"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



14/02/2024

Jurisprudência 2023 (108)


Despacho de citação;
caso julgado formal; boa fé*


1. O sumário de STJ 16/5/2023 (972/17.6T8VVD.1.G1.S1) é o seguinte:

I- Em incidente de liquidação pós-sentença, o despacho que ordena a citação do R. não implica necessariamente a formação de caso julgado.
Com efeito,

II- O despacho que ordena a citação tem, em regra, natureza tabelar, supondo uma leitura que não atinge o rigor de outros despachos de conteúdo decisório, sendo certo que este tribunal vem entendendo que os despachos tabelares não constituem caso julgado formal.

III- Além disso, o despacho que ordena a citação não tem um carácter de fixidez da relação processual, visto que nada obsta a que em momento ulterior o R. possa ser absolvido da instância e que, mediante certas circunstâncias possa o A. apresentar articulados supervenientes (artigos 588º e 589º. CPC) ou aditar/modificar o pedido ou a causa de pedir, nos termos consentidos pela lei (artigo 265º CPC).

IV- Aliás, prevê-se expressamente que, em despacho ulterior, mediante estudo mais rigoroso e informado, seja possível conhecer de questões não conhecidas no despacho liminar (artigo 590º/1 CPC), como sucede, por exemplo, findos os articulados, na fase pré-saneador, quando se providencia pelo suprimento de exceções dilatórias (artigo 590º/2 CPC).

V- Enfim, ao ordenar-se a citação, nota-se ter sido cometido lapso de escrita, por ausência de “propriedade de linguagem, já que, estando apenas em causa a renovação da prévia instância declarativa, onde o ali e aqui Réu já fora citado, deveria o mesmo ser apenas notificado; e, tendo mandatário judicial constituído naqueles autos, sem que houvesse notícia da cessação do respectivo mandato, na pessoa do mesmo” (artigos 358.º/2 e 247/1 CPC).

VI- Não ocorre violação dos direitos de defesa do R., a quem, nestas circunstâncias, ao ser notificado pela secretaria, na pessoa do seu ilustre mandatário, é explicitada a finalidade da notificação e o prazo para a prática do ato e respetiva cominação.

VII- Baseando o recorrente as demais pretensões formuladas na ocorrência de caso julgado formal que se considera não verificado, naturalmente que o conhecimento dessas questões fica prejudicado."


2. Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:

"O recorrente sustenta que o despacho de citação transitou em julgado e que, por não ter sido levada em consideração essa realidade, houve preterição dos direitos de defesa.

Da argumentação do recorrente destaca-se a circunstância de que: “em 08.02.2021, [foi] proferido despacho com a referência ...78, o qual admitiu incidente deduzido pelos autores aqui recorridos e se ordenou que, passa-se a citar: «cite-se o autor para, querendo, o contestar, de acordo com o disposto pelas disposições conjugadas dos artº 360º nº 3, 293º e 294º do CPC» – (onde se diz autor queria naturalmente dizer-se Réu).

Este despacho veio a ser reiterado em 11.05.2021, ao ordenar-se que: “Cumpra-se o despacho de 8 de Fevereiro de 2021 relativamente ao requerimento aperfeiçoado (liquidação) entrado sob a ref.ª ...62.”.

Segundo o recorrente, foram abalados os princípios da legalidade e do exercício pleno do contraditório. Incide a argumentação em que, tendo transitado, não podia o acórdão, agora recorrido, alterar tal matéria de exceção ex officio, com violação do caso julgado formal, previsto no artigo 620.º do CPC, na medida em que o Tribunal no mesmo processo, com as mesmas partes e reportando-se aos mesmos factos, verificados e atendidos já na primeira decisão, que não foram objecto de recurso pelas partes, volta a decidir sobre a mesma questão.

Pronuncia-se no sentido de que, por força do disposto no artigo 625.º/ 1 e 2, do CPC, deve prevalecer o despacho proferido em 08.02.2021 (isto é, o despacho que ordenou a citação). [...]

