"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



17/10/2022

Jurisprudência 2022 (45)


Excepção de caso julgado; absolvição da instância;
dupla conforme*


1. O sumário de STJ 22/2/2022 (577/14.3TBALR-E.E1.S1) é o seguinte:

I - Não havendo o recorrente colocado em crise os factos considerados pelo juiz a quo para fundamentar a sua decisão de absolvição da instância dos réus, nem tendo tido lugar sequer qualquer tipo de produção de prova em sede de julgamento cuja reapreciação fosse pedida perante o tribunal da Relação, em termos da sua impugnação ao abrigo do disposto no art. 640.º, n.os 1 e 2, do CPC, limitando-se a parte a sustentar que, para além dos factos considerados, há outros por si alegados que permitiriam proferir decisão oposta relativamente à afirmada violação da autoridade do caso julgado, não se verifica utilização incorrecta dos poderes em matéria de facto conferidos à 2.ª instância pelo art. 662.º do CPC.

II - Com efeito, apenas foi questionado o fundamento jurídico substantivo que alicerçou a decisão de violação da autoridade do caso julgado em face a todos os elementos que os autos forneciam na fase do seu saneamento, entendendo a recorrente que a conclusão a extrair deveria ser a contrária daquela que foi proferida pela 1.ª instância.

III - Esta decisão de mérito, constante do acórdão recorrido e pertinente ao âmbito estritamente jurídico da causa, traduz tão somente a integral confirmação da análise já realizada em 1.ª instância, bem como da solução jurídica consequentemente adoptada, nas quais o tribunal da Relação inteiramente se louvou.

IV - Ora, constando dos autos todos os factos invocados pelo recorrente, o tribunal da Relação poderia tê-los considerado se não tivesse entendido suficientes e relevantes para suportar a decisão de 1.ª instância precisamente aqueles que esta elencou, não conferindo destaque bastante aos restantes (exactamente pela mesma razão que motivou o juiz a quo a estribar-se na suficiência desses elementos), constituiu-se assim dupla conforme nos termos do art. 671.º, n.º 3, do CPC, impeditiva da interposição de revista normal prevista no art. 671.º, n.º 1, do CPC, restando ao recorrente a figura da revista excepcional, prevista no art. 672.º do CPC, de que, igualmente e a título subsidiário, se socorreu.


2. Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:

"Não assiste a menor razão ao recorrente quando pugna pela admissibilidade da sua revista.

O seu recurso assenta na (alegada) utilização incorrecta pelo Tribunal da Relação dos seus poderes em matéria de facto, nos termos gerais do artigo 662º do Código de Processo Civil.

Acontece que nos presentes autos não houve lugar à realização da audiência de julgamento, com a produção da prova oferecida pelas partes.

Ao invés, na fase do saneamento dos autos, o juiz a quo entendeu, pelo conjunto de todos os elementos de que dispunha, que a pretensão da A. violava a autoridade de caso julgado, absolvendo o Réu da instância, no que foi acompanhado pelo acórdão recorrido, sem fundamentação essencialmente divergente.

Ou seja, é claro e insofismável que se constituiu dupla conforme nos termos do artigo 671º, nº 3, do Código de Processo Civil, impeditiva da interposição de revista normal prevista no artigo 671º, nº 1, do Código de Processo Civil.

A única via para a possibilidade do conhecimento pelo Supremo Tribunal de Justiça da presente revista consiste na figura da revista excepcional, genericamente prevista no artigo 672º do Código de Processo Civil, de que a recorrente igualmente, e a título subsidiário, se socorreu.

Em suma, havendo dupla conforme não é admissível a interposição de revista normal nos termos do artigo 671º, nº 1, do Código de Processo Civil, competindo à Formação ajuizar da admissibilidade da revista excepcional em conformidade com o disposto no artigo 672º, nº 3, do Código de Processo Civil.

Oportunamente, serão os autos enviados à Formação.

Pelo exposto, acordam, em Conferência, os juízes do Supremo Tribunal de Justiça (6ª Secção) em considerar a inadmissibilidade da revista normal e ordenar a remessa dos autos à Formação, nos termos e para os efeitos do artigo 672º, nº 3, do Código de Processo Civil, para apreciação dos pressupostos da revista excepcional."

*3. [Comentário] A remessa para a formação para apreciação dos pressupostos da revista excepcional é justificada pela circunstância de o Recorrente ter interposto, a título subsidiário, esse recurso. Sem esta interposição subsidiária, a conferência deve limitar-se a reconhecer a dupla conforme.

MTS