Custas de parte;
recurso de revista*
I - A decisão de condenação em custas de acordo com os critérios de causalidade/vencimento e proveito/decaimento na acção previstos no art. 527.º, n.os 1 e 2, do CPC é complemento e parte integrante do dispositivo relativo ao julgamento da acção (art. 607.º, n.º 6, do CPC) e assume autonomia material quando decide a questão da responsabilidade pelas custas processuais (no caso, só as “custas de parte”: arts. 529.º, n.os 1, in fine, e 4, e 533.º do CPC, 26.º, n.os 1 e 2, do RCP). Por isso, a “decisão condenatória” em sede de pagamento de custas a que se refere o art. 527.º, n.º 1, recai igualmente no conceito amplo de «mérito da causa», uma vez que é parte integrante, ainda que independente, da decisão material final que coloca termo ao litígio.
II - O recurso de revista de acórdão da Relação que aprecie tal decisão proferida pela 1.ª instância é admissível para apreciação por parte do STJ se e na medida em que a enquadremos no art. 671.º, n.º 1, do CPC, que permite a revista para as decisões materialmente finais da Relação que conheçam do mérito da causa ou que coloquem termo ao processo em sede processual, desde que preenchido o pressuposto geral de recorribilidade contemplado no art. 629.º, n.º 1, do CPC.
2. Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:
"8. Na sequência do despacho reclamado, a questão que se apresenta para decisão é saber se deveria ter sido admitido ou não o recurso de revista do acórdão proferido pela Relação ….., atentos os pressupostos de admissibilidade, gerais e especiais, da revista.
Em causa a decisão proferida pela 1.ª instância, ao abrigo da imposição do art. 607º, 6, do CPC («No final da sentença, deve o juiz condenar os responsáveis pelas custas processuais, indicando a proporção da respectiva responsabilidade.»), em aplicação dos critérios do art. 527º do mesmo CPC.
O despacho ulterior de rectificação, proferido ao abrigo dos poderes atribuídos pelos arts. 613º, 2, e 614º, 1, do CPC, considera-se parte constitutiva (neste caso, substitutiva por integração) da sentença rectificada, no segmento decisório relativo à condenação em custas (por analogia com o art. 617º, 2, do CPC[...]).
9. Foi referido no despacho reclamado e reitera-se:
“O art. 629º, 1, do CPC determina que: «O recurso ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal (…)».Este preceito impõe que, enquanto condição geral de recorribilidade das decisões judiciais, a admissibilidade do recurso ordinário esteja dependente da verificação cumulativa destes dois pressupostos jurídico-processuais: (i) o valor da causa tem de exceder a alçada do tribunal de que se recorre; (ii) a decisão impugnada tem de ser desfavorável para o recorrente em valor também superior a metade da alçada do tribunal que decretou a decisão que se impugna. Tal significa que os requisitos previstos no art. 629º, 1, do CPC são cumulativos e indissociáveis (em rigor, um duplo requisito) e a observância do primeiro deles – “valor da causa” – precisa da averiguação (se possível: 2.ª parte do preceito) do segundo – “valor da sucumbência” – para, ainda que a título complementar[...], completar o requisito de admissibilidade[...].
Em matéria cível, a alçada dos tribunais da Relação é de € 30.000,00 (art. 44º, 1, da L 62/2013, de 26 de Agosto), anotando-se que a admissibilidade dos recursos por efeito das alçadas é regulada pela lei em vigor ao tempo em que foi instaurada a acção (n.º 3 desse art. 44º).No caso, a causa tem um valor processual, fixado pelo juiz de 1ª instância na sentença (art. 306º, 1 e 2, 297º, 1, CPC), de € 250.000 – logo, manifestamente superior a € 30.000,00, alçada do tribunal (da Relação) recorrido.Quanto à sucumbência sofrida pela parte vencida na decisão, deveria ser avaliada, uma vez interpretada de acordo com o critério fixado pelo Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do STJ, de 14/5/2015 (AUJ n.º 10/15)[...] (“diferença entre os valores arbitrados na sentença de 1.ª instância e no acórdão da Relação”), tendo em conta a diferença/perda entre o valor arbitrado na 1ª instância e o valor resultante da decisão proferida pelo acórdão da Relação. Neste caso, a perda seria o montante a constar da nota discriminativa e justificativa das “custas de parte” a serem reembolsadas em virtude da condenação da parte contrária (arts. 529º, 4, 533º CPC; 25º, 1 e 2, 26º-A, RCP; 31º, 1, 33º, 1 e 4, Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de Abril), montante esse cuja responsabilidade pelo pagamento era excluído pela decisão de isenção de custas da 1.ª instância. Acontece, porém, que, tal como se reconhece no acórdão recorrido, esse montante não está comprovadamente quantificado na tramitação processual e no objecto recursivo da decisão recorrida da Relação. Não estamos, portanto, em condições de aferir com exactidão o valor indicado pela parte apelante, e agora Recorrida, no ponto 21. das suas Conclusões em apelação. Razão pela qual não se pode atender ao requisito complementar imposto pelo art. 629º, 1, 1.ª parte do CPC, por impossibilidade de verificar o decaimento entre o resultado declarado pelo despacho de rectificação da sentença e o resultado declarado no acórdão recorrido e, assim, atendendo só ao valor da causa (2.ª parte do art. 629º, 1, do CPC), o recurso seria admissível”.