Da tramitação processual relevante, retirada do precedente relatório, destaca-se, em resumo, que:

1. Estamos no âmbito de um incidente de liquidação pós sentença.

2. Convidados por despacho, os AA. vieram aperfeiçoar o requerimento inicial.
 
3. Em 08 de Fevereiro de 2021, foi proferido despacho, no qual se disse nomeadamente que: “Admito o incidente de liquidação deduzido pelos autores. Cite-se o autor para, querendo, o contestar, de acordo com o disposto pelas disposições conjugadas dos artigos 360, n.º 3, 293º e 294º, todos do CPC”.

4. Na notificação deste despacho (datada de 09.02.2021) consta nomeadamente que: «(…) Assunto: Notificação para oposição à liquidação.
 
5. Fica notificado, na qualidade de Mandatário, relativamente ao processo supra identificado, para no prazo de 10 dias deduzir oposição, querendo, ao incidente de liquidação, sob pena de, não o fazendo se considerarem confessados os factos articulados pelo Autor. Enviam-se os duplicados legais. (…)».

6. Em 04 de Junho de 2021, o R. veio pedir para ser citado nos autos, por só assim considerar ser dado cumprimento ao despacho de 08 de fevereiro de 2021.
 
7. Em 8 de Junho de 2021, foi proferido despacho de indeferimento desta pretensão [..]”.

8. Em 15 de junho de 2021, o R. veio arguir a nulidade deste despacho. Alegou, em síntese, que, tendo o incidente de liquidação sido deduzido depois de finda a ação declarativa, cumpria citá-lo pessoalmente e não apenas notificá-lo na pessoa do seu mandatário judicial.

9. Os AA. pronunciaram-se pela improcedência da arguição de nulidade.
 
10. Em 05 de Outubro de 2021, foi proferido despacho que indeferiu a pretensão, com base, fundamentalmente em que não se deteta “no despacho proferido em 08.06.2021, nenhuma das nulidades previstas no artigo 615.º, n.º 1, alíneas a) a e) do CPC aplicável ex vi do artigo 613.º, n.º 3 do mesmo diploma legal. (…)” .

11. O R. recorreu dos despachos de 08 de Junho de 2021 (indeferimento do pedido de citação pessoal) e de 05 de Outubro de 2021 (indeferimento da arguição de nulidade do mesmo despacho), o que o Tribunal a quo admitiu.
 
12. Em 18 de março de 2022, foi proferido despacho, considerando confessados os factos alegados pelos AA, dele constando nomeadamente que:  «(…) o réu foi notificado no âmbito do presente incidente de liquidação e não apresentou oposição.  Nessa conformidade, consideram-se confessados os factos articulados pelos autores no requerimento inicial e no articulado de aperfeiçoamento junto com a ref. Citius ...62, nos precisos termos previstos no artigo 567.º, n.º 1 do Código de Processo Civil. Cumpra-se o disposto no artigo 567.º, n.º 2 do CPC. (…)».

13. Em 18 de Julho de 2022, foi proferia sentença, julgando o incidente de liquidação totalmente procedente.

Vem invocado o caso julgado. Entende-se que só pode ser equacionado o caso julgado formal do despacho que ordenou a citação. Trata-se de um despacho que incide sobre a relação processual e, por conseguinte, como é pacífico, produz apenas efeitos circunscritos ao processo a que diz respeito (artigo 620º/1, CPC).

Todavia, o percurso dos autos acima transcrito revela a sem razão do R., ao pretender que, neste incidente de liquidação pós-sentença, o despacho de citação formou caso julgado.

Com efeito,

Ao contrário do por ele afirmado, a circunstância de se ter ordenado a citação não implica necessariamente a formação de caso julgado.

Antes de mais, importa ter presente que o despacho que ordena a citação tem, em regra, natureza tabelar, supondo uma leitura que não atinge o rigor de outros despachos de conteúdo decisório.

No sentido de que os despachos tabelares não constituem caso julgado formal decidiu este Tribunal em acórdão de 23.03.2021, no qual se entendeu: “É insusceptível de constituir caso julgado formal o segmento do despacho em que se refere, de modo genérico e tabelar, que a ré foi regularmente citada”  [Processo n.º 2551/18.1T8VCT.G1.S1, relatado pelo Excelentíssimo Conselheiro Henrique Araújo.]

