"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



10/04/2015

Jurisprudência (115)


Penhora; substituição por caução


1. O sumário de RP (dec. sum.) 19/3/2015 (5150/10.2TBVNG-C.P1) é o seguinte: 

I - O n.º 7 do art.751.º do CPC não impõe que o executado requeira a substituição da penhora por caução em simultâneo com o requerimento de oposição à penhora. 

II - Enquanto estiverem pendentes os embargos de executado, o executado pode requerer a substituição da penhora por caução idónea, sendo que o objectivo do legislador quando passou a permitir essa possibilidade, foi admitir que as penhoras efectuadas fossem substituídas por caução e levantar-se com a sua prestação.

2. Da fundamentação da decisão constam as seguintes passagens:

"A questão passa pela interpretação do n.º 7 do art. 751.º do CPC, na redacção da Lei n.º 41/2013, de 26.06, que estipula: “O executado que se oponha à execução pode, no ato da oposição, requerer a substituição da penhora por caução idónea que igualmente garanta os fins da execução.”

Este normativo corresponde
ipsis verbis ao art. 834.º, n.º 5, do CPC, na redacção introduzida pelo DL n.º 38/2003, de 08.03.
 
Antes de ter sido introduzido o n.º 5 do art. 834, que passou a ser o n.º 6 do mesmo art. na redacção dada pelo DL n.º 226/2008 [...] o anterior regime do CPC, mesmo após a reforma de 95/96 não previa a prestação de caução com a finalidade de substituição da penhora. [...]

Como se referiu o DL n.º 38/2003, ao introduzir o n.º 5 ao art. 834.º, passou a prever a possibilidade de o executado requer a substituição da penhora por caução idónea. [...]

O elemento literal do citado n.º 7 do art. 751.º do CPC (anterior n.º 5 e depois 6 do art. 834.º) aponta no sentido de que o requerimento de substituição da penhora por caução idónea tem de ser formulada em simultâneo com o requerimento de oposição à penhora. 

Contudo, decorre do art. 9.º do Código Civil que a interpretação não pode ser procurada meramente no plano linguístico, tem de atender às circunstâncias históricas em que a norma nasceu, procurando fixar a vontade real do legislador.

Ora, o normativo em causa concretizou o que era há muito defendido por
Anselmo de Castro que em “Acção Executiva Singular, Comum e Especial, 3.ª ed., 1977, Coimbra Editora, págs. 324 e 325”, escrevia: “Quanto a nós é impossível ver-se na caução outra função que não seja estritamente a de mera garantia da dívida exequenda” (…), “igualmente nos parece de admitir que as penhoras já efectuadas podem ser substituídas por caução, e levantar-se pela sua prestação. Será, se se quiser uma lacuna da lei, mas a solucionar necessariamente pelo modo indicado. Veja-se que uma das formas de prestação de caução é em dinheiro e o absurdo que seria não poder o executado fazer cessar a penhora por depósito da respectiva importância”. [...]

Trata-se, pois, de norma inovadora, que tem subjacentes os princípios da proporcionalidade e da adequação e foi criada principalmente no interesse do devedor, visando criar condições para que este, quando questiona a obrigação exequenda, não seja onerado excessivamente com a penhora, permitindo a sua substituição por caução idónea.

Assim sendo e visando a norma em causa, actual art. 751.º, n.º 7, do CPC, possibilitar ao executado substituir a penhora por caução idónea, esvaziava o seu conteúdo interpretá-la como impondo que o pedido de substituição tivesse de ser formulado em simultâneo com o requerimento de oposição à penhora.

Ao contrário do que decidiu o despacho recorrido, a substituição da penhora por caução não está dependente da oposição à penhora.

A oposição à penhora visa o levantamento da penhora e tem por fundamento as três situações previstas no 784.º do CPC vigente (anterior art. 863.º-A) e a caução a que se refere o n.º 3 do art. 785.º (anterior art. 863.º-B n.º 3) tem por finalidade obviar ao prosseguimento da execução relativamente aos bens objectos da oposição, evitando designadamente a sua venda e está directamente conexionada ao incidente de oposição. 

A caução a que se reporta o n.º 7 do art. 751.º tem uma finalidade específica, que é a de substituir a penhora pela caução e essa caução equivale para todos os efeitos à penhora que substitui e pode ser requerida mesmo nos casos em que não se verifica nenhuma das situações de impenhorabilidade que sustentam a oposição à penhora. 

Note-se que, se o n.º 7 do art. 751.º se limitasse a permitir que o executado requeresse a prestação de caução quando deduzisse oposição à penhora, era absolutamente inútil, dado que do n.º 3 do art. 785.º (anterior art. 683.º-B) resulta que o executado, se pretende a suspensão da execução [quanto aos bens penhorados], tem de prestar caução". 


MTS