Coligação;
valor da causa; recurso
I- As retribuições vincendas pedidas numa ação de impugnação de despedimento não tem qualquer influência na fixação do valor da causa que deve ser determinado atendendo aos interesses já vencidos no momento em que a ação é proposta;
II- Numa situação de coligação ativa de Autores, ainda que a mesma possa decorrer de decisão de apensação de ações individualmente interpostas, as mesmas conservam a sua individualidade face aos pedidos suportados em causas de pedir que, por cada um daqueles, tenham sido formulados nas respetivas ações, pelo que o valor da causa a atender para efeitos de alçada é o de cada uma das ações coligadas e não o correspondente à soma do valor de todas elas;
III- A norma constante do art.º 629.º n.º 1 do CPC, que limita o direito ao recurso em função do valor da causa não enferma de inconstitucionalidade.
2. Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:
"Estamos, nestes autos, perante uma situação de coligação voluntária ativa de 6 (seis) Autores [inicialmente eram 13 (treze)], pelo que o valor da causa a atender para efeitos de alçada é o de cada uma das ações coligadas e não a soma do valor de todas elas.
Este Supremo Tribunal tem, aliás, vindo a afirmar, de uma forma uniforme, que, traduzindo-se a coligação voluntária ativa na cumulação de várias ações conexas que não perdem a respetiva individualidade, para aferição dos requisitos de recorribilidade há que atender ao valor de cada um dos pedidos e não à sua soma. Veja-se, por todos, o acórdão proferido em 01 de setembro de 2016 no processo n.º 2653/13.0TTLSB.L1.S1, acessível em www.dgsi.pt.
Outrossim, tal como é referido pela doutrina, «a coligação traduz-se praticamente na cumulação de várias ações conexas» (Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, 1.º vol., p. 99), «visto que os autores se juntam, não para fazerem valer a mesma pretensão ou para formularem um pedido único, mas para fazerem valer, cada um deles, uma pretensão distinta e diferenciada» (Alberto dos Reis, Comentário ao Código de Processo Civil, 3.º vol., p. 146) e, assim, «na coligação à pluralidade das partes corresponde a pluralidade das relações materiais litigadas» (Antunes Varela, Manual de Processo Civil, 1985, p. 161).
Deste modo, há de ser em função do valor de cada uma das ações cumuladas que deverá ser decidida a admissibilidade do recurso interposto relativamente à correspondente matéria, sendo de referir ainda que, como também já decidiu este Supremo Tribunal de Justiça em acórdão de 22 de junho de 2017, proferido no processo n.º 602/12.2TTLMG.C1.S1 e igualmente acessível em www.dgsi.pt, «as retribuições vincendas pedidas numa ação de impugnação de despedimento não tem qualquer influência na fixação do valor da causa que deve ser determinado atendendo aos interesses já vencidos no momento em que a ação é proposta».
Ora, tendo presentes estas considerações e reportando-nos à situação dos autos, verifica-se que a sentença proferida pelo Tribunal da 1ª instância, fixou, efetivamente, à causa o valor de € 97.454,09.
No entanto, correspondendo o valor da ação (para efeitos de determinação da alçada do tribunal) “à utilidade económica imediata do pedido” (art.º 296º, nºs 1 e 2 do CPC) e sabendo-se que, de acordo com o disposto no art. 299º do mesmo diploma, «na determinação do valor da causa, deve atender-se ao momento em que a ação é proposta, exceto quando haja reconvenção ou intervenção principal», verifica-se que o valor dos pedidos formulados por cada um dos Autores, individualmente considerados, é inferior a € 30.000,00.
Na verdade, verifica-se que:
- Na ação em que é Autora CC foi indicado na petição inicial o valor de € 14.119,31;- Na ação em que é Autora AA foi indicado na petição inicial o valor de € 2.459,15;- Na ação em que é Autor FF foi indicado na petição inicial o valor de € 21.528,67;- Na ação, em que é Autora DD foi indicado na petição inicial o valor de € 17.163,19;- Na ação em que é Autor BB foi indicado na petição inicial o valor de € 19.044,09;- Na ação em que é Autora EE foi indicado na petição inicial o valor de € 16.962,05.
Ora, como se afirma no acórdão desta Secção de 02 de fevereiro de 2005, proferido no processo 04S4563 e, também ele, acessível em www.dgsi.pt, no caso de coligação ativa voluntária, a cumulação «(…) não determina a perda da individualidade de cada uma das respetivas ações, não obstante se encontrarem inseridas no mesmo processo», pelo que, «os recursos das decisões (ou da decisão final) só serão admissíveis se e na medida em que os mesmos fossem admissíveis se processados em separado». É que, tal como também se afirma no já citado acórdão proferido em 01 de setembro de 2016 no processo n.º 2653/13.0TTLSB.L1.S1, «se se devesse atender à soma dos pedidos para efeitos de admissibilidade do recurso, estaria encontrada a forma de aceder sempre ao Supremo Tribunal de Justiça, mesmo quando o valor dos pedidos, se formulados em ações separadas, o não permitisse. Bastaria os autores coligarem-se e intentarem apenas uma ação».
O valor da alçada do Tribunal da Relação está fixado em € 30.000,00 de acordo com o disposto no n.º 1 do art.º 44.º da Lei da Organização do Sistema Judiciário aprovada pela Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto.
Nos termos do n.º 1 do art.º 629.º do Código de Processo Civil: «o recurso ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal, atendendo-se, em caso de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, somente ao valor da causa».
De acordo com o estipulado neste último preceito, basta que se não verifique qualquer um dos pressupostos de natureza cumulativa aí previstos para que o recurso não seja admissível.
Já o n.º 2 do mesmo normativo legal prevê as situações em que é sempre admissível recurso, independentemente do valor da causa e da sucumbência, situações que, todavia, no caso em apreço, se não verificam.
Deste modo e pelas razões expostas, os recursos de revista interpostos pelos Recorrentes são legalmente inadmissíveis, uma vez que o valor de cada uma das ações coligadas não é superior ao valor da alçada do Tribunal de que se recorre, e porque, por outro lado, não têm por fundamento qualquer das situações previstas no n.º 2 do artigo 629.º do Código de Processo Civil."
*3. [Comentário] O acórdão do STJ decidiu bem uma matéria na qual existem, por vezes, algumas confusões.
MTS