Seja como for, o despacho que ordena a citação não tem um carácter de fixidez da relação processual, visto que nada obsta a que em momento ulterior o R. possa ser absolvido da instância e que, mediante certas circunstâncias possa, o A., apresentar articulados supervenientes (artigos 588º e 589º. CPC) ou aditar/modificar o pedido ou a causa de pedir, nos termos consentidos pela lei  (artigo 265º CPC).

Aliás, prevê-se expressamente que, em despacho ulterior, mediante estudo mais rigoroso e informado, seja possível conhecer de questões não conhecidas no despacho liminar (artigo 590º/1 CPC), como sucede, por exemplo, findos os articulados, na fase pré-saneador, quando se providencia pelo suprimento de exceções dilatórias (artigo 590º/2 CPC).

Neste sentido, dizia-se no domínio do CPC antes da reforma de 2013 que:

“se o juiz em vez de indeferir a petição inicial ab initio, ordenar a citação do réu, pode de acordo com as disposições conjugadas dos artºs 193º nº 1, 202º e 206º nº 1 do CPC, conhecer oficiosamente da ineptidão da petição inicial até à sentença final.

Assim, se após a citação do réu para a acção, se entender que a petição inicial contém vícios que poderiam ter originado o seu indeferimento liminar, v.g. se for inepta, devem tais vícios ser avaliados no despacho saneador ou, como no caso, se a forma de processo o não comportar, até à sentença final.

De qualquer modo, embora tenha sido proferido despacho de citação, daí não pode concluir-se ter-se considerado apta a petição inicial, não fazendo, por isso, aquele despacho de citação, caso julgado formal, nos termos do artº 672º do CPC" [Ac. TRL de 11-03-2008, Processo: 1134/2008-1 Relatora: Excelentíssima Desembargadora Maria José Simões e, no mesmo sentido, Ac. TRL de 18.06.2009, Processo: 23443/1996.L1-2, Relatora: Excelentíssima Desembargadora Teresa Albuquerque, apud Ac. TRL de 17-09-2009, no processo n.º 10095/08-2, relatado pelo Excelentíssimo Desembargador Vaz Gomes.]

E, no sumário do acórdão do TRL de 17.09.2009 escreveu-se que:: “1- Antes da entrada em vigor da Reforma de 95/96, o facto de ter sido proferido despacho de citação nos autos, não implicava caso julgado relativamente à aptidão da petição inicial, não deixando precludida a possibilidade de se decidir pela verificação da ineptidão dessa petição, como resultava claramente do art 479º/3 do CPC. 2- O conteúdo desta norma foi mantido após a Reforma, tendo transitado para a 2ª parte do art 234º/5. 3- Até no CPC 1939 (seu art 483º, § único), se consagrava a não preclusão das questões que podiam ter sido fundamento de indeferimento liminar, mas não o foram. 4- O despacho de citação nunca constitui caso julgado formal. 5- Assim, antes da Reforma, como depois dela para as situações excepcionais em que se admite despacho liminar, consoante os art 234-A e 234º/4, o tribunal pode conhecer das questões que conduzem ao indeferimento liminar, mesmo depois de ordenada a citação do réu”.

Em sentido convergente, já no domínio pleno do NCPC, veja-se o acórdão proferido no TRL em 18.01.2023, no Processo n.º 8095/21.7T8ALM.L1-4, relatado pelo Excelentíssimo Desembargador José Eduardo Sapateiro, em cujo sumário se lê, nomeadamente, que: “O tribunal recorrido no despacho liminar que prolatou e na apreciação necessariamente limitada e perfunctória que fez, não perspetivou a viabilidade dos pedidos e fundamentos factuais e jurídicos formulados pelo Autor, em função das diversas e possíveis interpretações jurídicas e soluções de direito, sendo certo que o despacho liminar de aceitação da petição inicial em questão não forma caso julgado formal ou material quanto a qualquer uma das dúvidas e questões antes levantadas, podendo a presente ação ser, a final, julgada total ou parcialmente improcedente, por alguns dos fundamentos constantes do despacho liminar recorrido ou outros que se deixaram ou não aflorados na nossa fundamentação”.

