"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



21/04/2015

Jurisprudência (122)


Recurso para uniformização de jurisprudência; oposição de julgados


1. O sumário de STJ 26/3/2015 (424/2001.P1.S1-A) é o seguinte:

I - Não existe oposição de julgados se no acórdão fundamento – no âmbito de uma acção constitutiva, em que se pede a execução específica – se decide não ser admissível a execução específica de um contrato de mandato sem representação e no acórdão recorrido – no âmbito de uma acção declarativa de condenação – se decide condenar os mandatários na transferência dos bens para a titularidade do mandante , sem emitir qualquer declaração negocial em falta ou reconhecer, ainda que implicitamente, qualquer admissibilidade de execução específica.

II - O recurso para uniformização de jurisprudência é um recurso extraordinário, em que três instâncias já se pronunciaram sobre a mesma questão, daí que se justifique que as exigências de admissibilidade sejam mais apertadas, por forma a não abrir injustificadamente a porta a um terceiro grau de recurso que o legislador manifestamente não pretendeu.

III - Essas maiores exigências passam por uma clara demonstração da identidade e essencialidade da questão objecto de respostas divergentes, no acórdão fundamento e no acórdão recorrido, demonstração essa que não ocorreu nos autos.

2. Na fundamentação do acórdão encontra-se a seguinte passagem:

"[N] o caso concreto temos:

a) - No acórdão recorrido:

Em causa no acórdão recorrido [...] está uma acção condenatória em que aquilo que se pediu foi o reconhecimento da existência de um contrato de mandato sem representação e a condenação dos réus na transferência – sublinhe-se que não foi pedido que o tribunal fizesse essa mesma transferência.

É de uma acção declarativa de condenação que se trata; e não de uma acção constitutiva, como é a de execução específica.

Uma acção em que se pede o reconhecimento prévio da existência de um mandato sem representação que, como contrato que é, obriga as partes ao seu estrito cumprimento;

Entendeu-se que não se colocava nos autos a questão da admissibilidade ou não da execução específica;

Entendeu-se que a acção em que se pede a execução específica é uma acção constitutiva, em que se pretende que o tribunal se substitua às partes, produzindo a declaração negocial em falta, sendo certo que tal não era a pretensão nos presentes autos, nos quais em momento algum é pedido pelo autor que o Tribunal se substitua às partes emitindo a correspondente declaração;

A questão do cumprimento coercivo desse contrato – nomeadamente através da execução específica – não foi nem tinha que se tratada, pois não era objecto da acção.

b) - No acórdão fundamento:

Temos uma acção em que os autores pedem que «seja proferida sentença», declarando transmitido para a esfera jurídica deles um lote de terreno que identificam;

Entendeu o STJ que não é susceptível de execução específica a obrigação do mandatário sem representação transferir para o mandante os direitos adquiridos em execução do mandato, posto que o artigo 830.º do CC se restringe aos casos em que a obrigação de emitir a declaração negocial resulte de contrato promessa;

Não sendo possível a execução específica, apenas tem o autor direito a uma indemnização por perdas e danos.

Do
supra exposto resulta já com clareza que não se pode aqui falar de oposição. Na verdade, uma semelhante realidade factual, aliada a um diverso pedido formulado pode levar a uma solução jurídica diferente, embora não oposta, nem conflituante entre si."