Honorários;
injunção; prescrição presuntiva
1. O sumário de RE 13/10/2022 (73036/20.3YIPRT.E1) é o seguinte:
I. Estando aqui em causa a reclamação do pagamento da quantia de € 7687,50 a título de honorários por serviços prestados pelo autor advogado, no âmbito de contrato de mandato celebrado com o réu, é inequívoco que o apelado poderia ter lançado mão de tal procedimento de injunção, como efectivamente o fez;
II. As afirmações feitas pelo réu na oposição no sentido de que não reconhece a existência de tais créditos e que o autor nunca lhe comunicou ou apresentou quaisquer notas de honorários, são incompatíveis com o (presumido) pagamento dos honorários e impedem que o mesmo beneficie da prescrição a que alude a alínea c) do art.º 317º do Cód. Civil.
2. Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:
"Reitera o apelante o seu entendimento de que o crédito em apreço prescreveu nos termos do disposto na alínea c) do artº 317º do Cód. Civil que assim dispõe:
“Prescrevem no prazo de dois anos:a) (…);b) (…)c) Os créditos pelos serviços prestados no exercício de profissões liberais e pelo reembolso das despesas correspondentes."
Sucede que tal prazo de prescrição, ao contrário do que sucede com a prescrição ordinária, funda-se na presunção de cumprimento: trata-se de uma prescrição presuntiva – art.º 312º do Cód. Civil.
O efeito da prescrição presuntiva não é, propriamente, a extinção da obrigação, mas antes a inversão do ónus da prova que deixa de onerar o devedor que, por isso, não tem de provar o pagamento, para ficar a cargo do credor, que terá de demonstrar o não pagamento.
Porém, a elisão da presunção pode também ter lugar mediante confissão expressa do devedor ou tácita traduzida na prática em juízo de actos incompatíveis com a presunção de cumprimento – artºs 313º e 314º do Cód.Civil.
“É o que manifestamente acontece – diz Joaquim de Sousa Ribeiro – quando o réu, para além de excepcionar por prescrição, impugna também directamente os factos constitutivos do direito do autor, negando a existência, em si mesmo ou no seu montante, ou a validade do débito. Assim procedendo, ele está a reconhecer implicitamente que o crédito não foi satisfeito, uma vez que o cumprimento pressupõe, como é óbvio, a existência e eficácia de um vínculo obrigacional que o torne exigível.
Estão, assim, em absoluto contraste com a presunção de cumprimento meios de defesa tais como: a negação da originária existência do débito; a discussão do seu montante, ou a remissão da sua fixação para o tribunal; a invocação de uma causa de nulidade ou anulabilidade; a contestação da solidariedade da dívida, reivindicando o benefício da divisão; a alegação do pagamento de importância inferior à reclamada, pretextando que ele corresponde à liquidação integral do débito (o que vale por um reconhecimento tácito de não ter pago a diferença); a invocação da gratuitidade dos serviços, etc. […] O mesmo se passa, segundo cremos, quando ele, invocando embora o decurso do prazo prescricional, não se coíbe de especificar uma outra causa exoneratória incompatível com aquela presunção.
[…S]endo o cumprimento incompatível com a verificação cumulativa de outra qualquer causa extintiva, a simples invocação de uma delas vale como reconhecimento tácito de que tal acto não foi levado a cabo. Alegando a extinção por um processo que, por mera indução lógica, exclui o cumprimento, o devedor fornece prova segura, insusceptível de qualquer manipulação – provém dele próprio, e resulta de um acto processual – de que, contra o que se presumia, aquele não efectuou a prestação a seu cargo […]” (Prescrições presuntivas…, publicado na Revista de direito e economia, Ano V, n.º 2, Julho/Dezembro de 1979, Universidade de Coimbra, págs. 397-398 e 401; no mesmo sentido, por exemplo, Brandão Proença, no Comentário ao CC, Parte Geral, Universidade Católica Editora, 2014, págs. 761-762; Rita Canas da Silva, no CC anotado, vol. I, 2017, Almedina, págs. 384-385)”. [Apud Ac. Rel. Lisboa de 11.7.2019 consultável na Base de Dados do IGFEJ.]
Lendo a oposição do apelante logo se constata estar aí completamente arredada a hipótese de ter ocorrido o pagamento peticionado (ou qualquer outro): afirma-se desde logo que “não se reconhecem existir” tais créditos (art.º 2º) e que o apelado “nunca comunicou nem apresentou, ao Requerido, quaisquer notas de honorários” (art.º 6º).
Estas afirmações, porque incompatíveis com o (presumido) pagamento dos honorários, impedem que o apelante beneficie de tal prescrição presuntiva.
E, por isso, a sua pretensão de a ver proceder não tem, também, qualquer fundamento."
*3. [Comentário] A RE decidiu bem.
Talvez possa causar algumas dúvidas a circunstância de o requerente ter instaurado o requerimento de injunção sem que o requerido (e alegado devedor) tenha sido anteriormente interpelado para cumprir. As dúvidas são desfeitas, no que se refere à interpelação para o cumprimento, pelo disposto no art. 805.º, n.º 1, CC, e, no que respeita às custas, pelo estabelecido no art. art. 535.º, n.º 2, al. b), CPC.
MTS
Talvez possa causar algumas dúvidas a circunstância de o requerente ter instaurado o requerimento de injunção sem que o requerido (e alegado devedor) tenha sido anteriormente interpelado para cumprir. As dúvidas são desfeitas, no que se refere à interpelação para o cumprimento, pelo disposto no art. 805.º, n.º 1, CC, e, no que respeita às custas, pelo estabelecido no art. art. 535.º, n.º 2, al. b), CPC.
MTS