golfe experimentada que conhecia a lotação do veículo, cujo encosto, aliás, evidencia que é de 2 pessoas, tendo-se feito transportar no mesmo com outro passageiro e o condutor.

Na sentença recorrida considerou-se que o facto de condutor e lesada, bem sabendo daquela lotação do veículo, terem aceitado, aquele transportar e esta ser transportada no veículo, configurou a violação por ambos do disposto no artigo 54.º, n.º 3, do Código da Estrada, de acordo com cuja estatuição, "é proibido o transporte de pessoas em número que exceda a lotação do veículo ou de modo a comprometer a sua segurança ou a segurança da condução", ainda que com diversa medida da culpa.

Acontece que, para além da violação de norma legal, no tocante ao nexo de causalidade entre o facto e o dano, o artigo 563.º do CC, consagrou a doutrina da causalidade adequada, segundo a qual, na sua formulação positiva, para que um facto seja causa de um dano é necessário, antes de mais, que no plano naturalístico, ele seja condição sem o qual o dano não se teria verificado, e ainda que, em abstrato ou em geral, o facto seja causa adequada do dano; e, na sua formulação negativa, a condição deixa de ser causa do dano sempre que, segundo a sua natureza geral, a mesma era de todo indiferente para a produção do dano e só se tornou condição dele, em virtude de outras circunstâncias extraordinárias, sendo, portanto, inadequada para a ocorrência desse dano [---].

Já quanto à imputação do facto ao lesante, a responsabilidade civil pressupõe, em regra, a culpa, que se traduz numa determinada posição ou situação psicológica do agente perante o facto, consistindo, em sentido amplo, na referida imputação do facto ao agente [---], ou ainda num enquadramento normativo, entendido como a omissão da diligência que seria exigível ao agente medida de acordo com o padrão de conduta que a lei impõe [---], sempre apreciada, na falta de outro critério legal, pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso (artigo 487.º, n.º 2, do CC).

No caso vertente, a questão que o recurso convoca é, pois, a de saber se aquela comprovada conduta da autora pode ou não, no concreto circunstancialismo de facto em apreço, considerar-se como sendo, ainda que parcialmente, causal do acidente e imputável à mesma.

Para o efeito, importa ainda ter presente o artigo 563.º do CC que, sob a epígrafe “nexo de causalidade”, dispõe que “a obrigação de indemnizar só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”.

As partes dissentem quanto à medida em que tais danos são exclusivamente de imputar à conduta do condutor do veículo ou foram também causados pela conduta da lesada, ou seja, em que medida foi a atuação desta foi também causa do resultado.

VAZ SERRA [Citado por PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, in Código Civil Anotado, vol. I, 3.ª edição revista e atualizada, Coimbra Editora, 1982, pág. 547.], afirmava que “não podendo considerar-se como causa em sentido jurídico toda e qualquer condição, há que restringir a causa àquela ou àquelas condições que se encontrem para com o resultado numa relação mais estreita, isto é, numa relação tal que seja razoável impor ao agente responsabilidade por esse mesmo resultado. O problema não é um problema de ordem física ou, de um modo geral, um problema de causalidade tal como ser havido nas ciências da natureza, mas um problema de política legislativa: saber quando é que a conduta do agente deve ser tida como causa do resultado, a ponto de ser obrigado a indemnizar. Ora, sendo assim, parece razoável que o agente só responda pelos resultados, para cuja produção a sua conduta era adequada, e não por aqueles que tal conduta, de acordo com a sua natureza geral e o curso normal das coisas, não era apta para produzir e que só se produziram em virtude de uma circunstância extraordinária”.

Revertendo estas considerações ao caso em presença, verificamos que da factualidade provada apenas consta que, sendo a lotação do veículo de duas pessoas, o condutor (à esquerda) e um passageiro, no caso, para além deles, sentou-se ainda do lado direito deste, a autora. Nada mais consta na matéria de facto que respalde a influência da sobrelotação do veículo na ocorrência do evento.

Ora, tal como se ponderou no aresto do Tribunal da Relação do Porto [Proferido em 02.02.2014, no Proc.º n.º 2138.10.7TBPRD.P1.85, também disponível em www.dgsi.pt.], citado pela Recorrente, num caso em que num motociclo eram transportadas 3 pessoas, “não resulta da factualidade provada que o sinistro tenha sido causado pelo excesso de lotação ou pela circulação fora dos assentos. Desconhece-se a medida do excesso da tara do motociclo (…)”. Mas, mais, e tal como no nosso caso, “a dinâmica do sinistro não dá nota de qualquer desequilíbrio ou dificuldade na condução resultante do excesso de lotação do veículo. (…) Por outro lado, relativamente aos danos verificados, não existe factualidade provada que permita inferir que a violação da lotação do motociclo foi pelo menos concausal deles”, concluindo-se, pois, não dever tal circunstância ser relevada em sede de culpa do lesado. E este é o ponto crucial também na situação em presença, o qual, aliás, sempre se colocaria ainda que não tivesse sido modificada a matéria de facto nos termos sobreditos, tanto mais que na pág. 72 do Manual do Proprietário pode ler-se a referência a que se trata de 2 lugares padrão, não havendo sequer menção a peso máximo dos ocupantes do habitáculo, por exemplo.

