Citação edital;
aplicação da lei no tempo; nulidade
I- O recurso extraordinário de revisão tem como razão de ser exigências de justiça material que se sobrepõem às razões de segurança ou de certeza inerentes ao caso julgado.
II- Daí que o art. 697º nº 2 do C.P.C. tenha previsto dois prazos de caducidade para a sua interposição, salvo se respeitar a direitos de personalidade: a) o prazo máximo de cinco anos sobre a data do trânsito em julgado da decisão a rever; e, sem prejuízo deste prazo, b) o prazo de 60 dias contados, no caso do fundamento previsto na al. c) do art. 696º do C.P.C., desde que o recorrente obteve o documento que serve de base à revisão.
III- Tem legitimidade para interpor recurso de revisão com fundamento na falta de citação ou nulidade de citação o réu que não foi citado ou o foi irregularmente e que não interveio na acção ou execução.
IV- Numa acção declarativa entrada em 07/03/2013 ao acto da citação é aplicável o anterior C.P.C. nos termos do art. 5º nº 1 e 3 da Lei nº 41/2013 de 26 de Junho, que aprovou o Código de Processo Civil Revisto.
V- A falta de cumprimento do disposto no art. 248º do anterior C.P.C. e o cumprimento do disposto no art. 240º do C.P.C. Revisto, por não ter a virtualidade de prejudicar a defesa do réu, não consubstancia nulidade de citação e fundamento de revisão de sentença.
2. Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:
"Com vista a apurar se a decisão recorrida andou bem importa, antes do mais, saber que regime jurídico é aplicável à citação em causa.
A Lei nº 41/2013 de 26 de Junho, que aprovou o Código de Processo Civil Revisto, entrou em vigor em 01/09/2013.
O art. 5º, referente à acção declarativa, dispõe:
“1 - Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, o Código de Processo Civil, aprovado em anexo à presente lei, é imediatamente aplicável às acções declarativas pendentes. (…)3 – Nas normas reguladoras dos atos processuais da fase dos articulados não são aplicáveis às acções pendentes na data de entrada em vigor do Código de Processo Civil, aprovado em anexo à presente lei. (…)
Assim sendo, tendo a acção dado entrada em 07/03/2013, ao acto da citação, acto processual da fase dos articulados, é aplicável o C.P.C. na versão anterior a esta revisão, i.e., é aplicável o disposto nos art. 228º e ss dessa versão.
Vejamos então se, quanto à citação do ora recorrente, foi cumprido o disposto nesta versão do C.P.C..
Foi expedida carta registada com aviso de recepção para citação na morada indicada na petição (art. 228º, nº 1, 233º, nº 1 e 2 b), 234º, 236º nº 1), mas a mesma não foi possível, tendo sido aposta nessa carta a menção “Não Atendeu” e tendo a carta sido devolvida ao remetente.
Foi dado cumprimento ao disposto no art. 239º nº 9 tendo sido tentada a citação mediante funcionário de justiça, a qual não foi possível porque ninguém atendeu, e como este não conseguiu apurar se o citando residia efectivamente naquele local, não pôde deixar nota com indicação de hora certa para a diligência nalguma pessoa que estivesse em condições de a transmitir ao citando e/ou afixar o respectivo aviso no local mais indicado (art. 240º nº 1 e 4 a contrario).
Por se ter considerado que a citação não se mostrava possível por o citando estar ausente em parte incerta, foi ordenado que se averiguasse o actual paradeiro do citando nas bases de dados. A secretaria assim diligenciou tendo verificado que, na base de dados da Segurança Social, identificação civil e da Direcção-Geral dos Impostos, a morada do ora recorrente é a mesma que aquela que constava dos autos. A morada que constava da base de dados do IMTT é parcialmente coincidente sendo que, em vez de 3º esq., consta 3º trás, sendo que claramente se trata de lapso e não de outra morada. Deste modo foi dado cumprimento ao disposto no art. 244º nº 1.