Aliás, como se nota no acórdão recorrido, verifica-se ter sido cometido lapso de escrita, explicitando-se que o despacho que ordenou a citação foi proferido “sem propriedade de linguagem, já que, estando apenas em causa a renovação da prévia instância declarativa, onde o ali e aqui Réu já fora citado, deveria o mesmo ser apenas notificado; e, tendo mandatário judicial constituído naqueles autos, sem que houvesse notícia da cessação do respectivo mandato, na pessoa do mesmo”  (artigos 358.º/2 e 247/1 CPC).

Em suma: não temos por aceitável que o despacho de citação tenha constituído caso julgado formal.

Daqui retira-se que a pretensão do R. reconduz-se, no essencial, à insistência pela prática de um ato que a lei não lhe admite e que este tribunal não poderia sufragar.

Note-se que, como – e bem – é lembrado pelo acórdão recorrido, diferente seria se no caso tivesse havido erro da secretaria (artigo 157/6 CPC), caso em que a parte não poderia ficar prejudicada nos seus direitos de defesa, em consonância com a doutrina do Tribunal Constitucional, plasmada nomeadamente no Ac. TC n.º 500/2019, de 26.09.2019, in http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20190500.html). Mas não houve qualquer erro da secretaria.

Mais, como acima transcrito, o acórdão recorrido expõe um acutilante aspeto que denota a observância dos direitos de defesa do recorrente, quando afirma que:

“verifica-se que, confrontada com o despacho do Tribunal a quo, a admitir liminarmente o incidente de liquidação pós-sentença deduzido e a ordenar a citação do Réu, «de acordo com o disposto pelas disposições conjugadas dos artigos 360.º, n.º 3, 293.º e 294.º, todos do CPC», a secretaria procedeu à que seria a correcta notificação do Mandatário Judicial do Réu, constituído na inicial instância declarativa, agora renovada.

Mais se verifica que o fez indicando que o «Assunto» era a «Notificação para oposição à liquidação», ficando o «notificado, na qualidade de Mandatário, relativamente ao processo supra identificado», ciente de que dispunha do «prazo de 10 dias deduzir oposição, querendo, ao incidente de liquidação, sob pena de, não o fazendo se considerarem confessados os factos articulados pelo Autor».

Logo, não lhe notificou um qualquer despacho (nomeadamente, o proferido pelo Tribunal a quo), mas sim o comando ali ínsito, de levar ao conhecimento do Réu a dedução do incidente de liquidação contra si, o prazo de que dispunha para lhe deduzir oposição e a cominação em que incorria caso o não fizesse, tudo de acordo com as disposições legais aplicáveis. Ficaria, assim, a parte (repete-se, representada por mandatário judicial) indiscutivelmente em condições de exercer o seu direito de defesa, mostrando-se em absoluto respeitado no caso o direito de contraditório respectivo.

Contudo, no mesmo acto, a secretaria enviou os «duplicados legais», não do requerimento inicial aperfeiçoado, mas sim do inicial, um erro próprio que, indesmentivelmente, poderia vir a prejudicar a defesa do Réu (mas, enfatiza-se, apenas nesta limitada vertente).

Verifica-se ainda que, apercebendo-se o Tribunal a quo desse erro (de forma não documentada nos autos), viria a ordenar o cumprimento do «despacho de 8 de Fevereiro de 2021 relativamente ao requerimento aperfeiçoado», isto é, o despacho de admissão liminar do incidente e de citação do Réu.

Por fim, verifica-se que, voltando a secretaria a cumprir o dito despacho, de novo por meio de notificação do seu Mandatário Judicial do Réu, nos exactos termos em que o fizera anteriormente mas desta feita com os duplicados do requerimento inicial aperfeiçoado, remeteu-lhe igualmente cópia do despacho em causa, bem como do prévio, que ordenara a dita citação.

