Impugnação pauliana; ónus da prova;
revelia inoperante
1. O sumário de STJ 11.9.2018 (10729/15.3T8SNT.L1.S1) é o seguinte:
I - Sendo gratuito o ato impugnado, os requisitos da impugnação pauliana a considerar são a anterioridade do crédito e a impossibilidade ou agravamento da impossibilidade de satisfação integral do crédito.
II - Cumpria ao autor a prova do montante das dívidas e aos réus a prova de que a devedora possuía bens penhoráveis de igual ou maior valor.
III - Mostrando-se que os créditos do autor são anteriores à doação, e não tendo os réus (que nem sequer contestaram) nada provado quanto ao que lhes competia provar, não podia deixar de proceder a impugnação pauliana.
IV – Efetivamente, perante o desvio, preceituado no art. 611.º do CCivil, aos princípios gerais acolhidos nos arts. 342.º e segs., deve entender-se que a lei se satisfaz com a prova pelo credor do montante do seu próprio crédito, o que equivale a dizer que, provada pelo impugnante a existência e a quantidade do seu crédito e a sua anterioridade em relação ao ato impugnado, se presume a impossibilidade da respetiva satisfação ou o seu agravamento.
V - O facto da fração autónoma cuja doação se impugnou ter entrado no património da doadora em momento posterior à constituição dos créditos do autor - não sendo assim bem com o qual o autor pudesse estar a contar quando contratou os mútuos - não tem qualquer relevância em ordem a impedir a impugnação pauliana.
VI - A circunstância da revelia ser inoperante, em razão da incapacidade por menoridade de um dos réus, não faz inverter o ónus de alegação e prova dos factos que aos réus cabia alegar e provar, ou seja, que a doadora possuía bens penhoráveis de igual ou maior valor que o montante das dívidas.
2. Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:
Quanto à questão da revelia inoperante e sua implicação para a improcedência da ação [...]
Vejamos:
No caso sujeito, nenhum dos Réus contestou. Mas sendo o 3º Réu incapaz em razão da sua menoridade, segue-se que não se consideraram admitidos (confessados, diz a lei) os factos articulados pelo Autor. É o que resulta da alínea b) do art. 568º do CPCivil.
Não sendo a revelia operante, o processo teve de seguir os seus termos normais.
E nisto se exauriu o efeito da revelia.
Diferentemente do que pretende a Recorrente, a circunstância de a revelia ser inoperante não faz inverter o ónus de alegação e prova dos factos que aos Réus cabia alegar e provar, quais sejam, que a obrigada (1ª Ré) possuía bens penhoráveis de igual ou maior valor que o montante das dívidas. Que esta prova cabia aos Réus, não pode suscitar dúvidas, como resulta do art. 611º do CCivil, que é norma específica que, de certo modo, se afasta das regras gerais sobre a matéria (art. 342º do CCivil), e que deve ser relacionada em termos hábeis com o art. 610º, alínea b) [...]. Como se diz, em caso semelhante, no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de Setembro de 2011 (processo nº 326/2002.E1.S1 [...]: “De acordo com o disposto no artigo 611º do CC, competia aos réus, e não à autora, a prova de que não obstante a doação, ainda possuíam, no seu património bens penhoráveis de igual ou maior valor que estavam aptos a responder pelo pagamento do crédito que a autora é titular”. Enfim, como também se aponta do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de Janeiro de 2013 (processo nº 5044/07.9TBLRA.C1.S1, sumariado em www.stj/jurisprudência/sumários), “Perante o desvio, preceituado no art. 611.º do CC, aos princípios gerais acolhidos nos arts. 342.º e segs. do citado Código, deve entender-se que a lei se satisfaz com a prova pelo credor do montante do seu próprio crédito, o que equivale a dizer que, provada pelo impugnante a existência e a quantidade do seu crédito e a sua anterioridade em relação ao acto impugnado, se presume a impossibilidade da respectiva satisfação ou o seu agravamento”.
Não se estando, pois, perante factos que competia ao Autor alegar e provar, mas sim aos Réus, nem havendo lugar à suposta inversão do ónus da prova (v. a propósito o art. 344º do CCivil, que fixa os casos em que há lugar à inversão do ónus da prova, e in casu nenhum desses casos concorre), segue-se à evidência que o que se diz nas conclusões 11ª e 12º não tem o mínimo cabimento jurídico.
Donde, não tendo os Réus alegado e provado a existência de bens penhoráveis no património da doadora de valor igual ou maior que as dívidas, segue-se que a procedência da ação era inevitável, na certeza de que o Autor alegou e provou a existência das dívidas da doadora e a sua anterioridade relativamente à doação."
[MTS]
Vejamos:
No caso sujeito, nenhum dos Réus contestou. Mas sendo o 3º Réu incapaz em razão da sua menoridade, segue-se que não se consideraram admitidos (confessados, diz a lei) os factos articulados pelo Autor. É o que resulta da alínea b) do art. 568º do CPCivil.
Não sendo a revelia operante, o processo teve de seguir os seus termos normais.
E nisto se exauriu o efeito da revelia.
Diferentemente do que pretende a Recorrente, a circunstância de a revelia ser inoperante não faz inverter o ónus de alegação e prova dos factos que aos Réus cabia alegar e provar, quais sejam, que a obrigada (1ª Ré) possuía bens penhoráveis de igual ou maior valor que o montante das dívidas. Que esta prova cabia aos Réus, não pode suscitar dúvidas, como resulta do art. 611º do CCivil, que é norma específica que, de certo modo, se afasta das regras gerais sobre a matéria (art. 342º do CCivil), e que deve ser relacionada em termos hábeis com o art. 610º, alínea b) [...]. Como se diz, em caso semelhante, no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de Setembro de 2011 (processo nº 326/2002.E1.S1 [...]: “De acordo com o disposto no artigo 611º do CC, competia aos réus, e não à autora, a prova de que não obstante a doação, ainda possuíam, no seu património bens penhoráveis de igual ou maior valor que estavam aptos a responder pelo pagamento do crédito que a autora é titular”. Enfim, como também se aponta do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de Janeiro de 2013 (processo nº 5044/07.9TBLRA.C1.S1, sumariado em www.stj/jurisprudência/sumários), “Perante o desvio, preceituado no art. 611.º do CC, aos princípios gerais acolhidos nos arts. 342.º e segs. do citado Código, deve entender-se que a lei se satisfaz com a prova pelo credor do montante do seu próprio crédito, o que equivale a dizer que, provada pelo impugnante a existência e a quantidade do seu crédito e a sua anterioridade em relação ao acto impugnado, se presume a impossibilidade da respectiva satisfação ou o seu agravamento”.
Não se estando, pois, perante factos que competia ao Autor alegar e provar, mas sim aos Réus, nem havendo lugar à suposta inversão do ónus da prova (v. a propósito o art. 344º do CCivil, que fixa os casos em que há lugar à inversão do ónus da prova, e in casu nenhum desses casos concorre), segue-se à evidência que o que se diz nas conclusões 11ª e 12º não tem o mínimo cabimento jurídico.
Donde, não tendo os Réus alegado e provado a existência de bens penhoráveis no património da doadora de valor igual ou maior que as dívidas, segue-se que a procedência da ação era inevitável, na certeza de que o Autor alegou e provou a existência das dívidas da doadora e a sua anterioridade relativamente à doação."
[MTS]