"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



07/10/2016

Jurisprudência (444)




Alimentos provisórios;
critérios de fixação


1. O sumário de RL 21/4/2016 (1390/15.6T8TVD-A.L1-2) é o seguinte:

I - Não se tendo reproduzido, no artigo 384º do novo Código de Processo Civil, a norma do artigo 399º, n.º 2 do anterior Código de Processo Civil, valem agora, em matéria de âmbito da prestação alimentícia provisória, apenas os critérios definidos na lei substantiva.

II – A obrigação alimentar “definitiva” dos cônjuges, aproxima-se, na separação de facto, do dever sub-rogado de contribuição para os encargos da vida familiar.

III - Por isso a medida dos alimentos conjugais é, nessa situação, diversa da medida dos alimentos gerais, não se circunscrevendo àquilo que seja indispensável ao sustento, habitação e vestuário, antes compreendendo tudo o que esteja de acordo com aquela que era a condição económica e social do agregado familiar, antes da separação.


IV - Nada impede que no procedimento cautelar de alimentos provisórios, e designadamente para os efeitos de avaliação da situação económica e financeira da Requerente, se tenha em consideração a natureza – “comum” ou da responsabilidade exclusiva da Requerente – das dívidas a cujo pagamento aquela vem fazendo face, por si só.

V - Tal apreciação não opera caso julgado em futura liquidação e partilha do património conjugal.
 

2. Da fundamentação do acórdão consta o seguinte: 

"1. Logo cumprirá assinalar que na adjetivação do direito a alimentos provisórios, se não reproduziu, no artigo 384º do novo Código de Processo Civil, a norma do lugar paralelo no anterior Código de Processo Civil, a saber, o artigo 399º, n.º 2, disposição de acordo com a qual“A prestação alimentícia provisória é fixada em função do estritamente necessário para o sustento, habitação e vestuário do requerente (…)”.

Valendo pois agora, e apenas, os critérios definidos na lei substantiva [Neste sentido, Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, in “Primeiras Notas ao novo Código de Processo Civil”, 2013, Vol. I, Almedina, pág. 321].

Ora, estando os cônjuges “reciprocamente vinculados pelos deveres de respeito, fidelidade, coabitação, cooperação e assistência.” – cfr. artigo 1672º, do Código Civil, diploma a que pertencerão todas as demais disposições de ora em diante citadas, sem indicação de origem – compreende aquele último, “a obrigação de prestar alimentos e a de contribuir para os encargos da vida familiar.”, vd. artigo 1675º, n.º 1.

Sendo que tal dever de assistência “mantém-se durante a separação de facto se esta não for imputável a qualquer dos cônjuges”, cfr. n.º 2 do citado artigo 1675º.

Figurando o cônjuge ou o ex-cônjuge, como o primeiro obrigado a alimentos, na hierarquia elencativa do artigo 2009º, n.º 1.

Entendendo-se, em geral, por alimentos “tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário”, cfr. artigo 2003º, n.º 1.

Mas sendo que no caso particular de alimentos a cônjuge – ainda que separado de facto – importa ter em atenção que como assinala Jorge Duarte Pinheiro [In “O Direito da Família Contemporâneo”, 4ª Ed., AAFDL, 2013, pág.467, 468 [...]] a obrigação conjugal de prestar alimentos se sub-roga à obrigação de contribuir para os encargos da vida familiar,“substituindo-a apenas porque a última não se adequa a um vínculo matrimonial que já se não reflecte numa comunhão de vida. Isto significa que o que separa a obrigação de alimentos e o dever de contribuir para os encargos é tão-só a ausência de economia comum. De resto, a obrigação alimentar dos cônjuges aproxima-se do dever sub-rogado (como é sugerido pelo art. 2015°). É por isso que a medida dos alimentos conjugais é diversa da medida dos alimentos gerais: não se circunscreve àquilo que seja indispensável ao sustento, habitação e vestuário, compreende tudo o que esteja de acordo com aquela que era a condição económica e social do agregado familiar, antes da separação.”.

Isto, sem embargo de na diversa hipótese de divórcio ou de separação judicial de pessoas e bens, o cônjuge credor de alimentos não ter “o direito de exigir a manutenção do padrão de vida de que beneficiou na constância do matrimónio.”, vd. artigo 2016º-A, n.º 3, na redação introduzida pela Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro.

Sendo ainda de assinalar que nos termos do n.º 2 daquele artigo, “O tribunal deve dar prevalência a qualquer obrigação de alimentos relativamente a um filho do cônjuge devedor sobre a obrigação emergente do divórcio em favor do ex-cônjuge”.

E que um tal princípio, correspondendo ao superior interesse da criança, não pode deixar de cobrar igualmente aplicação, estando em causa obrigação de alimentos a filhos do cônjuge devedor “sobre a obrigação emergente da separação de facto em favor do outro cônjuge”.

Como também que “Na fixação dos alimentos atender-se-á, outrossim, à possibilidade de o alimentando prover à sua subsistência”, cfr. n.º 2 do igualmente já citado artigo 2004º.

Finalmente, dispõe-se no artigo 2007º, n.º 1, que “Enquanto se não fixarem definitivamente os alimentos, pode o tribunal, a requerimento do alimentando, ou oficiosamente, se este for menor, conceder alimentos provisórios que serão taxados segundo o seu prudente arbítrio.”, vd. artigo 2007º, n.º 1.

Querendo com isto dizer-se, nas palavras de Marco Carvalho Gonçalves,[In “Providências cautelares”, 2016, 2ª Ed., pág. 295] que no referente “à liquidação do montante devido a título de alimentos provisórios, o tribunal deve orientar-se por um juízo de equidade e de proporcionalidade, sem esquecer a condição económica e financeira do requerente e do requerido”.

Consideração, aquela última, em qualquer caso imposta pelo disposto no artigo 2004º, quanto aos alimentos definitivos, mas valendo, naturalmente, também nesta área dos alimentos provisórios.

Devendo pois o tribunal, ao fixar a medida destes “tomar em consideração não só a capacidade económica daquele que os deve prestar – partindo, designadamente, da análise do seu nível de vida –, como também a situação financeira e patrimonial daquele que os deve receber.”[Ibidem]."

[MTS]