Após, nos termos da parte final do nº 1 deste preceito, foi ordenado que se diligenciasse junto da entidade policial competente no sentido de apurar a última residência conhecida do citando, o que foi feito.
Do ofício da PSP resulta que as informações obtidas foram prestadas pelo próprio R. L. que indicou como sua residência a mesma morada que consta da p.i. e que foi confirmada pela consulta às bases de dados.
Após, foi deferido o requerido pela autora tendo sido deprecada a citação do ora recorrente nos mesmos termos em que o havia sido, i.e., nos termos do art. 239º nº 9 por referência à morada fornecida pelo próprio. Nesse momento o oficial de justiça lavrou certidão negativa consignando que o citando já lá não residia e que o mencionado apartamento estava desabitado.
Perante esta informação foi finalmente ordenada a citação edital ora em análise dando-se assim cumprimento ao disposto no art. 233º nº 6.
Procedeu-se a esta citação tendo sido elaborado o competente edital e anúncio nos termos do art. 248º nº 1 e 249º.
Foi deprecada a afixação dos editais “nos locais designados por lei”, o que veio a ser feito à porta do tribunal e na última morada conhecida do réu. O anúncio foi publicado no Portal Citius.
Constata-se, assim, que a secretaria, no que concerne às formalidades da citação edital, cumpriu o disposto no art. 240º do N.C.P.C. e não o disposto no anterior art. 248º n 2 e 3 que preceituava a afixação de três editais (na porta do juízo, da última residência conhecida e da junta de freguesia) e a publicação de anúncio em dois números seguidos de um jornal, regional ou nacional, mais lido na localidade em que esteja em casa da última residência do citando.
Ora, nos termos do art. 198º nº 1 do C.P.C., sem prejuízo do disposto no art. 195º, é nula a citação quando não hajam sido, na sua realização, observadas as formalidades prescritas na lei, contudo, nos termos do nº 4 do mesmo preceito a arguição desta nulidade só é atendida se a falta cometida puder prejudicar a defesa do citado.
Entendemos que, no caso em apreço, a falta de cumprimento do disposto no art. 248º do anterior C.P.C. não é susceptível de prejudicar o direito de defesa do citado pelo que concluímos pela não nulidade da citação.
No C.P.C. Revisto o legislador tornou menos complexas e mais céleres as formalidades da citação edital passando a exigir apenas o anúncio em página informática de acesso público em termos a regulamentar por portaria do membro do governo responsável pela área da justiça e a afixação de um único edital na casa da última residência ou sede que o citando teve no país (art. 240º). Como se lê no preâmbulo deste diploma foi importado para o processo comum o regime de citação de ausentes em parte incerta instituído no regime processual civil de natureza experimental, aprovado pelo Dec.-Lei nº 108/2006, de 08 de Junho.
A versão inicial do art. 24º da Portaria nº 280/2013 de 26 de Agosto dispunha: O anúncio relativo à citação edital previsto no artigo 240.º do Código de Processo Civil é publicado no sítio da Internet de acesso público com o endereço eletrónico http://www.citius.mj.pt. Este preceito actualmente preceitua que O anúncio relativo à citação edital previsto no artigo 240.º do Código de Processo Civil é publicado na Área de Serviços Digitais dos Tribunais, acessível no endereço eletrónico https://tribunais.org.pt.
Considerou o legislador que tais formalidades eram aquelas que se revelavam adequadas a esse momento histórico e que eram susceptíveis de possibilitar o conhecimento pelo réu do processo contra si instaurado.
A equiparação entre as formalidades previstas no anterior e no actual C.P.C. permite concluir que a adopção das últimas no lugar das primeiras não tem a virtualidade de prejudicar a defesa do réu e ora recorrente.
E não sendo nula a sua citação é de manter a decisão recorrida que julgou improcedente o presente recurso de revisão."
[MTS]