Taxa de justiça;
comprovativo do pagamento; controlo superveniente
1. O sumário de RP 17/4/2023 (12998/22.9T8PRT.P1) é o seguinte:
I - Proferida a decisão esgota-se o poder jurisdicional, não havendo lugar à sua reforma em caso de ser admissível recurso da mesma (nº2, do art. 616º, do CPC).
II - Com a petição inicial tem de ser demonstrado o pagamento da taxa de justiça devida (a não se tratar de situação de benefício de apoio judiciário e fora dos casos de urgência) - v. nº1, do art. 145º, do CPC -, sob pena de recusa, pela secretaria, do articulado com o qual se pretendia desencadear o acesso à justiça (cfr. nº7, do art. 552º, e al. f), do art. 558º e, v. a ressalva da 1ª parte, do nº3, do art. 145º, todos do CPC), não podendo, ainda, a mesma, a escapar a tal controle, ser objeto de distribuição (nº1, do art. 207º, do CPC).
III - A comprovação de pagamento de taxa de justiça de valor inferior ao devido, nos termos do Regulamento das Custas Processuais, equivale à falta de comprovação (cfr. nº2, do art. 145º, do CPC, expressa estatuição que visou evitar o desvirtuar do dever de prévio pagamento da taxa de justiça estabelecida).
IV - Escapando a petição inicial ao referido duplo controlo (do pagamento e da suficiência do valor), o juiz do processo deve, no despacho pré-saneador, para aproveitamento de atos e tutela da confiança, convidar o autor a corrigir a irregularidade (art. 590º, nº2, al. b)) e cominando a lei a falta com a rejeição do articulado, a não ser corrigido o vício tem o mesmo de ser desaproveitado e, por nulidade ou por verificação de exceção dilatória inominada, dada a falta de verificação de pressuposto imperativamente imposto por lei, de ser extinta a instância (cfr. art. 278º, daquele diploma legal).
V - Contudo, sendo as normas a impor a junção à petição inicial de documento comprovativo da taxa de justiça devida normas imperativas e competindo ao julgador, oficiosamente, conhecer do seu cumprimento e extrair as consequências da não observância, em caso de haver lugar a despacho liminar e não sendo o desentranhamento da petição inicial e a absolvição do Requerido da instância por verificação da referida exceção dilatória mais do que o equivalente à recusa da petição, tem, nessa fase liminar, ainda, lugar, a um triplo controlo da legalidade, por forma a assegurar, também por esta via, agora pelo juiz do processo, que a observância da lei não escape ao crivo do julgador numa fase em que questões de desaproveitamento de atos e de tutela da confiança ainda se não levantam.
2. Na fundamentação do acórdão escreveu-se o seguinte:
"[...] com a petição inicial subscrita por mandatário judicial tem de ser demonstrado o pagamento da taxa de justiça devida ou da concessão do benefício do apoio judiciário, sob pena de recusa da petição inicial (cfr. nº7, do art. 552º, e al. f), do art. 558º) e se apesar de padecer daquele vício, apesar da falta do documento comprovativo do pagamento devido, “houver sido recebida, a petição inicial não deve ser admitida à distribuição, nos termos do art. 207º” [---] e se, mesmo assim, a distribuição tiver lugar o juiz deve, no despacho liminar a que haja lugar, abstendo-se do conhecimento de mérito, ordenar o desentranhamento da petição inicial, o que, em tudo, equivale àquela recusa, e absolver o Requerido da instância, dada a falta de um pressuposto processual e verificação de uma exceção dilatória inominada insuprível – falta do comprovativo do pagamento da taxa de justiça do montante legalmente estabelecido – cfr. disposições combinadas dos art. 577º (elenco exemplificativo - v. “entre outras”), nº2, do art. 576º, nº1 e 2, do art. 145º, nº7, do art. 552º e al. f), do art. 558º.
"[...] com a petição inicial subscrita por mandatário judicial tem de ser demonstrado o pagamento da taxa de justiça devida ou da concessão do benefício do apoio judiciário, sob pena de recusa da petição inicial (cfr. nº7, do art. 552º, e al. f), do art. 558º) e se apesar de padecer daquele vício, apesar da falta do documento comprovativo do pagamento devido, “houver sido recebida, a petição inicial não deve ser admitida à distribuição, nos termos do art. 207º” [---] e se, mesmo assim, a distribuição tiver lugar o juiz deve, no despacho liminar a que haja lugar, abstendo-se do conhecimento de mérito, ordenar o desentranhamento da petição inicial, o que, em tudo, equivale àquela recusa, e absolver o Requerido da instância, dada a falta de um pressuposto processual e verificação de uma exceção dilatória inominada insuprível – falta do comprovativo do pagamento da taxa de justiça do montante legalmente estabelecido – cfr. disposições combinadas dos art. 577º (elenco exemplificativo - v. “entre outras”), nº2, do art. 576º, nº1 e 2, do art. 145º, nº7, do art. 552º e al. f), do art. 558º.
