"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



10/01/2022

O que é a compensação subsidiária? (2)


1. O sumário de um recente acórdão da RG é o seguinte:

A compensação em termos civis é um meio de extinção da obrigação. A essência da compensação reside na existência de dois sujeitos que são reciprocamente credor e devedor, sendo irrazoável que ambos cumpram a obrigações, em vez de fazerem encontro de contas. Se na contestação/reconvenção o réu nega a dívida do autor não pode exigir em reconvenção a compensação de créditos.

2. Salvo o devido respeito, a orientação defendida pela RG padece de um manifesto equívoco, dado que ignora a chamada compensação subsidiária. Porque se mantêm totalmente actuais as reflexões então expressas, remete-se para este post.

Aproveita-se para referir um dado muito curioso. Na p. 167 da sua obra Introduction à la procedure civile de 1811, Pigeau (1750-1818) refere a hipótese em que autor demanda o réu para pagamento de um dívida contratual e em que este demandado argui a nulidade do contrato alegado pelo autor e invoca a compensação do crédito do autor com um crédito próprio; neste contexto, por especialidades que agora não interessam, Pigeau admite expressamente que o demandado possa "deduzir a compensação [...] subsidiariamente, quer dizer, para o caso de o primeiro pedido de nulidade ser rejeitado". Cabe então perguntar: o que aconteceu na Ciência Processual Civil para que o que era admissível em 1811 não o seja mais de 200 anos depois?

3. Talvez se possa acrescentar que não é apenas no caso da compensação que a reconvenção pode ser deduzida a título subsidiário. Admita-se, por exemplo, que o autor intenta uma acção de reivindicação; é pacificamente admitido que o réu pode começar por, a título principal, apresentar uma defesa por impugnação ou por excepção e que, para o caso de esta defesa não ser considerada procedente, esse demandado pode deduzir, a título subsidiário, um pedido reconvencional no qual pede a condenação do autor nas benfeitorias que realizou no prédio reivindicado (art. 266.º, n.º 2, al. b), CPC).

4. Em suma: a reconvenção subsidiária é uma figura geral e indiscutível da Ciência Processual Civil.

MTS