"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



14/07/2023

Jurisprudência 2022 (225)


Acompanhamento de maiores;
acompanhante; legitimidade para recorrer


1. O sumário de RL 7/12/2022 (2704/20.2T8CSC.L1-2) é o seguinte:

Um acompanhante não pode recorrer, por si, contra a decisão final do processo de acompanhamento, ou de partes desta (art. 901 do CPC); pode fazê-lo como representante do acompanhado, ou pode fazê-lo como assistente, assumindo uma posição de parte acessória no recurso, auxiliando o acompanhado recorrente; mas, no caso, não foi em nenhuma destas qualidades que ele recorreu.


2. Na fundamentação do acórdão escreveu-se o seguinte:

"Subscreve-se a decisão singular reclamada, com um acrescento – que é este: no mesmo sentido das posições referidas no despacho de 28/09/2022, veja-se o acórdão do TRL de 07/10/2021, proc. 1562/19.4T8CSC.L1-6: I - O artigo 901.º do CPC, confere legitimidade ao acompanhante, para efeitos de recurso de decisão relativa a medida de acompanhamento, na qualidade de assistente, reconhecendo-lhe, assim, o direito de intervir no recurso como auxiliar de qualquer das partes principais (requerente ou acompanhado), se tiver interesse jurídico em que a decisão do pleito seja favorável a essa parte (artigos 326.º e 328.º do CPC).” O acórdão é lembrado pela Srª juíza desembargadora 2.ª adjunta: neste caso, o recurso foi interposto (conjuntamente) pelo beneficiário e sua mulher, acompanhante, tendo sido questionada pela requerente a legitimidade da acompanhante para recorrer. A situação é obviamente diferente da apreciada no caso destes autos, mas ajuda a reforçar a argumentação, já que o recorrente não interpôs o recurso como auxiliar de nenhuma parte principal - e com as seguintes considerações sobre os pontos que antecedem:- quanto a (ix), o recorrente limita-se a fazer a acusação subjacente à arguição da nulidade, sem indicar uma única questão invocada por ele e que tivesse deixado de ser conhecida pela decisão singular. Aliás, nem o poderia fazer, porque a única questão era a decidir era a admissibilidade ou não do recurso. De qualquer modo, apreciaram-se todos os argumentos da pronúncia do recorrente.

- quanto a (x), o recorrente foi nomeado acompanhante em conjunto com o requerente dos autos, pelo que existem dois acompanhantes / representantes do acompanhado; querendo um deles interpor recurso tem de ter o acordo do outro; não o tendo, aquele que quer recorrer tem um problema para o qual precisa de solução; não havendo uma solução directa, tem que procurar essa solução na de um caso paralelo (art. 10/1-2 do CC); esse caso paralelo é o do art. 18 do CPC, sendo que ele dá resposta a todas as dúvidas do recorrente (viabilidade, efeito útil, prazo para o recurso):

1 - Se, sendo o menor representado por ambos os pais, houver desacordo entre estes acerca da conveniência de intentar a acção, pode qualquer deles requerer ao tribunal competente para a causa a resolução do conflito. 2 - Se o desacordo apenas surgir no decurso do processo, acerca da orientação deste, pode qualquer dos pais, no prazo de realização do primeiro ato processual afectado pelo desacordo, requerer ao juiz da causa que providencie sobre a forma de o incapaz ser nela representado, suspendendo-se entretanto a instância. 3 - Ouvido o outro progenitor, quando só um deles tenha requerido, bem como o Ministério Público, o juiz decide de acordo com o interesse do menor, podendo atribuir a representação a só um dos pais, designar curador especial ou conferir a representação ao Ministério Público, cabendo recurso da decisão. 4 - A contagem do prazo suspenso reinicia-se com a notificação da decisão.

- quanto a (xi), não há contradição em dizer que o acompanhante não pode recorrer, por si, no caso do art. 901 do CPC, e ao mesmo tempo dizer que ele o pode fazer quando se verificar a situação prevista no art. 631/2 do CPC (um caso de alargamento da legitimidade para o recurso).

- quanto a (xii), o facto de alguém ser notificado para se pronunciar sobre alguma coisa no processo, não faz dele parte numa acção: é um mero interveniente processual; o facto de o acompanhante poder ser parte acessória num recurso não o torna parte (principal), com interesses próprios, diferentes do acompanhado: como se disse na decisão singular, se ele fosse parte na causa, diferente do acompanhado, então nem poderia dizer estar a representar os interesses do acompanhado, também parte na causa. Miguel Teixeira de Sousa não diz que o acompanhante é parte acessória na acção, diz que “o acompanhante assume uma posição de parte acessória no recurso.”

- quanto (xiii), o ac. STJ de 14/01/2021 reconheceu a legitimidade de um terceiro para interpor recurso ao abrigo do art. 631/2 do CPC; não é possível retirar desta regra, por maioria de razão, como quer o recorrente, que o acompanhante pode recorrer, por si, autonomamente, contra o que está disposto no art. 901 do CPC.

- quanto a (xiv), quis-se dizer, como decorre do início do § em causa, que o recorrente se estava a repetir e a incorrer numa petição de princípio, o que se comprova, de novo, com aquilo que ele diz em (xv)."

[MTS]