1. A Proposta de Lei n.º145/XIII/3.ª, que altera a LOSJ e o DL 49/2014, de 27/3, pode ser consultada aqui.
2. a) Segundo o proposto, o n.º 5 do art. 82.º LOSJ passa a ter a seguinte redacção:
5 - As audiências de julgamento dos processos de natureza cível da
competência dos juízos locais cíveis ou dos juízos de competência
genérica são realizadas no juízo territorialmente competente de acordo
com as regras processuais aplicáveis, ainda que se trate de um juízo de
proximidade.
A redacção está longe de ser tecnicamente perfeita. As regras que constam do CPC sobre a competência territorial são regras sobre a competência jurisdicional. Essas regras determinam apenas o juízo local cível ou o juízo de competência genérica que é territorialmente competente, mas nunca atribuem competência territorial a um juízo de proximidade.
Procurando ser totalmente claro: não há nenhuma regra no CPC que atribua competência territorial a um juízo de proximidade, dado que essas regras respeitam à competência jurisdicional -- ou seja, ao tribunal com competência para apreciar a causa e, portanto, ao tribunal no qual a causa deve ser instaurada -- e os juízos de proximidade não têm competência jurisdicional, pois que nenhuma causa pode ser instaurada num desses juízos. Os juízos de proximidade apenas têm competência funcional para a prática de alguns actos processuais.
Sendo assim, o que se poderia ter estabelecido era simplesmente que, quando a causa pertença à competência de um juízo local cível ou de um juízo de competência genérica, as audiências de julgamento (melhor se teria dito, as audiências finais) são realizadas nos juízos de proximidade, aproveitando-se, para esse efeito, as regras sobre a competência territorial estabelecidas no CPC.
b) Se bem se percebe a regra que consta do art. 82.º, n.º 5, LOSJ, quando a causa seja da competência de um juízo local cível ou de um juízo de competência genérica (mas, não por exemplo, de um juízo central cível ou de um juízo de família e menores), a audiência final realiza-se num juízo de proximidade, se, pelas regras da competência territorial estabelecidas no CPC, o elemento de conexão determinativo dessa competência (como o domicílio do réu ou o lugar do cumprimento da obrigação) coincidir com a área da competência territorial desse juízo de proximidade.
Note-se, no entanto, que a aplicação da regra só é possível quando a área de competência territorial do juízo local cível ou do juízo de competência genérica abranger a área da competência territorial do juízo de proximidade ou, dito de outra forma, quando, na área da competência territorial do juízo local cível ou do juízo de competência genérica, houver um juízo de proximidade.
Vejam-se alguns exemplos, construídos de acordo com o estabelecido no Mapa III do Anexo ao DL 49/2014, de 27/3:
-- O tribunal competente é o juízo local cível de Beja (com competência nos municípios de Beja e Mértola), porque o réu tem domicílio em Mértola; a audiência final realiza-se no juízo de proximidade de Mértola;
-- O tribunal competente é o juízo de competência genérica de Almodôvar (com competência nos municípios de Almodôvar e Castro Verde), porque o réu tem domicílio no município de Castro Verde; a audiência final realiza-se em Almodôvar, porque em Castro Verde não há nenhum juízo de proximidade;
-- O tribunal competente é o juízo local cível de Tomar (com competência nos municípios de Ferreira do Zêzere e Tomar), porque o réu tem domicílio em Ferreira do Zêzere; a audiência final realiza-se no juízo de proximidade de Ferreira do Zêzere;
-- O tribunal competente é o juízo de competência genérica de Almeirim (com competência nos municípios de Almeirim e Alpiarça), porque o acidente ocorreu em Alpiarça; a audiência final realiza-se em Almeirim, porque em Alpiarça não há nenhum juízo de proximidade;
-- O tribunal competente é o juízo de competência genérica de Moimenta da Beira (com competência nos municípios de Moimenta da Beira, Penedono, São João da Pesqueira, Sernancelhe e Tabuaço), porque o réu tem domicílio em São João da Pesqueira; a audiência final realiza-se no juízo de proximidade de São João da Pesqueira;
-- O tribunal competente é o juízo de competência genérica de Moimenta da Beira (com a competência territorial acima definida), porque o réu tem domicílio em Penedono; a audiência final realiza-se no juízo de competência genérica de Moimenta da Beira, porque em Penedono não há nenhum juízo de proximidade.
