"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



06/10/2017

Jurisprudência (699)


Procedimento de injunção;
questão sujeita a decisão judicial; distribuição


1. O sumário de RC 27/4/2017 (1531/16.6T8CBR-A.C1) é o seguinte:
 
I – O art.º 2º do DL nº 269/98, de 01.09, está inserido na regulamentação feita nesse anexo para a acção declarativa, preceituando: ‘Se o réu, citado pessoalmente, não contestar, o juiz, com valor de deci­são condenatória, limitar-se-á a conferir força executiva à petição, a não ser que ocorram, de forma evidente, excepções dilatórias ou que o pedido seja manifesta­mente improcedente.’.

II - A injunção é remetida pelo secretário judicial à distribuição nos casos pre­vistos no art.º 16º do citado diploma.

III - Após a distribuição são seguidos os trâmites mencionados no art.º 17º:
 
 1 - Após a distribuição a que se refere o n.º 1 do artigo anterior, segue-se, com as necessárias adaptações, o disposto no n.º 4 do artigo 1.º e nos artigos 3.º e 4.º

2 - Tratando-se de caso em que se tenha frustrado a notificação do reque­rido, os autos só são conclusos ao juiz depois de efectuada a citação do réu para contestar, nos termos do n.º 2 do artigo 1.º

3 - Recebidos os autos, o juiz pode convidar as partes a aperfeiçoar as pe­ças processuais.

4 - Se os autos forem apresentados à distribuição em virtude de dedução de oposição cuja falta de fundamento o réu não devesse ignorar, é este condenado, na sentença referida no n.º 7 do artigo 4.º, em multa de montante igual a duas vezes o valor da taxa de justiça devida na acção declarativa.

III – Importa assim concluir da leitura destes preceitos que a injunção é reme­tida à distribuição, seguindo os termos da AECOPEC, no caso de ter sido deduzida oposição e nos casos em que tendo sido frustrada a notificação do requerido o requerente tenha manifestado essa pretensão ou ainda sempre que se suscite questão sujeita a decisão judicial - art.º 16º n.º 2.

IV - Do regime da injunção resulta que, uma vez remetido esse procedimento à distribuição nos termos do n.º 1 do art.º 16º, segue-se, com as necessárias adaptações, o disposto no n.º 4 do artigo 1.º e nos artigos 3.º e 4., ou seja, remetendo-se o duplicado da contestação ao autor simultaneamente com a notificação da data da audiência de julgamento – art.º 1º, n.º 4 – ou observando-se o disposto nos artigos 3º e 4º, nada se encontrando previsto para o caso da remessa à distribuição ter ocorrido por circunstância que se encontre no âmbito de aplicação do n.º 2 do art.º 16º.

V - Em casos destes é manifesto não ter aplicação o mesmo regime que se encontra previsto para os casos de remessa à distribuição nas situações previstas no n.º 1 do art.º 16º, exceptuando o caso de se estar face a uma reclamação de não recebimento de oposição e a decisão for de julgar essa reclamação procedente, uma vez que qualquer decisão não abrangida pela reclamação pertence ao secretário judicial.

VI - Da conjugação dos preceitos citados e de toda a filosofia subjacente ao procedimento de injunção entendemos que a sua remessa à distribuição mencionada no art.º 16º, n.º 2 não o transmuta definitivamente em AECOPEC, constituindo somente um modo de o atribuir a um juiz que aprecie a questão colocada, devendo ser devolvido ao secretário judicial após apreciação da mesma que continuará a sua tramitação como procedimento de injunção.
 
2. Na fundamentação do acórdão escreveu-se o seguinte:
 
"A questão que nos é colocada neste recurso reduz-se à qualificação do tí­tulo executivo dado à execução.
 
O agora Embargado requereu procedimento de injunção contra a Embar­gante procedimento esse em que, pelo facto de ter sido recusado pelo secretário judicial o recebimento da oposição, foi remetido à distribuição na sequência de reclamação daquela recusa.
 
Conclusos os autos o juiz proferiu despacho em que julgou a oposição apresentada extemporânea, ordenando o seu desentranhamento e, de imediato, invocando os princípios de agilização e economia processuais proferiu sentença na qual ao abrigo do disposto no art.º 2º do regime anexo ao D.L. nº 269/98, de 01.09, conferiu força executiva à petição.
 
A embargante quer na petição de embargos quer neste recurso defende a inexistência de título que sustente a execução, alegando que aquela decisão não configura uma sentença condenatória.
 
A decisão recorrida julgou improcedente a excepção invocada, decidindo que o título apresentado é uma verdadeira sentença condenatória transitada em julgado.
 
Vejamos:
 
O art.º 2º do DL nº 269/98, de 01.09, está inserido na regulamentação feita nesse anexo para a acção declarativa, preceituando:
 
Se o réu, citado pessoalmente, não contestar, o juiz, com valor de deci­são condenatória, limitar-se-á a conferir força executiva à petição, a não ser que ocorram, de forma evidente, excepções dilatórias ou que o pedido seja manifesta­mente improcedente. 
 