Ainda com relevo a este respeito, o artigo 570.º, n.º 1, estatui que “quando um facto culposo do lesado tiver concorrido para a produção ou agravamento dos danos, cabe ao tribunal determinar, com base na gravidade das culpas de ambas as partes e nas consequências que delas resultaram, se a indemnização deve ser totalmente concedida, reduzida ou mesmo excluída”.

Como observa MÁRIO JÚLIO ALMEIDA COSTA [In Direito das Obrigações, 10ª edição, Almedina, pág. 782.], a formulação legal “afasta os actos do lesado que, embora constituindo concausa do dano, não mereçam um juízo de reprovação ou censura”. Por outras palavras, “a redução ou exclusão da indemnização só ocorre quando o prejudicado não adopte a conduta exigível com que poderia ter evitado a produção do dano ou o agravamento dos seus efeitos”.

BRANDÃO PROENÇA [Na sua dissertação de doutoramento intitulada “A Conduta do Lesado como Pressuposto e Critério de imputação do Dano Extracontratual, Almedina 1997, págs. 415 e 417.], afirma que esta norma do artigo 570.º «integra um princípio elementar de justiça, requerido pela própria consciência ético-jurídica, estatuindo, com naturalidade, determinadas consequências ligadas à repercussão patrimonial do dano para que concorreu a conduta “culposa” do lesado”», precisando mais adiante que “De acordo com a interpretação que fazemos do artigo 570º,...parece-nos mais coerente com a autonomia dogmática da “culpa” do lesado explicar o fundamento desse normativo recorrendo à ideia jurídica de uma auto-responsabilidade do lesado...no sentido de uma imputação das consequências patrimoniais decorrentes de opções livres que tomou e que se revelaram desvantajosas para os seus interesses, dada a sua aptidão auto­lesiva...Nem cremos incorrecto falar-se aqui de uma dupla imputação, ora de feição mais objectiva (a imputação danosa) ora de conteúdo mais pessoal (a imputação da conduta à acção livre e “culposa” do “lesado”».

Revertendo estas considerações para a concreta situação ajuizada não há qualquer base factual comprovativa de que a circunstância de a Autora fazer a viagem juntamente com o condutor e outro passageiro, num veículo com lotação de dois lugares, mas no qual, aparentemente sem constrangimentos para a segurança da condução, se acomodaram três pessoas, tivesse concorrido para a produção dos danos que sofreu.

Ao invés, tendo presente a acima referida teoria da adequação, ainda que a entrada voluntária da Autora no carro, já com a lotação preenchida, tivesse atuado como condição da produção do evento danos, a verdade é que a sua atuação sempre deixaria de ser considerada como causa adequada do acidente quando para a sua produção concorreram decisivamente as circunstâncias que podem qualificar-se como anormais ou extraordinárias, decorrentes da atuação do condutor do veículo, essa sim, determinante do acidente.

De facto, quando se aprecia o comportamento do condutor do veículo, que trabalhava no Club Car do Resort de Vale de Lobo, conhecendo as características do veículo desde 2006, e que, ainda assim, não apenas aceitou transportar mais um passageiro, como ainda arrancou de forma repentina, acelerando e imprimindo velocidade ao veículo, e alguns metros depois, efetuou uma manobra apertada de flexão à esquerda, tudo ao arrepio do que consta bem salientado nas regras de segurança específicas deste tipo de veículo, que comandam que não se efetue um arranque repentino porque enquanto o pedal do acelerador está premido o veículo acelera até à velocidade máxima, e também que se façam as curvas lentamente e sem brusquidão para não haver risco de capotamento, vemos que apenas a este comportamento é atribuível a ocorrência do evento danoso.

Perante este quadro, cremos efetivamente ser possível concluir que foi o condutor do buggy, que tinha a direção efetiva do veículo, e só ele, que mediante a realização das indicadas manobras deu causa ao acidente; sem tal conduta ilícita e culposa a autora não teria sofrido quaisquer danos, porque ia a ser transportada no assento do veículo junto com o outro passageiro, sem que se tenha demonstrado que esse facto da lesada tenha contribuído para qualquer uma daquelas manobras do condutor. Conforme bem notou a Apelante, “no que diz respeito à violação do artigo 54º, nº 3 do Código da Estrada, o responsável pela contra-ordenação sempre é o condutor do veículo, o qual tem o domínio efectivo do veículo e está obrigado a tomar todas as precauções para a segurança da circulação, não devendo, consequentemente, conduzir em circunstâncias que diminuam a segurança da circulação, para os utentes da via ou para as pessoas que transporte”, como fez este condutor.

Para além deste preceito atinente à lotação do veículo e, a nosso ver, mais determinantemente neste caso, estabelece ainda o artigo 24.º do Código da Estrada que “O condutor deve regular a velocidade de modo a que, atendendo à presença de outros utilizadores, em particular os vulneráveis, às características e estado da via e do veículo, à carga transportada, às condições meteorológicas ou ambientais, à intensidade do trânsito e a quaisquer outras circunstâncias relevantes, possa, em condições de segurança, executar as manobras cuja necessidade seja de prever e, especialmente, fazer parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente”.