Ao fazê-lo (sem se sindicar a bondade, ou falta dela, deste seu adicional cuidado), admite-se que o Réu tivesse com ligeireza podido confiar que, para além da notificação de que o seu Mandatário Judicial era destinatário, ele próprio seria citado pessoalmente para os termos do incidente; e tivesse por isso prontamente decidido que só então deduziria oposição ao mesmo. 

Contudo, e conforme referido supra, não foi aqui, no carácter potencialmente dúbio da notificação em causa (não dela própria - de teor assertivo e absolutamente correcto -, mas sim quando comparada com a cópia dos despachos proferidos) que o Réu radicou o seu recurso, e sim na necessidade de ele próprio ser citado, e não apenas notificado na pessoa do seu Mandatário Judicial.

Ora, e conforme já se verificou antes, não era esse o caso; e a notificação efectivamente realizada pela secretaria permitia a defesa dos seus direitos, por tê-lo sido de acordo com o previsto na lei (precisamente para assegurar esse efeito).

Por tudo o que fica exposto, conclui-se que o despacho que ordenou a citação não formou caso julgado, não tendo havido qualquer repercussão negativa nos direitos de defesa do R. pela circunstância de ter sido notificado, o R., na pessoa do seu ilustre mandatário – nos termos previstos na lei.".

*3. [Comentário] a) A situação analisada no acórdão tem o seu quê de anómalo e de extravagante.

b) Num incidente de liquidação deduzido após a condenação num pedido genérico, o tribunal mandou citar o réu (quando devia ter simplesmente mandá-lo notificar através do seu mandatário). Este mandatário foi regulamente notificado pelo tribunal. O réu insiste na necessidade de ser citado.

No seu acórdão, o STJ discorre sobre o carácter "tabelar" do despacho de citação. Trata-se de uma qualificação muito discutível, dado que, actualmente, a regra é a de que não há despacho de citação do réu, mas antes a promoção oficiosa da citação pela secretaria (art. 226.º, n.º 1, CPC). Disto decorre que, quando a lei determina que a citação seja ordenada pelo juiz, não se trata de um despacho de mero expediente, mas antes de um despacho que pressupõe uma análise pelo juiz da verificação das condições para a citação do demandado. Se assim não fosse, não tinha qualquer sentido útil a imposição do despacho liminar do juiz.

Que o despacho de citação faz caso julgado formal no processo decorre da circunstância de, depois de o tribunal ter ordenado a citação do réu, não poder "voltar atrás" e proferir um  despacho de indeferimento liminar. Aliás, o mesmo sucede no caso inverso: depois do indeferimento liminar, o tribunal não pode proferir um despacho de citação. Que o despacho de indeferimento liminar faz caso julgado formal é indiscutível, dado que dele pode (aliás, sempre) ser interposto recurso de apelação (art. 629.º, n.º 3, al. c), e 644.º, n.º 1, al. a), CPC). Seria estranho que dois despachos, embora de conteúdo oposto, que são proferidos em função da petição inicial apresentada pelo autor não tivessem o mesmo valor processual.

Nada disto tem a ver com a circunstância de, tendo sido proferido um despacho de citação, se poder vir a verificar que afinal algo impedia a citação do réu (como, por exemplo, a incompetência absoluta do tribunal). O que então opera é a regra de não preclusão que se encontra estabelecida no art. 226.º, n.º 5, CPC. Esta regra de preclusão é indispensável atendendo, precisamente, ao caso julgado formal produzido pelo despacho de citação.

c) Quer isto dizer que, no caso sub judice, o réu tinha "direito" a ser citado e que tudo o que não fosse a sua citação contrariava o caso julgado do despacho que a ordenou?

Supõe-se que não. A parte que insiste em que o tribunal cumpra o que é ilegal (a sua citação), quando o que foi legalmente realizado (a notificação do seu mandatário) em nada a prejudica, não pode ser considerada com estando a agir de boa-fé. Em concreto: a parte que assim se comporta não pode deixar de se considerar que está a  violar o disposto no art. 8.º CPC.

MTS