"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



20/10/2017

Jurisprudência (709)


Embargos de terceiro; 
função preventiva; âmbito de aplicação


1. O sumário de STJ 30/3/2017 (149/09.4TBGLG-E.E1-A.S1) é o seguinte:

I. O disposto no art. 350º do CPC, sobre a oportunidade dos embargos de terceiro, não é aplicável à diligência de entrega efectiva do bem que, depois de ter sido objecto de penhora no âmbito de acção executiva, é vendido ou adjudicado.

II. O contrato de comodato atribui ao comodatário um direito pessoal de gozo, mas, atenta a eficácia relativa do contrato, esse direito é inoponível ao que adquire o bem da esfera do comodante.

III. No âmbito da acção executiva para pagamento de quantia certa são inadmissíveis os embargos de terceiro apresentados pelo comodatário para impedir a entrega do bem ao adquirente a quem foi transmitido.

2. Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:

"1. Defendem os embargantes que aos embargos com função preventiva não é aplicável o regime de caducidade previsto no art. 344º, nº 2, do CPC, que impede a sua dedução depois de terem sido vendidos ou adjudicados os bens, sendo tempestivos sempre que sejam apresentados antes de realizada, mas depois de ordenada a diligência, nos termos do art. 350º, nº 1.

Concorda-se com tal afirmação, o que não significa que a mesma seja aplicável ao caso sub judice.

Na verdade, o campo de aplicação do art. 350º, nº 1, é limitado aos actos de penhora, apreensão ou entrega de bens ordenados em qualquer processo judicial, mas não se confundem com a operação de entrega do bem cuja venda ou adjudicação a favor de terceiro seja realizada no âmbito de processo de executivo.

Tal meio de defesa pode ser deduzido antes de ser realizada a entrega de bem no âmbito de acção para entrega de coisa certa (como ocorreu no caso que foi apreciado no Ac. do STJ, de 9-2-06, em www.dgsi.pt, referido pelo recorrente), mas não existe motivo algum para equiparar a essa diligência o acto de entrega do bem cuja propriedade tenha sido transmitida ao exequente ou a terceiro no âmbito de acção executiva para pagamento de quantia certa, depois de ter sido realizada a penhora do bem.

Nestas situações o acto que em abstracto poderia ser invocado pelos terceiros embargantes seria o acto de penhora, na medida em que pusesse em causa a posse ou algum direito incompatível com a sua realização.

Nos termos do art. 747º do CPC, a diligência de penhora implica a apreensão dos bens e, quando incida sobre bens imóveis, deve ainda traduzir-se na posse efectiva por parte do depositário que seja designado para o efeito, nos termos dos arts. 757º, nº 1, e 756º, nº 1, do CPC.

A este respeito Duarte Pinheiro conclui que “é segura a extemporaneidade da acção de embargos preventivos após a venda judicial ou a adjudicação dos bens sobre os quais recaía a posse que a penhora ameaçava ofender …” (Fase Introdutória dos Embargos de Terceiro, pág. 51).

Como no caso concreto foi efectuada a penhora do imóvel e foi adjudicada ao exequente a sua propriedade, não há motivo algum para excluir dos embargos com função preventiva a norma geral do art. 344º, nº 2, cuja aplicação é ressalvada pelo art. 350º, nº 1, da qual deriva a inadmissibilidade dos embargos depois de o bem ter sido adjudicado ou vendido."

[MTS]