Ora, «[o] conceito de velocidade excessiva, definido no art.24 nº 1 do CE, comporta duas realidades distintas: uma vertente absoluta (sempre que exceda os limites legais) e uma vertente relativa, a não adequação à situação concreta» [Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 29.03.2011, disponível in www.dgsi.pt.].

No caso em apreço, não se demonstrou concretamente a que velocidade seguia o condutor do veículo segurado na Ré, pelo que estamos perante a segunda das situações referidas, cuja verificação ocorreu, em concreto. E, perante o quadro factual acima descrito, não temos dúvida em afirmar que o acidente se ficou a dever única e exclusivamente à conduta contravencional do condutor do veículo segurado na Ré que, sabendo que transportava mais um passageiro, que não podia arrancar bruscamente e fazer manobras repentinas, não regulou a velocidade a que seguia nem no arranque, nem especialmente quando efetuou a flexão apertada à esquerda, que motivou a projeção dos ocupantes do veículo.

Assim, conforme se julgou inter alia no aresto do nosso mais Alto Tribunal de 17.10.2006, «sabido apenas que havia um objectivo excesso de lotação do veículo, porque aferido apenas pelo número de ocupantes da viatura, sem que, como dito, se possa estabelecer qualquer relação entre esse facto e as causas do acidente, que, face ao demonstrado, se ficaram a dever à actuação gravemente negligente do condutor, não pode, utilizando o enunciado critério, formular-se outro juízo que não seja o de que a circunstância de a vítima seguir no automóvel, no lugar que ocupava como passageiro, não ser causa adequada do evento danoso, por se não mostrar que tal favorecia ou modificava, elevando-os, os riscos de verificação do dano».

Nesta conformidade, os danos verificados no acidente devem ser considerados como consequência de factos exclusivamente imputáveis ao condutor do veículo, único responsável pela respetiva indemnização.

Ex abundantia, ainda se dirá que, pese embora não tenha sido convocada, a verdade é que, estando demonstrado que o veículo em causa, pertence ao Clube de Golfe do Empreendimento Turístico Vale do Lobo, pertencente à sociedade Vale do Lobo- Resort Turístico de Luxo, S.A, onde a Autora e o Sr. BB reservaram um tee-time no campo de golfe de 18 buracos daquele Clube de Golfe, incluindo um veículo de golfe, que era conduzido por um seu funcionário (factos provados 3, 4, 5, e 7), sempre funcionaria a presunção decorrente do n.º 3 do artigo 503.º do CC.

Preceitua a primeira parte desta norma que “aquele que conduzir o veículo por conta de outrem responde pelos danos que causar; salvo se provar que não houve culpa da sua parte”, significando que a presunção ali plasmada só é afastada se aquele que conduzia o veículo demonstrar que não houve culpa da sua parte.

Ademais, conforme notam PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA [In Código Civil Anotado, vol. I, 3.ª edição revista e atualizada, Coimbra Editora, 1982, pág. 486.], “na hipótese prevista na primeira parte do n.º 3, à responsabilidade do comissário, fundada na culpa, acresce a do comitente, baseada no risco (n.º 1)”.

Assim, em face da factualidade demonstrada, também por este fundamento, nunca seria possível concluir que o condutor do veículo tivesse conseguido demonstrar que não houve culpa da sua parte, antes pelo contrário.

Concluindo, diremos que, não vindo questionada a verificação dos demais pressupostos da obrigação de indemnizar, por força do contrato de seguro titulado pela apólice junta aos autos, a companhia de seguros é a responsável pela satisfação à lesada dos danos emergentes do evento danoso decorrente de culpa exclusiva do condutor do veículo cuja circulação estava devidamente segurada, já que nos termos do artigo 64.º, n.º 1, alínea a), do DL n.º 291/2007, de 21 de Agosto vigente à data do sinistro, as ações destinadas à efectivação da responsabilidade civil decorrente de acidente de viação, em caso de existência de seguro, devem ser deduzidas obrigatoriamente só contra a empresa de seguros, quando o pedido formulado se contiver dentro do capital mínimo obrigatório do seguro obrigatório, como acontece no caso dos autos.

Efetivamente, a responsabilidade extracontratual é uma responsabilidade pessoal, e não objetiva pela circulação de veículos ou de outras coisas e é sobre a pessoa responsável que recai o dever de indemnizar, daí que, o seguro de responsabilidade civil por acidente de viação, é sempre pessoal, apesar de destinado ao uso de certo e determinado veículo ou à sua direção efetiva, razão pela qual assenta na atuação ilícita ou com risco do respetivo condutor.

Consequentemente, e sem necessidade de ulteriores considerações, a seguradora ora Recorrida, encontra-se obrigada a satisfazer à lesada 100% dos danos decorrentes do acidente em causa, tal como reconhecidos na sentença recorrida, sendo procedente a apelação."

[MTS]