"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



26/09/2019

O (novo) n.º 7 do artigo 26.º do RCP

1. A Lei n.º 27/2019, de 28 de março, aditou ao artigo 26.º do Regulamento das Custas Processuais (RCP) o n.º 7, com a seguinte redação:

"Se a parte vencedora gozar do benefício de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, as custas de parte pagas pelo vencido revertem a favor do Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, I. P.."

Tendo em conta que os encargos e a compensação ao patrono nomeado são inscritos na conta final de acordo com a regra de custas fixada pelo juiz (cf. artigos 16.º, alínea a), subalíneas i) e ii), e 30º, n.º 3, alínea c), do RCP, artigo 36.º da Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, e artigo 8º, n.º 1, da Portaria 10/2008, de 3 de janeiro) e considerando ainda que os encargos cujo pagamento o IGFEJ, I.P. tenha adiantado nos termos do artigo 20.º, n.º 2, do RCP também entram na regra de custas a final, embora sem ser através do mecanismo das custas de parte, o único sentido útil do novo n.º 7 do artigo 26.º do RCP é estabelecer que o IGFEJ, I.P. passa a ter direito, quando a parte vencedora litiga com apoio judiciário, a exigir à parte vencida (que não beneficia de apoio judiciário) o valor ficcionado que a parte vencedora pagaria a título de taxa de justiça se não fosse a concessão do apoio judiciário.

2. Esta taxa e justiça ficta (que não foi suportada pela parte vencedora, dado que a mesma beneficia de apoio judiciário) não se encontra prevista na lei (v., no mesmo sentido, o Cons. Salvador da Costa, no paper publicado no Blog do IPPC, em 16.04.2019, pág. 4, acessível em https://blogippc.blogspot.com/…/alteracao-do-regime-das-cus…).

Isto significa que não pode ser exigida à parte vencida, no âmbito do mecanismo das custas de parte previsto no n.º 7 do artigo 26.º do RCP, o valor (total ou parcial) da suposta taxa de justiça, de acordo com a regra de custas a final, que a parte vencedora teria pago não fosse o apoio judiciário de que beneficia.

Para aquele valor poder ser exigido à parte vencida (que litiga com a parte vencedora que beneficia de apoio judiciário) teria de haver uma lei que criasse ou habilitasse a criação dessa taxa ficta, dado que é da reserva relativa de competência da Assembleia da República a criação de taxas e demais contribuições financeiras a favor das entidades públicas (cf. art. 165.º, n.º 1, alínea i), da Constituição).

3. É, pois, admissível a reclamação pela parte vencida contra a exigibilidade pela secretaria do pagamento da taxa de justiça que a parte vencedora teria pago não fosse o apoio judiciário de que beneficia, com fundamento na inconstitucionalidade orgânica.
J. H. Delgado de Carvalho