Intervenção de terceiros;
admissibilidade
I. O sumário de RC 12/3/2019 ( 325/18.9T8CBR-B.C1 (inédito)) é o seguinte:
1. O incidente de intervenção de terceiros pressupõe que o interveniente se associe a uma das partes e exige que se verifique uma certa relação litisconsorcial e que o interveniente tenha, em relação ao objecto da causa, um interesse igual ao do autor ou do réu (art.º 316º do CPC).
2. Tem o autor chamante para intervenção principal do lado passivo o ónus de indicar a causa do chamamento e de alegar/justificar o interesse que através dele pretende acautelar, sendo que a admissão da intervenção do chamado ao lado do réu não depende do conhecimento de mérito da responsabilidade do chamado, bastando averiguar se este tem ou não interesse em contradizer.
3. In casu, advindo a legitimidade passiva do interesse directo em contradizer e consistindo este no prejuízo resultante da procedência da acção (art.º 30º do CPC), não se vislumbra qual seria o interesse do chamado em ser demandado como litisconsorte, dado que esse interesse não existe, pois o Estado ou apenas o Ministério [...] não é litisconsorte necessário ou voluntário na relação entre o A. e a Ré [...], quer ao lado do A., quer ao lado da Ré - não são partes no contrato de gestor celebrado entre A. e Ré, nem titulares de qualquer interesse com ele conexo.
II. Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:
I. A instaurou, no Tribunal da Comarca [...] (Juízo Central Cível), acção de processo comum contra B, pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe a
indemnização de € 59 796,56 e respectivos juros moratórios desde a data da
exoneração efectiva em 13.4.2016 até integral pagamento, alegando, em síntese, que
era membro do Conselho de Administração da Ré, que veio a ser dissolvido com
fundamento em critérios de mera conveniência de serviço e determinando-se que a
resolução produzia efeitos a 25.3.2016, sendo certo que o Ministério [...]
alterou a data da resolução do Conselho de Ministros em que supostamente ocorreu a
correspondente deliberação, de forma a não ser paga ao A. a indemnização devida.
A Ré contestou e suscitou a “chamada à demanda” do Ministério [...],
que a tutela, invocando o DL n.º 71/2007, de 27.3 – Estatuto do Gestor Público –,
nos termos do qual as nomeações dos membros dos Conselhos de Administração [...], bem como as exonerações são feitas por resolução do Conselho de
Ministros [...]
II. [...] 2. Cumpre apreciar e decidir com a necessária concisão.
Ocorrendo preterição de litisconsórcio necessário, qualquer das partes pode
chamar a juízo o interessado com legitimidade para intervir na causa, seja como seu
associado, seja como associado da parte contrária (art.º 316º, n.º 1 do CPC, sob a
epígrafe “âmbito” da intervenção principal provocada). Nos casos de litisconsórcio
voluntário, pode o autor provocar a intervenção de algum litisconsorte do réu que
não haja demandado inicialmente ou de terceiro contra quem pretenda dirigir o
pedido nos termos do artigo 39º (n.º 2). O chamamento pode ainda ser deduzido por
iniciativa do réu quando este: a) Mostre interesse atendível em chamar a intervir
outros litisconsortes voluntários, sujeitos passivos da relação material
controvertida; b) Pretenda provocar a intervenção de possíveis contitulares do
direito invocado pelo autor (n.º 3).
3. Nos termos do referido normativo da lei processual civil, só ocorrendo
preterição de litisconsórcio necessário, qualquer das partes pode chamar a juízo o
interessado com direito a intervir na causa seja como seu associado, seja como
associado da parte contrária.
Além disso e facultativamente, o chamamento pode ainda ser deduzido por
iniciativa do Réu quando este mostre interesse atendível em chamar a intervir outros
litisconsortes voluntários, sujeitos passivos da relação material controvertida (n.º 3,
alínea a)), ou pretenda provocar a intervenção de possíveis contitulares do direito
invocado pelo autor (n.º 3, alínea. b)).
A intervenção na lide de alguma pessoa como associado do réu pressupõe um
interesse litisconsorcial no âmbito da relação controvertida (relação litisconsorcial), cuja medida da sua viabilidade é limitada pela latitude do accionamento operado pelo
autor, não podendo intervir quem lhe seja alheio. Pressupõe que o chamado e a parte
à qual pretende associar-se tenham interesse igual na causa.
Por outro lado, o autor do chamamento deve alegar a causa respectiva e
justificar o interesse que, por meio dele, visa conseguir – assim, tem o autor
chamante para intervenção principal do lado passivo o ónus de indicar a causa do
chamamento e de alegar o interesse que através dele, pretende acautelar, sendo que a
admissão da intervenção do chamado ao lado do réu não depende do conhecimento
de mérito da responsabilidade do chamado, bastando averiguar se este tem ou não
interesse em contradizer.
4. Na contestação, a Ré limitou-se a invocar a legislação relativa aos gestores
públicos e que a mesma determina que as nomeações dos membros dos Conselhos de
Administração [...], bem como as exonerações sejam feitas por
resolução do Conselho de Ministros [...].
Ou seja, a Ré/requerente nada alega relativamente ao interesse que visa
salvaguardar com o chamamento, nem demonstra que o chamado esteja
relativamente à causa, tal como é configurada pelo A., numa das situações previstas
no art.º 311º do CPC, ou seja, seja titular de um interesse igual ao do réu.
Ademais, a única ligação que o requerido/chamado tem com o litígio é a de
ter procedido à destituição do A. do Conselho de Administração da Ré.
Advindo a legitimidade passiva do interesse directo em contradizer e
consistindo este no prejuízo resultante da procedência da acção (art.º 30º do CPC), não se vislumbra qual seria o interesse do chamado em ser demandado como
litisconsorte, dado que esse interesse não existe - o Estado ou apenas o Ministério [...] não é litisconsorte necessário ou voluntário na relação entre o A. e a Ré, quer
ao lado do A., quer ao lado da Ré; o Estado ou apenas o Ministério [...] não são
partes no contrato de gestor celebrado entre A. e Ré, nem titulares de qualquer
interesse com ele conexo. [...]
6. E ante a previsão do n.º 3 do art.º 316º do CPC - a de haver um interesse
atendível da Ré em chamar o Estado ou apenas o Ministério [...] -, situação que
pressupõe que o Estado ou apenas o Ministério [...] sejam ao menos
litisconsortes passivos (alínea a)) ou contitulares do direito invocado pelo autor
(alínea b)), já se viu que estes não são litisconsortes com a Ré e não foi contra eles
dirigido qualquer pedido, e também se conclui que o Estado ou apenas o Ministério
[...] não são contitulares juntamente com o A. do direito por ele invocado.
7. Falece, assim, a hipótese de qualquer interesse atendível, por falta do
requisito subjectivo legalmente exigido para o interveniente e, como é evidente,
também não foi requerida e justificada qualquer outra forma de intervenção."
[MTS]