A injunção é remetida pelo secretário judicial à distribuição nos casos pre­vistos no art.º 16º, o qual dispõe:
 
1 - Deduzida oposição ou frustrada a notificação do requerido, no caso em que o requerente tenha indicado que pretende que o processo seja apresentado à distribuição, nos termos da alínea j) do n.º 2 do artigo 10.º, o secretário apresenta os autos à distribuição que imediatamente se seguir.

2 - Salvo o disposto no n.º 2 do artigo 11.º e no n.º 4 do artigo 14.º, os autos são também imediatamente apresentados à distribuição sempre que se suscite questão sujeita a decisão judicial. 
 
Após a distribuição são seguidos os trâmites mencionados no art.º 17º:
 
1 - Após a distribuição a que se refere o n.º 1 do artigo anterior, segue-se, com as necessárias adaptações, o disposto no n.º 4 do artigo 1.º e nos artigos 3.º e 4.º 
 
2 - Tratando-se de caso em que se tenha frustrado a notificação do reque­rido, os autos só são conclusos ao juiz depois de efectuada a citação do réu para contestar, nos termos do n.º 2 do artigo 1.º 
 
3 - Recebidos os autos, o juiz pode convidar as partes a aperfeiçoar as pe­ças processuais. 
 
4 - Se os autos forem apresentados à distribuição em virtude de dedução de oposição cuja falta de fundamento o réu não devesse ignorar, é este condenado, na sentença referida no n.º 7 do artigo 4.º, em multa de montante igual a duas vezes o valor da taxa de justiça devida na acção declarativa. 
 
Importa assim concluir da leitura destes preceitos que a injunção é reme­tida à distribuição, seguindo os termos da AECOPEC no caso de ter sido deduzida oposição e nos casos em que tendo sido frustrada a notificação do requerido o requerente tenha manifestado essa pretensão ou ainda sempre que se suscite questão sujeita a decisão judicial - art.º 16º n.º 2.
 
Do regime da injunção resulta que uma vez remetido esse procedimento à distribuição nos termos do n.º 1 do art.º 16º segue-se, com as necessárias adaptações, o disposto no n.º 4 do artigo 1.º e nos artigos 3.º e 4., ou seja,remetendo-se o duplicado da contestação ao autor simultaneamente com a notificação da data da audiência de julgamento – art.º 1º, n.º 4 – ou observando-se o disposto nos artigos 3º e 4º, nada se encontrando previsto para o caso da remessa à distribuição ter ocorrido por circunstância que se encontre no âmbito de aplicação do n.º 2, do art.º 16º. Em casos destes é manifesto não ter aplicação o mesmo regime que se encontra previsto para os casos de remessa à distribuição nas situações previstas no n.º 1 do art.º 16º, exceptuando o caso de se estar face a uma reclamação de não recebimento de oposição e a decisão for de julgar essa reclamação procedente, uma vez que qualquer decisão não abrangida pela reclamação pertence ao secretário judicial. 
 
Da conjugação dos preceitos citados e de toda a filosofia subjacente ao procedimento de injunção entendemos que a sua remessa à distribuição mencionada no art.º 16º, n.º 2 não o transmuta definitivamente em AECOPEC, constituindo somente um modo de o atribuir a um juiz que aprecie a questão colocada, devendo ser devolvido ao secretário judicial após apreciação da mesma que continuará a sua tramitação como procedimento de injunção. Esta posição é, na doutrina, defendida por Carlos Gil [1] e João Raposo e Luís Carvalho [2], merecendo posição oposta Salvador da Costa [3]. 
 
A remessa do requerimento de injunção à distribuição no caso dos autos tinha a finalidade exclusiva do juiz apreciar jurisdicionalmente a reclamação apre­sentada, devendo, segundo o nosso entendimento, devolvê-lo após prolação dessa decisão ao secretário judicial para aposição da fórmula executória, a qual conjunta­mente com o requerimento de injunção constituiria título executivo.
 
Os regimes e tramitação da acção declarativa e do requerimento de injun­ção não permitem que se trate de igual modo no caso de não dedução de oposição, conforme decorre do art.º 2º que pressupõe a ausência de contestação e a citação do Réu, formalidade que não se cumpre no procedimento de injunção.
 
Já quanto ao requerimento de injunção é pressuposto, para que o juiz de­cida, que tenha havido oposição – devendo entender-se esta como processualmente válida – ou que o requerido não tenha sido notificado e o requerente tenha requerido a remessa do mesmo à distribuição como acção.
 
No caso que nos ocupa, tendo-se decidido que a oposição era extemporâ­nea, mandando-se desentranhar a mesma, tudo de deveria ter passado como se nunca tivesse sido deduzida oposição, ou seja, deveria o procedimento ser devolvido ao secretário judicial para oposição da fórmula executória, a qual conjuntamente com o requerimento de injunção constituiria título executivo.
 
Perante a verificação de uma causa impeditiva equivalente à falta de dedu­ção de oposição, o procedimento deveria ser devolvido a quem tinha competência para o tramitar em conformidade com o regime aplicável – secretário judicial – uma vez que não se verificava o pressuposto de apreciação judicial do requerimento de injunção que tem, até à aposição da fórmula executória ou remessa à distribuição como acção, natureza administrativa. [4]
 
O juiz não tinha competência para proferir a decisão que proferiu pois só teria poder jurisdicional para tal em qualquer uma das situações referidas no art.º 16º, n.º1, que pressupõe quanto à dedução da oposição que a mesma seja tempestiva.
 