Com efeito, as normas que impõem a junção à petição inicial de documento comprovativo da devida taxa de justiça são normas imperativas e do seu cumprimento tem o julgador de, oficiosamente, conhecer e de extrair as consequências da não observância de ónus impostos. E, na fase liminar, o desentranhamento da petição inicial e a absolvição do Requerido da instância mais não são do que o equivalente à recusa da petição, pelo que, em nosso entendimento, não podem deixar de ser decretados, a ser notada a falta.
A observância do referido pressuposto, embora não autonomizado, em geral, como pressuposto processual, mas de exigência expressa, pelas referidas normas imperativas, considerando-se, por isso, englobado no elenco, meramente exemplificativo (“entre outras”), das exceções dilatórias, do artº 577º, estando entre os pressupostos processuais, exigidos pelo nosso ordenamento jurídico, impõe-se.
E, na verdade, iniciando-se a instância com a propositura da ação, a mesma só se estabiliza com a citação do Réu/Requerido, como decorre do disposto no artigo 260º, não lhe estando, antes disso, sequer, conferido o “efeito adjetivo essencial a estabilização da instância no que concerne aos seus elementos subjetivo e objetivo”, pelo que o desentranhamento da petição/requerimento inicial e a absolvição do Réu/Requerido da instância, por verificação de exceção dilatória inominada, mais não é do que a própria recusa da petição, apenas, desta feita, pelo juiz do processo.
Questão diversa é a de só ultrapassado o momento do despacho liminar, numa fase já mais adiantada, designadamente na do despacho pré-saneador, ser notada a irregularidade e de dever ser, então, [---] de convidar o autor a supri-la (cfr. art. 590º) e só no caso de o mesmo o não fazer, ser de rejeitar o articulado por padecer de nulidade, dado violar lei expressa, e por se verificar a falta de um pressuposto processual [José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, vol. II, Almedina, pág. 516 e 630 e segs.].
Com efeito, “A petição inicial que não obedeça aos requisitos formais específicos das alíneas a), b), c) e f) do art. 552º-1 e, bem assim, aos requisitos formais gerais (…) deve ser recusada pela secretaria, não podendo ser objeto de distribuição (arts 558º e 207-2); mas se escapar a este duplo controlo, o juiz do processo deve, no despacho pré-saneador, convidar o autor a corrigir a irregularidade que se verifique (nº2-b))” [ Ibidem, pág. 630.] .
Assim, e em suma:
a) Com a petição inicial tinha de ser demonstrado o pagamento da taxa de justiça devida, na totalidade, (a não se tratar de situação de benefício de apoio judiciário) - v. nº1, do art. 145º, do CPC -, sob pena de recusa, pela secretaria, do articulado com o qual se pretendia desencadear o acesso à justiça (cfr. nº7, do art. 552º, e al. f), do art. 558º e, v., ainda, a ressalva da 1ª parte do nº3, do art. 145º, todos do CPC), não podendo o mesmo, a escapar a tal controle, como escapou, ser objeto de distribuição (nº1, do art. 207º, do CPC);b) Sendo as normas a impor a junção à petição inicial de documento comprovativo da taxa de justiça devida normas imperativas e competindo ao julgador, oficiosamente, conhecer do seu cumprimento, controlar a legalidade e extrair as consequências da sua não observância, em caso de haver lugar a despacho liminar e não sendo o desentranhamento da petição inicial e a absolvição do Requerido da instância por verificação da referida exceção dilatória mais do que o equivalente à recusa da petição, a escapar esta ao referido duplo controle, deve o juiz do processo, nessa fase liminar, atuar, ainda, um triplo controlo da legalidade, por forma a assegurar, também por esta via, que a observância da lei não escapa ao crivo do julgador.
Assim sendo, e por, nos termos do referido nº2, do art. 145º, comprovação de pagamento de taxa de justiça de valor inferior ao devido (este, no caso, 612,00€ e comprovado estando, apenas, 306,00), equivaler à falta de comprovação, não tendo o requerimento inicial sido recusado nem rejeitada a distribuição, bem foi, liminarmente, ordenado o desentranhamento do requerimento inicial que não observa os requisitos/ónus impostos (nº7, do art. 552.º e al. f), do art. 558.º) e absolvido o requerido da instância (dado estar iniciada pela propositura da ação, nos termos do nº1, do art. 259º), por verificação de exceção dilatória inominada (arts. 577º, nº2, do art. 576º e al. e), do nº1, do art. 278º).
Neste conspecto, mesmo até substancialmente, o decidido tem de ser mantido."
[MTS]