-- O tribunal competente é o juízo de competência genérica de Moimenta da Beira (com competência nos municípios de Moimenta da Beira, Penedono, São João da Pesqueira, Sernancelhe e Tabuaço), porque o réu tem domicílio em São João da Pesqueira; a audiência final realiza-se no juízo de proximidade de São João da Pesqueira;
-- O tribunal competente é o juízo de competência genérica de Moimenta da Beira (com a competência territorial acima definida), porque o réu tem domicílio em Penedono; a audiência final realiza-se no juízo de competência genérica de Moimenta da Beira, porque em Penedono não há nenhum juízo de proximidade.
Os exemplos mostram que, porque a distribuição dos juízos de proximidade é relativamente aleatória, é igualmente bastante aleatória a possibilidade da realização de audiências finais num desses juízos. Tudo depende da circunstância, puramente acidental, de, por exemplo, no lugar do domicílio do réu ou no lugar do acidente haver um juízo de proximidade. A situação seria diferente (ou só poderia ser diferente) se houvesse uma distribuição dos juízos de proximidade conjugada com a dos juízos locais cíveis e dos juízos de competência genérica e se a competência funcional dos juízos de proximidade fosse determinada por critérios próprios da organização judiciária (e não por critérios próprios da competência territorial constante do CPC).
Na falta desta distribuição conjugada dos juízos de proximidade e de critérios próprios determinativos da sua competência funcional, tudo se torna muito aleatório e muito pouco compatível com o princípio da igualdade, dado que situações iguais terão soluções diferentes mesmo no âmbito de uma mesma comarca e até mesmo no âmbito de um mesmo tribunal. Se bem se compreende o regime legal, acções com o mesmo objecto, o mesmo valor, a mesma forma do processo e até pendentes no mesmo tribunal passam a ter, quanto à realização da audiência final, soluções completamente díspares.
Tudo ponderado, em vez de ter construído um regime rígido que conduz inevitavelmente a situações de desigualdade, talvez tivesse sido melhor solução ter atribuído ao juiz, no âmbito dos poderes de gestão processual e de adequação formal, a faculdade de, em função das especificidades do caso, determinar a realização da audiência final em qualquer um dos juízos de proximidade da comarca.
Na falta desta distribuição conjugada dos juízos de proximidade e de critérios próprios determinativos da sua competência funcional, tudo se torna muito aleatório e muito pouco compatível com o princípio da igualdade, dado que situações iguais terão soluções diferentes mesmo no âmbito de uma mesma comarca e até mesmo no âmbito de um mesmo tribunal. Se bem se compreende o regime legal, acções com o mesmo objecto, o mesmo valor, a mesma forma do processo e até pendentes no mesmo tribunal passam a ter, quanto à realização da audiência final, soluções completamente díspares.
Tudo ponderado, em vez de ter construído um regime rígido que conduz inevitavelmente a situações de desigualdade, talvez tivesse sido melhor solução ter atribuído ao juiz, no âmbito dos poderes de gestão processual e de adequação formal, a faculdade de, em função das especificidades do caso, determinar a realização da audiência final em qualquer um dos juízos de proximidade da comarca.
c) Por fim, cabe referir que, porque se mantém o disposto no n.º 1 do art. 82.º LOSJ, a realização da audiência de julgamento nos juízos de proximidade, mesmo quando possível, não é automática. Ela necessita sempre de uma decisão do juiz titular, depois de as partes serem ouvidas.
MTS