"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



31/01/2018

Jurisprudência (781)



Citação; interrupção da prescrição;
ficção da citação



1. O sumário de RP 16/10/2017 (1894/12.2TBGMR-A.P1) é o seguinte:

I - A ficção legal estabelecida no nº 2 do artigo 323º do C.C. pressupõe que o prazo prescricional ainda esteja a decorrer e assim se mantenha nos cinco dias posteriores à propositura da ação; que a citação não tenha sido efectuada nesse prazo de cinco dias; e que o retardamento na efetivação da citação não seja imputável ao requerente.

II - A indicação de bens a penhorar, nos termos em que a prevê o artigo 724º, nº 1, alínea i), do C.P.C., reveste a natureza de menção facultativa ou eventual do requerimento executivo.

2. Na fundamentação do acórdão escreveu-se o seguinte:

"II. Estabelece o artigo 70º da LULL que todas as ações contra o aceitante relativas a letras prescrevem em três anos a contar do seu vencimento.

Por sua vez, dispõe o artigo 323º do C.C. que a prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer ato que exprima, direta ou indiretamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o ato pertence e ainda que o tribunal seja incompetente – nº 1.

Porém, se a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias – nº 2.

Dado que letra apresentada tem a data do seu vencimento em 15.6.2009, o prazo de prescrição ocorreria a 16.6.2012 e, tendo a exequente proposto a execução em 12.5.2012, deve ter-se tal prescrição por interrompida decorridos cinco dias após, ou seja, a 17.5.2012, uma vez que a citação do executado apenas foi concretizada posteriormente (14.5.2014).

A interrupção da prescrição a 17.5.2012 só poderá ser considerada, no entanto, se a falta de citação nos cinco dias posteriores à propositura da execução, se tiver ficado a dever a causa não imputável à exequente.

A ficção legal estabelecida no nº 2 do citado artigo 323º do C.C. pressupõe que o prazo prescricional ainda esteja a decorrer e assim se mantenha nos cinco dias posteriores à propositura da ação; que a citação não tenha sido efetuada nesse prazo de cinco dias; e que o retardamento na efetivação da citação não seja imputável ao requerente.

A expressão “causa não imputável ao requerente” deve ser interpretada «em termos de causalidade objetiva, ou melhor, a conduta do requerente só exclui a interrupção da prescrição quando tenha infringido objetivamente a lei em qualquer termo processual e até à verificação da citação». Acórdão do STJ, de 20.5.1987, BMJ 367, pág. 483.

Contrariamente ao sustentado pelo executado/apelante, pensamos que o retardamento na efetivação da sua citação não pode ser imputado à exequente e, portanto, deve considerar-se verificada a ficcionada interrupção da prescrição prevista no nº 2 do artigo 323º do C.C.

É que, contrariamente ao defendido pelo executado/apelante, a exequente não tinha a obrigação legal de indicar bens à penhora no requerimento executivo.

Iremos fazer referência às normas do anterior C.P.C., dado que, tratando-se de questão relativa ao requerimento executivo duma execução iniciada na vigência daquele, o novo diploma não é aplicável, conforme se estabelece no nº 3 do artigo 6º da Lei nº 41/2013, de 26 de Junho.

Quanto ao requerimento inicial executivo, o artigo 810º, nº 1, alínea i), do anterior C.P.C., refere que o exequente «indica, sempre que possível, o empregador do executado, as contas e os bens deste, bem como os ónus e encargos que sobre eles incidam».

Trata-se, na terminologia de Lebre de Freitas, de uma das menções, facultativas ou eventuais, do requerimento executivo, referindo que «apesar de eventual, esta indicação deve ser feita “sempre que possível”, no interesse do próprio exequente». A Ação Executiva Depois da Reforma, 4ª edição, págs. 158 e 159.

E o artigo 724º, nº 1, alínea i), do atual C.P.C., no que toca à indicação dos bens a penhorar, com algumas alterações de redação, manteve a mesma natureza de menção, facultativa ou eventual, do requerimento executivo. cfr. Lebre de Freitas, A Ação Executiva À Luz do Código de Processo Civil de 2013, 6ª edição, pág. 183.

Ou seja, o facto da exequente Banco B…, S.A., não ter indicado bens penhoráveis no requerimento executivo em nada pode ter afetado o regular andamento da execução, tanto mais que a lei processual nem sequer lhe impunha a obrigação de proceder a tal indicação.

O retardamento na efetivação da citação do executado não é, pois, imputável à exequente, mas a razões de ordem judiciária e processual e, por conseguinte, considera-se interrompida a prescrição no quinto dia posterior à propositura da execução, ou seja, a 17.5.2012, cerca trinta dias antes do termo do prazo daquela (16.6.2012)."

[MTS]