"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



03/07/2017

Jurisprudência (654)


Citação; requisitos;
apoio judiciário


1. O sumário de RP 6/3/2017 (2009/14.8TBPRD-B.P1) é o seguinte: 

Do ato de citação não tem que constar a advertência ao citando da necessidade de comprovar no processo judicial a apresentação de requerimento junto dos serviços da Segurança Social, a fim de lhe ser concedido apoio judiciário na modalidade de nomeação e pagamento da compensação de patrono e, por outro lado, que a interrupção do prazo em curso depende da observância do ónus de junção ao processo judicial do comprovativo de apresentação nos serviços da Segurança Social de requerimento de apoio judiciário na modalidade de nomeação e pagamento de compensação de patrono.

2. Na fundamentação do acórdão pode ler-se o seguinte:

Nos termos do disposto no nº 1, do artigo 219º do Código de Processo Civil, “[a] citação é o ato pelo qual se dá conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele determinada ação e se chama ao processo para se defender; emprega-se ainda para chamar, pela primeira vez, ao processo alguma pessoa interessada na causa.”

“A citação e a notificação são sempre acompanhadas de todos os elementos e de cópias legíveis dos documentos e peças do processo necessários à plena compreensão do seu objeto” (artigo 219º, nº 3, do Código de Processo Civil).

Os elementos obrigatoriamente transmitidos ao citando constam do artigos 227º do Código de Processo Civil, aí prevendo o seu nº 1 que “[o] ato de citação implica a remessa ou entrega ao citando do duplicado da petição inicial e da cópia dos documentos que a acompanhem, comunicando-se-lhe que fica citado para a ação a que o duplicado se refere, e indicando-se o tribunal, juízo e secção por onde corre o processo, se já tiver havido distribuição.”

“No ato de citação, indica-se ainda ao destinatário o prazo dentro do qual pode oferecer a defesa, a necessidade de patrocínio judiciário e as cominações em que incorre no caso de revelia” (artigo 227º, nº 2, do Código de Processo Civil).

Por força do disposto no nº 1, do artigo 24º da Lei nº 34/2004, de 29 de julho, o “procedimento de proteção jurídica é autónomo relativamente à causa a que respeite, não tendo qualquer repercussão sobre o andamento desta, com exceção do previsto no números seguintes.”

Ora, o nº 4 do normativo citado prevê que “[q]uando o pedido de apoio judiciário é apresentado na pendência de ação judicial e o requerente pretende a nomeação de patrono, o prazo que estiver em curso interrompe-se com a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento cm que é promovido o procedimento administrativo.”

Os normativos antes citados, pela sua simples literalidade, permitem-nos concluir, com toda a segurança, por um lado, que do ato de citação não tem que constar a advertência ao citando da necessidade de comprovar no processo judicial a apresentação de requerimento junto dos serviços da Segurança Social, a fim de lhe ser concedido apoio judiciário na modalidade de nomeação e pagamento da compensação de patrono e, por outro lado, que a interrupção do prazo em curso depende da observância do ónus de junção ao processo judicial do comprovativo de apresentação nos serviços da Segurança Social de requerimento de apoio judiciário na modalidade de nomeação e pagamento de compensação de patrono [...].

Pode suscitar-se a dúvida sobre a compatibilidade de tal ónus com a Constituição da República Portuguesa, nomeadamente se constitui ou não um ónus excessivo e desproporcionado [...].

O Tribunal Constitucional, por unanimidade, inicialmente [Assim, vejam-se os seguintes acórdãos do Tribunal Constitucional, acessíveis no site deste tribunal: de 11 de fevereiro de 2004, acórdão nº 98/04 [...], acórdão nº 57/06 [...] (estes acórdãos tiveram em conta o nº 4, do artigo 25º da Lei nº 30-E/2000, de 20 de dezembro, com redação idêntica ao do nº 4, do artigo 24º da Lei nº 34/2004, de 29 de julho); já sobre o nº 4, do artigo 24º da Lei nº 34/2004, de 29 de julho, veja-se o acórdão nº 350/2016, de 07 de junho de 2016 [...]; nos tribunais comuns, também neste sentido vejam-se o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça citado na nota que antecede [processo nº 1588/09.6TBVNG-A.P1.S1] e o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 30 de junho de 2016 [...],  processo nº 18220-13.6YYLSB-A.L1-8 e acessível na base de dados da DGSI] e ultimamente por maioria [Assim, veja-se o acórdão nº 585/16 de 03 de novembro de 2016 [...]], vindo a concluir pela conformidade desse ónus com a Constituição da República Portuguesa.

De facto, independentemente dos conhecimentos jurídicos de que disponha, qualquer cidadão tem a perceção de que correndo um processo contra si e tendo-lhe sido assinado um prazo para a apresentação da sua defesa, bem como da obrigatoriedade de constituição de mandatário judicial, tem de dar conhecimento aos autos das diligências que encetou para neles se defender e de que esse efeito tem prazos a observar [...]. Acresce que no caso, o próprio requerimento de proteção jurídica, imediatamente antes da assinatura do requerente, contém essa advertência.

Se é certo que outro sistema poderia ser implementado, mais cómodo para o cidadão, como seja a comunicação direta da Segurança Social ao tribunal, certo é que esta matéria do processo de comunicação da dedução do requerimento de proteção jurídica ao processo judicial para que é requerida, ainda cabe nos poderes de conformação do legislador ordinário, sem que isso atente contra o direito fundamental de acesso ao direito. Cremos até que o legislador terá sido sensível a alguma ineficiência dos serviços da Segurança Social nas comunicações no âmbito do apoio judiciário, realidade diariamente retratada nos processos, optando pela imposição desse ónus ao interessado direto e por parte de quem por isso será de esperar maior diligência.

A interpretação da imposição do ónus ao requerente de proteção jurídica de juntar ao processo judicial o comprovativo da apresentação do requerimento de proteção jurídica, não exclui a possibilidade de o mesmo se considerar observado se acaso essa comunicação e comprovação chega ao processo, em tempo útil, isto é em termos de poder operar a interrupção do prazo que esteja em curso."

 
[MTS]