Por outro lado.
10. A impugnação recursiva corresponde a revista de acórdão da Relação que incidiu sobre a sentença de 1.ª instância, integrada/rectificada pelo despacho superveniente de modificação do segmento decisório de condenação em custas. Logo, a questão recursiva submetida pelo crivo da revista interposta incide sobre o acórdão da Relação mas apenas, só e exclusivamente, se circunscreve à decisão de condenação em custas proferida pela 1.ª instância e reapreciada pelo acórdão da Relação (v. art. 635º, 2, do CPC: «Se a parte dispositiva da sentença contiver decisões distintas, é igualmente lícito ao recorrente restringir o recurso a qualquer delas, uma vez que especifique no requerimento a decisão de que recorre.»), ainda que tal decisão tenha assumido a sua versão recorrida depois de corrigida por despacho judicial superveniente.
Este segmento decisório é complemento e parte integrante do dispositivo relativo ao julgamento da acção (art. 607º, 6, CPC) e assume autonomia material quando decide da questão da responsabilidade pelas custas processuais de acordo com os critérios de causalidade/vencimento e proveito/decaimento na acção previstos no art. 527º, 1 e 2, do CPC[ V. SALVADOR DA COSTA, “Responsabilidade pelas custas no recurso julgado procedente sem contra-alegação do recorrido”, Blog do IPPC (https://blogippc.blogspot.com/search/label/Notas; https://drive.google.com/file/d/1AUCq7fmuDEcJjTOH7adY2whdoybrxrEY/view), pág. 3.] (no caso, só as “custas de parte”: arts. 529º, 1, in fine, 4, 533º, CPC, 26º, 1 e 2, RCP). Por isso, a “decisão condenatória” em sede de pagamento de custas a que se refere o art. 527º, 1 (excluída a «taxa de justiça»: art. 529º, 2 [Assim, SALVADOR DA COSTA, As custas processuais – Análise e comentário, 7.ª ed., Almedina, Coimbra, 2018, págs. 7-8]), recai igualmente no conceito amplo de «mérito da causa», uma vez que é parte integrante, ainda que independente, da decisão material final que coloca termo ao litígio [V. RUI PINTO, Notas ao Código de Processo Civil, Volume II, Artigos 546.º a 1085.º, 2.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, sub art. 671º, págs. 174-175].
Assim sendo, ao invés do sustentado no despacho reclamado, a decisão recorrida é impugnável em sede de revista no âmbito do art. 671º, 1, do CPC, que enquadra a revista para as decisões finais da Relação que conheçam do mérito da causa ou que coloquem termo ao processo.
Sendo este o fundamento do Recorrente, e cumprido o art. 629º, 1, do CPC, nos termos sobreditos, deve ser admitido o recurso."
*3. [Comentário] Salvo o devido respeito, parece difícil entender que a decisão sobre as custas de parte possa ser integrada no "conceito amplo de «mérito da causa»".
*3. [Comentário] Salvo o devido respeito, parece difícil entender que a decisão sobre as custas de parte possa ser integrada no "conceito amplo de «mérito da causa»".
Ainda assim, mais seguro é que o valor da causa não se transmite à decisão sobre o valor das custas para efeito de recorribilidade para o STJ. Aliás, de outra forma mal se compreende o disposto no art. 26.º-A, n.º 3, RCP: "Da decisão proferida [sobre reclamação da nota justificativa] cabe recurso em um grau se o valor da nota exceder 50 UC."
MTS