"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



30/10/2015

Jurisprudência (220)



Competência material; extensão da competência



O sumário (do Relator) de RE 8/10/2015 (295/07.9TBVRS-B.E1) é o seguinte:

1 – Para aferir da competência material do tribunal não basta atender ao pedido, havendo que ponderar o modo como o autor configura a acção na sua dupla vertente, pedido e causa de pedir, tendo ainda em conta as circunstâncias disponíveis que revelem sobre a exacta configuração da causa. 

2 – A competência dos tribunais comuns é residual, estendendo-se a todas as áreas que não sejam atribuídas a outras ordens judiciais. 

3 – Compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígio que tenham nomeadamente por objecto questões em que, nos termos da lei, haja lugar a responsabilidade civil extracontratual das pessoas colectivas de direito público, incluindo a resultante do exercício da função jurisdicional e da função legislativa. 

4 - Não afasta a competência dos tribunais administrativos e fiscais a eventualidade de o autor pedir, na acção, a condenação solidária de entidades públicas e de entidades particulares e o facto de para o conhecimento do pedido formulado contra estas últimas ser competente o tribunal de jurisdição comum.

II. Na fundamentação do acórdão encontra-se a seguinte passagem:

"[...] a única extensão da competência que a lei permite é a prevista no art. 97º do VCPC (aplicável, porque era o Código que estava em vigor aquando da decisão) é a referente às “questões prejudiciais” [...] quando prescreve: “se o conhecimento do objecto da acção depender da decisão de uma questão que seja da competência do tribunal criminal ou do tribunal administrativo, pode o juiz sobrestar na decisão até que o tribunal competente se pronuncie” e, não sendo proposta a acção no prazo de um mês ou se estiver parada por negligência das partes durante esse prazo, “o juiz da acção decidirá a questão prejudicial, mas a sua decisão não produz efeitos fora do processo em que for proferida”.

Por isso, não estando em causa uma situação que possa ser considerada questão prejudicial porque o que se trata é do verdadeiro objecto da ação e não de qualquer questão que constitua pressuposto necessário à decisão de mérito, estamos fora do âmbito de aplicação do artº 97º do VCPC.

Como se salienta no Acordão 06/2007 do Tribunal de Conflitos proferido em 28/11/2007 “a atribuição de competência dos tribunais administrativos para o conhecimento destas acções de responsabilidade civil extracontratual ... não pode ser afastada por considerações de ordem prática ou princípios jurídicos gerais; na verdade, os princípios jurídicos são elaborados com base nas soluções legais e tanto eles como as razões de ordem prática só podem valer em sintonia com essas soluções ...; por isso não se pode afastar a aplicação de uma competência expressamente prevista na lei com base em considerações de economia processual ...”; e como o próprio diz, “este entendimento de que o regime do litisconsórcio voluntário não se sobrepõe ás normas de competência material insere-se numa posição bem enraizada na jurisprudência deste Tribunal de Conflitos”.

Jurisprudência que mantém atualidade, tal como decorre do afirmado no acordão do mesmo Tribunal de Conflitos, com o n.º 2/12, proferido em 29/09/2012 onde pode ler-se que “não afasta a competência dos tribunais administrativos e fiscais a eventualidade de o A. pedir, na acção, a condenação solidária de entidades públicas e de entidades particulares e o facto de para o conhecimento do pedido formulado contra estas últimas ser competente o «tribunal comum»”.

Entendimento que é também acolhido no acordão do STJ de 17/06/2010 no processo 686/08.8TBBRG.G1.S1 onde se refere expressamente que “no caso de litisconsórcio voluntário (art. 27º do CPC) deve verificar-se em relação a todos os contitulares da relação material controvertida, atento o pedido formulado, a compatibilidade processual a que alude o art. 31, nº:1 do CPC, ou seja, não será admissível o litisconsórcio voluntário quando ocorra incompetência absoluta do tribunal relativamente a algum ou alguns desses contitulares; o tribunal pode conhecer oficiosamente da excepção de competência em razão da matéria ...”, e “a acção prossegue contra os demais réus considerado o pedido contra eles deduzido relativamente ao qual o tribunal é o competente em razão de matéria”.

MTS