"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



22/01/2024

Jurisprudência 2023 (91)


Embargos de executado; 
dedução superveniente; diligência exigível*


1. O sumário de RC 28/3/2023 (2143/20.5T8SRE-E.C1) é o seguinte:

No âmbito do art. 728, nº 2, do Código de Processo Civil, a superveniência subjetiva não deve ser aceite quando o conhecimento da parte é indesculpavelmente tardio, assentando o seu desconhecimento anterior numa sua negligência grave, por nada ter feito, podendo fazê-lo, em momento oportuno (aquando dos embargos originários), para obter o conhecimento em causa.


2. Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:

"A Embargante foi citada em 1.2.2021.

Ela deduziu (os primeiros) embargos em 15.7.2021.

Estes novos embargos são de 5.12.2021.

Alega a Embargante que rececionou, em 15.11.2021, comunicações escritas, via email, do co-executado avalista, BB, e da resposta escrita da outra co-executada, “A...”.

Os factos de que alega conhecimento em 15.11.2021 são relativos à evolução da relação subjacente à livrança, entre a “A...” e o Exequente, nomeadamente quanto a pagamentos ocorridos, tudo anterior ao ano 2021 (o contrato é de 2008, a resolução dele é de 30.10.2018 e os pretensos pagamentos de 2018).

Estes factos são suficientes para as considerações jurídicas pertinentes.

Os embargos são uma ação declarativa incidental e especial, pela qual o executado exerce a sua defesa na execução, que tem paralelo com a contestação, como meio impugnatório e de dedução de exceções.

Se a Avalista Embargante deduziu embargos de executado em 15.7.2021, devia ter sido neles deduzida toda a defesa relativa à relação subjacente que já tinha ocorrido, não podendo aceitar-se que só em 15.11.2021 tomou conhecimento das vicissitudes daquela relação, quando o seu ex-marido, sócio gerente da “A...”, troca a referida correspondência (e informação) com esta sua sociedade.

Tendo subscrito o pacto de preenchimento, tendo dado aval à sociedade, a Embargante poderia, agindo de forma prudente e diligente, como lhe era devido, ter procurado obter os elementos factuais em questão aquando da preparação da sua defesa à execução, no âmbito dos embargos originários.

A sua implicação no caso e a sua relação com o sócio gerente, mesmo que esteja dele divorciada, colocam-na numa posição em que é exigível que procure saber da relação subjacente pelo menos aquando da defesa originária.

Além disso, nos embargos originários, considerando que a execução foi instaurada contra os três sujeitos referidos, caso a Embargante dependesse dos seus conhecimentos, seria possível a esta solicitar que os demais esclarecessem a evolução da relação subjacente.

Assim, o pretenso desconhecimento da Embargante assenta numa sua negligência grave, pelo que não deve ser aceite.

Esta nossa posição é coerente com o acórdão desta secção, de 28.6.2022, já transitado em julgado, proferido no apenso F (o relator foi adjunto na referida decisão), publicado em www.dgsi.pt, no qual o executado BB invocou conhecimento tardio idêntico."


*3. [Comentário] O decidido no acórdão é incompatível com a tese -- criticada aqui -- segundo a qual a não dedução dos embargos não tem qualquer efeito preclusivo. 

A exigência, perfeitamente compreensível, de que o embargante actue com uma diligência mínima só é compreensível se se partir do princípio de que a não dedução dos embargos (ou a não dedução nesses embargos de determinados fundamentos) produz um efeito preclusivo. Se o ponto de partida for o de que a não dedução dos embargos não tem nenhum efeito preclusivo, é completamente indiferente a diligência com a qual o embargante tenha actuado.

MTS