"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



05/01/2018

Jurisprudência (763)


Despejo; oposição;
taxa de justiça


1. O sumário de RC 12/9/2017 (686/16.4T8CBR.C1) é o seguinte:
 
I – Preceitua o art.15º-F, n.º 3, da Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro (NRAU), que com a oposição deve o (a) requerido (a) proceder à junção do documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida e, nos casos previstos nos n.º 3 e 4 do art.1083º do C Civil, ou seja quando o fundamento consista na falta de pagamento de rendas, o (a) requerido (a) deve ainda proceder ao pagamento de uma caução no valor das rendas, encargos ou despesas em atraso, até ao valor máximo correspondente a seis rendas, salvo nos caso de apoio judiciário, em que está isento, nos termos a definir por portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça.

II - A falta de cumprimento do disposto no n.º 3 é cominada com a desconsideração da oposição, a lei diz
”…a oposição tem-se por não deduzida” (cfr. n.º 4 do cit.º art.15º-F).

III - O art.º 1083º, n.ºs 3 e 4, do C Civil prevê como fundamento de resolução do contrato de arrendamento a mora, superior a dois meses, no pagamento de rendas e encargos, e a superior a oito dias, por mais de 4 vezes seguidas ou interpoladas, num período de doze meses.

IV - Da leitura do n.º 3 do artº 15º-F da Lei n.º 6/2006 resulta que o legislador utilizou o termo ‘
deve’ e não o termo ‘pode’, o que implica que o (a) demandado (a) tem no momento da apresentação da oposição efectuar o pagamento da taxa de justiça e respectiva caução, ou caso tenha pedido apoio judiciário referi-lo, comprovando-o, ainda que aguarde decisão sobre o mesmo (sendo que quanto à caução existem duas correntes jurisprudências: uma corrente que defende que beneficiando de apoio judiciário na modalidade de dispensa da taxa de justiça e demais encargos com o processo, o arrendatário está isento de demonstrar o pagamento da caução a que alude o referido art.º 15.º F do NRAU, exigida como condição de admissibilidade da oposição ao pedido de despejo; outra no sentido de que a concessão do apoio judiciário ao arrendatário apenas o isenta do pagamento da taxa de justiça devida e não também do depósito da caução no valor das rendas em atraso.

V - O termo
deve utilizado no art.15º-F, n.º 3, da Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro (NRAU), só pode significar que o demando (a), no prazo dos 15 dias aludidos no n.º 1 do preceito, tem de apresentar a oposição, pagar a taxa de justiça ou comprovar que já solicitou o pedido de apoio judiciário, e no caso dos n.ºs 3 e 4 do art.º 1083 do C. Civil depositar a caução, aqui consoante a posição defendida a respeito da concessão de apoio judiciário.

VI - Os n.º 3 e 4 do art.º 15º-F do NRAU são incompatíveisl com o art.º 570º do C.P.C., tanto mais que o PED não é uma acção de despejo, mas sim um procedimento especial de despejo como o próprio nome indica.
 
2. Na fundamentação do acórdão escreve-se o seguinte:
 
"3.1. É, em principio, pelo teor das conclusões do/a recorrente que se delimitam as questões a apreciar no âmbito do recurso (cfr. art.s 608, n.º 2, 635, n.º 4 e 639, todos do C.P.C.).

A questão a decidir consiste em saber se a sentença recorrida deve ser revogada a substituída por outra que, admitindo nos autos a oposição apresentada, ordene o prosseguimento dos autos.

A recorrente para sustentar este seu ponto de vista assenta em dois pressupostos, a saber:

Violação do art.º 20 da Constituição da República Portuguesa e subsidiariamente violação do art.º 570, n.º 2, do C.P.C. e a consequente nulidade. [...]

Chegados aqui cabe verificar se o tribunal “a quo” violou o preceituado no n.º 2, do art.º 570 do C.P.C.

Segundo a recorrente nos termos do artigo 570.º, n.º 5 do C.P.C. não sendo comprovado nos autos o pagamento da taxa de justiça, deveria ter sido notificada para liquidar a taxa de justiça no prazo de dez dias, com o acréscimo de multa de igual montante.

A questão, consiste em saber se o preceito em causa se aplica ao caso dos autos, temos para nós, que não.

Preceitua o art.15º-F, n.º 3, da Lei n.º6/2006, de 27 de Fevereiro (NRAU), que com a oposição, deve o (a) requerido (a) proceder à junção do documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida e, nos casos previstos nos n.º 3 e 4 do art.1083º do C Civil, ou seja quando o fundamento consista na falta de pagamento de rendas, o (a) requerido (a) deve ainda proceder ao pagamento de uma caução no valor das rendas, encargos ou despesas em atraso, até ao valor máximo correspondente a seis rendas, salvo nos caso de apoio judiciário, em que está isento, nos termos a definir por portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça.

A falta de cumprimento do disposto no n.º 3 é cominada com a desconsideração da oposição, a lei diz”…a oposição tem-se por não deduzida” (cfr. n.º 4 do cit.º art.15º-F).

O art.º 1083º, n.ºs 3 e 4, do C. Civil, prevê como fundamento de resolução do contrato de arrendamento a mora, superior a dois meses, no pagamento de rendas e encargos, e a superior a oito dias, por mais de 4 vezes seguidas ou interpoladas ,num período de doze meses.