Notas: 
 
[1] Algumas Notas sobre os Decretos-Leis n.º 269/98 e 274/97, ed. do Centro de Estudos Judiciários, Julho de 2000, constando a pág. 32: 

Nos casos de remessa à distribuição dos autos de injunção para decisão judicial de uma questão que deva por esta forma ser conhecida, importa determinar o destino dos autos após a decisão judicial da questão que determinou tal remessa.

A questão que se coloca é assim a de saber se o procedimento continua após a decisão judicial, onde foi distribuído ou, pelo contrário, se é remetido à secretaria judicial competente, após tal decisão judicial. A razão determinante da remessa à distribuição nestes casos é o surgimento de uma questão que carece de ser resolvida judicialmente. Resolvida tal questão, nenhuma razão se divisa para que o procedimento permaneça onde foi distribuído. Após tal decisão judicial desaparece o entrave que determinou a distribuição, podendo, a nosso ver, o procedimento de injunção prosseguir os seus termos na secretaria judicial.

[2] Injunções e Ações de Cobrança, Quid Juris, ed. 2012. Estes autores a pág. 141 escrevem:

Coloca-se a questão de saber se no cado de a distribuição ocorrer por força da necessidade de resolução de questões jurisdicionais há ou não há lugar à transmutação de injunção em acção declarativa.

Entendemos que não. Resolvidas que sejam as questões jurisdicionais suscitadas deverão os autos ser remetidos ao secretário judicial, nomeadamente para aposição da fórmula executória.

Vejamos o seguinte exemplo:

O secretário judicial suscita ao juiz uma questão que, na sua perspectiva, conduziria à recusa da oposição da fórmula executória mas que, atenta a respectiva natureza (substantiva), o secretário sobre ela não se pode pronunciar; 

O juiz, por seu lado, decide a questão no sentido de que, no caso, nada obsta à aposição da fórmula executória.

Não tendo havido oposição e não havendo qualquer razão para que não seja aposta a referida fórmula executória, não faz sentido que o procedimento se tenha transmutado e não seja remetido ao secretário judicial.
 
[3] A Injunção e as Conexas Acção e Execução, Almedina, ed. 2005, pág. 249-250:
 
Dir-se-á, porventura, que não se encontra justificação para que resolvidas as referidas questões jurisdicionais, o procedimento de injunção continue afecto ao órgão jurisdicional ao qual foi distribuído para efeito de prolação de uma decisão incidental nela integrada.

Nessa perspectiva, poderia pensar-se que, uma vez transitado em julgado a decisão concernente às referidas questões, deviam os autos ser remetidos ao secretário de justiça a fim de na respectiva secretaria continuarem os seus ulteriores e regulares termos.

Não é esse, porém, o que resulta da lei, certo que o procedimento de injunção só comporta actividade meramente administrativa por parte do secretário de justiça, o que implica a sua distribuição como acção declarativa de condenação especial quando se se suscite alguma questão jurisdicional, salvo a que derivar da recusa da distribuição a que se reposta o artigo 11.º, n.º 2.

No mesmo sentido os acórdãos do T. R. P. de 16.5.2005 relatado por Fonseca Ramos e do T. R. L. de 30.1.2007 relatado por Isoleta Almeida Costa, acessíveis em www.dgsi.pt .

No acórdão do T. R. P. de 11.3.2013 relatado por Carlos Querido embora sem o dizer expressamente também nos parece ter-se aderido a esta posição.

[4] Tem sido unanimemente defendido que o procedimento de injunção se trata de um processo de natureza administrativa, ver entre outros os acórdãos do T. R. C. de 27.5.2015 relatado por Isabel Silva, do T. R. L. de 14.10.2010 relatado por António Valente e do S. T. A. de 14.4.2016 relatado por José Veloso, todos acessíveis em www.dgsi.pt
 
3. [Comentário]  O que está em causa é saber se, tendo o secretário do tribunal suscitado uma questão sujeita a decisão judicial e distribuídos os autos nos termos do art. 16.º, n.º 2, RPOP, o processo volta à secretaria do tribunal depois de o juiz ter apreciado a questão.

Após a submissão dos autos do procedimento de injunção à distribuição, as soluções possíveis são, naturalmente, as seguintes: a distribuição implica a conversão definitiva do procedimento de injunção em AECOP ("solução global"); a distribuição é limitada à apreciação e decisão da questão suscitada pelo secretário do tribunal ("solução casuística").
 
O disposto no art. 17.º, n.º 1 e 2, RPOP parece dar apoio à "solução casuística" através de um argumento a contrario: se é apenas nos casos em que a distribuição se realizou nos termos do art. 16.º, n.º 1, RPOP que se aplica o regime da AECOP, então, quando a distribuição se verificou com base no estabelecido no art. 16.º, n.º 2, RPOP, não se aplica o regime da AECOP.
 
MTS