Erro na forma do processo;
suprimento; dever do tribunal
1. O sumário de RP 18/9/2017 (3411/04.9TVPRT-C.P1) é o seguinte:
I - Entendemos a penhora como a actividade prévia à venda ou à realização da prestação que consiste na apreensão, pelo Tribunal, de bens do executado ou na colocação à sua ordem de créditos deste valor sobre terceiros e na sua afectação ao pagamento do exequente.
II - É dever das partes e do tribunal, cooperar entre si na resolução do conflito de interesses subjacente à acção, vinculando-se reciprocamente, desdobrando-se, no tocante ao Tribunal, nos deveres de esclarecimento, de auxílio e de prevenção, entendido e tendo este por finalidade em evitar que o êxito de qualquer pretensão de qualquer das partes possa frustrar-se pelo uso inadequado do processo.
III - Conquanto o requerimento apresentado pelo executado, não tenha sido autuado como Oposição à penhora, em razão do desacerto do executado, o Tribunal a quo deverá convolar o requerimento apresentado, num requerimento inicial de Oposição à penhora, impondo-se o seu tratamento jurídico como um incidente que corre por apenso à execução comum, dando satisfação ao prevenido na lei adjectiva civil que estabelece que o erro na qualificação do meio processual utilizado pela parte é corrigido oficiosamente pelo juiz.
2. Na fundamentação do acórdão escreveu-se o seguinte:
"[...] O Tribunal a quo ao proferir despacho liminar, concluindo que os factos alegados a fls. 282, 283, 287 a 289, apenas poderiam ser invocados em sede de oposição à penhora, a qual não foi, no entanto, deduzida, e, nessa medida, nada haveria a determinar, deixou de fazer uma correcta aplicação das normas de direito aplicáveis à impenhorabilidade da pensão de invalidez, condizente ao limite mínimo de montante equivalente a um salário mínimo? [...]
Atendendo às conclusões do recurso que nos cumpre apreciar, resulta inequívoco que é contra o despacho que liminarmente rejeitou, por erro na forma do processo, o conhecimento da arguida oposição à penhora de crédito, sustentando o executado/B... que a consignada penhora de 1/3 da sua pensão de aposentação por invalidez, viola as regras da impenhorabilidade do limite mínimo de montante equivalente a um salário mínimo.
Cumpre observar, antes de mais, que, o requerimento em causa, consubstancia, no essencial, uma oposição à penhora, subsumível à previsão do artº. 784.º, nº. 1 a), do Código Processo Civil que prescreve “Sendo penhorados bens pertencentes ao executado, pode este opor-se à penhora com algum dos seguintes fundamentos: a) Inadmissibilidade da penhora dos bens concretamente apreendidos ou da extensão com que ela foi realizada”.
O requerimento do executado/B... evidencia uma divergência básica com as regras adjectivas civis na medida em que apresenta requerimento em Juízo, integrado na acção executiva comum, sendo manifesto que o fundamento invocado releva, no essencial, a oposição à penhora, por alegada impenhorabilidade do crédito do executado, nos termos da lei adjectiva já consignada, concluindo pelo levantamento da ordenada penhora.
O requerimento que cumpre conhecer, não foi, mas devia ter sido autuado como Oposição à penhora, induzido pelo descuido do executado/B... ao ter qualificado, erradamente, a arguição de oposição, por alegada inadmissibilidade da penhora, traduzida na respectiva impenhorabilidade.
Assim sendo, nos termos da lei adjectiva civil (artº. 193º nº. 3 do Código Processo Civil) o erro na qualificação do meio processual utilizado pela parte é corrigido, oficiosamente, pelo juiz, determinando que se sigam os termos processuais adequados, pelo que, o Tribunal não poderá deixar de apreciar a oposição à penhora, erigida pelo executado/B..., no seu requerimento.
Conquanto o requerimento apresentado pelo executado/B..., não tenha sido autuado como Oposição à penhora, em razão do desacerto do executado/B..., na respectiva qualificação, temos de convir que o Tribunal a quo deveria ter convolado o requerimento apresentado num requerimento inicial de Oposição à penhora, impondo-se o seu tratamento jurídico como um incidente que corre por apenso à execução comum, dando satisfação ao prevenido na lei adjectiva civil que estabelece que o erro na qualificação do meio processual utilizado pela parte é corrigido oficiosamente pelo juiz, determinando que se sigam os termos processuais adequados - artº. 193º, nº. 3, do Código Processo Civil – importando, assim, ter o Tribunal a quo omitido um acto que produz nulidade, na medida em que a irregularidade, alegadamente cometida, pode influir no exame ou na decisão da causa.
Ademais, cumpre sublinhar que, incumbe ao juiz, sem prejuízo do ónus de impulso especialmente imposto pela lei às partes, dirigir activamente o processo e providenciar pelo seu andamento célere, promovendo oficiosamente as diligências necessárias ao normal prosseguimento da acção, recusando o que for impertinente ou meramente dilatório, e, ouvidas as partes, adoptar mecanismos de simplificação e agilização processual que garantam a justa composição do litígio em prazo razoável, conforme estatuido no nº. 1, do artº. 6º, do Código Processo Civil.
O Tribunal não pode desprezar o princípio da cooperação intersubjectiva, enquanto princípio instrumental que procura optimizar os resultados do processo. [...]
Neste contexto, a actuação do Tribunal manifesta–se, não na discricionariedade do juiz em deferir ou indeferir determinada pretensão juridica, sem fundamentação, mas contribuir para o esclarecimento dos factos e prossecução da verdade material.
Assim, merece censura o despacho recorrido que, face ao requerimento de fls. 282, 283, 287 a 289, junto aos autos de execução comum, concluiu que nada há a determinar a esse respeito, uma vez que os factos em causa apenas poderiam ser invocados em sede de Oposição à penhora."
[MTS]