Da leitura do n.º 3 do artº 15º-F da Lei n.º 6/2006 resulta que o legislador utilizou o termo deve e não o termo pode, o que implica que o(a) demandado(a) tem no momento da apresentação da oposição efectuar o pagamento da taxa de justiça e respectiva caução ou caso tenha pedido apoio judiciário referi-lo, comprovando-o, ainda que aguarde decisão sobre o mesmo (sendo que quanto à caução existem duas correntes jurisprudências, uma corrente que defende que, beneficiando de apoio judiciário na modalidade de dispensa da taxa de justiça e demais encargos com o processo, o arrendatário está isento de demonstrar o pagamento da caução a que alude o referido art.º 15.º F do NRAU, exigida como condição de admissibilidade da oposição ao pedido de despejo (cfr. neste sentido foi decidido nos acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 10-02-2015, Proc.º n.º 1958/14.8YLPRT.L1-1, relatado por Isabel Fonseca, de 19-02-2015, Proc.º n.º 4118/14.4TCLRS.L1.-2, relatado por Ezaguy Martins, de 28-04-2015, Proc.º n.º 1945/14.6YLPRT-A.L1-7, relatado por Rosa Ribeiro Coelho e de 26-04-2016, Proc.º n.º 4024/15.5YLPRT.L1-7, relatado por Cristina Coelho. Também no mesmo sentido Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 03-03-2016, Proc.º n.º 3055/15.YLPRT.P1, relatado por Leonel Serôdio. E outra no sentido de que a concessão do apoio judiciário ao arrendatário apenas o isenta do pagamento da taxa de justiça devida e não também do depósito da caução no valor das rendas em atraso (cfr. neste sentido vide o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 25-09-2014, Proc.º n.º 1091/14.2YLPRT-A.E1, relatado por Canelas Brás, e Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 17-12-2015, Proc.º n.º 274/15.2YLPRT.L1-2, relatado por Jorge Leal, e de 2 de Junho de 2016 – Proc. N.º 1347/15.7YLPRT.L1.6, relatado por Maria de Deus Correia).

No sentido de que o termo deve implica obrigatoriedade (cfr. Ac. do S.T.J. de 14 de Dezembro de 2016 – 5440/15.T8PRT-B.7, relatado por António da Silva Gonçalves, onde se escreve a respeito do art.º 104 do EOA “O elemento filológico de interpretação tirado do sentido das palavras que integram o texto descrito no n.º 1 do art.º 104.º do EOA, (…) o advogado com inscrição em vigor deve celebrar e manter um seguro de responsabilidade civil profissional (…)- aponta no sentido da obrigatoriedade do seguro do Advogado no exercício do seu cargo, mais precisamente que tem natureza imperativa o seguro de responsabilidade civil do advogado prescrito no seu estatuto.

Se assim não fosse, em lugar do termo “deve” (está obrigado) o legislador teria recorrido ao vocábulo “pode” (direito de deliberar, agir, mandar); e só nesta última locução se poderia retratar o sentido de que o seguro de responsabilidade civil de advogado é de natureza facultativa).

Ou seja, o termo “deve” utilizado no art.15º-F, n.º 3, da Lei n.º6/2006, de 27 de Fevereiro (NRAU) só pode significar que o demando (a), no prazo dos 15 dias aludidos no n.º 1 do preceito, tem de apresentar a oposição, pagar a taxa de justiça ou comprovar que já solicitou o pedido de apoio judiciário, e no caso dos n.ºs 3 e 4 do art.º 1083 do C. Civil depositar a caução, aqui consoante a posição defendida a respeito da concessão de apoio judiciário.

Assim, o n.º 3 e 4 do art.º 15-F do NRAU é incompatível com o art.º 570 do C.P.C., tanto mais que o PED não é uma acção de despejo, mas sim um procedimento especial de despejo como o próprio nome indica.

No sentido de que o art.º 570 do C.P.C. é incompatível com o art.º 15 –F do NRAU - cfr. Ac. da Rel. de Lisboa de 1 de Abril de 2014 – 2095/13.8YLPRT.L1.1, relatado por Teresa Jesus Ribeiro de Sousa Henriques onde se escreve “(…) Ora o PED não é uma acção de despejo. É, como o nome indica , um procedimento especial que seguia, na ocasião, a forma de processo sumaríssimo (cfr. art.º 222º do CPC revogado, na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 31/2012, de 14-08). O NRAU distingue entre acção de despejo e procedimento especial de despejo. (cfr. art.14º e 15º).

A notificação efectuada ao abrigo do art.570º,n.º3 e 4,do CPC colide com o disposto no n.º4 do art.15º-F do NRAU.

Verificada a falta de pagamento da taxa de justiça impunha-se considerar a oposição como “não deduzida”.

E o mesmo se diz quanto à falta de pagamento da caução.

É o que resulta do supra referido art.15º-F.

A prática deste acto (despacho a ordenar a notificação da apelante para o disposto no art.º 570º do CPC) é susceptível de influir na decisão da causa, uma vez que a desconsideração do oposição tem como efeito imediato a conversão do despejo em título para desocupação do locado(cfr.art15º-E, al.ª b) do NRAU.

E constitui nulidade que, não constando do elenco previsto no art.196º do CPC, não é de conhecimento oficioso, ou seja, carece de ser arguida no termos art.199º do CPC.

A apelada foi notificada da sentença impugnada, que menciona com detalhe a oposição, tomando conhecimento, pelo menos nessa ocasião, da irregularidade cometida, ou seja a aceitação indevida da dita oposição.

E nada disse, limitando-se a contra-alegar, o que ocorreu muito depois dos dez dias previstos na lei. (…)”.

Assim, e face ao exposto também nesta vertente a pretensão da recorrente tem de improceder.

Improcedendo os dois pontos onde a recorrente assenta o seu ponto de vista para pedir a continuação dos autos a sua pretensão em ver revogada a sentença recorrida e substituída por outra que determina a continuação dos autos tem de improceder."
 
[MTS]